O sentido do trágico na paisagem sonora do mundo urbano contemporâneo

Autores

  • Priscila Farfan Barroso BIEV - PPGAS - UFRGS
  • Ana Luiza Carvalho da Rocha BIEV - PPGAS - UFRGS
  • Viviane Vedana

DOI:

https://doi.org/10.22456/1984-1191.9274

Resumo

As sonoridades de um fim de tarde em uma grande cidade, como é o caso de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, com seu trânsito intenso ecoando diferentes intensidades de motores, com o som impaciente da buzina que reclama/protesta a situação das ruas engarrafadas, o alarido das crianças que deixam à escola, são apenas exemplos de como pensar uma imagem de cidade em fim de tarde. A paisagem sonora do mundo urbano contemporâneo tem sido apontada por muitos estudiosos das condições ambientais nas grandes cidades como a responsável pelo stress, a irritação e o desgaste físico e emocional de seus habitantes, cada vez mais submetidos à pressão da artificialidade tecnológica do seu ambiente psicosocial. Neste sentido é que as sonoridades da vida urbana advindas das profundas mudanças culturais das sociedades ocidentais, marcadas pelo rápido crescimento urbano e industrial, a movimentação demográfica e as novas tecnologias podem ser enfocadas como parte dos estudos sobre o fenômeno da tragédia da cultura apontado por G. Simmel, em fins do século XIX. Se os sons da rua antes se caracterizavam pelos “moedores de melodias” (Tinhorão, 2005), do realejo, dos afiadores de faca, dos vendedores de picolé, dos pregões dos mercados públicos, dos apitos das fabricas, dos sinos das igrejas, as serenatas e as bandas militares, latidos de cachorros, hoje, junta-se a alguns deles uma paisagem sonora outra, a dos “ruídos” como a dos telefones celulares, das buzinas e de travadas de pneus de carros, de tiros e de gritos, de motores de ônibus, ruídos de betoneiras, buzinas de ambulância e carros de policia, das músicas dos bares e casas de shows, dos aviões e helicópteros, dos estádios de futebol, etc.

 

Os sons que compõem a vida humana veiculam as práticas sociais que os conformam e na composição da vida urbana, não se trata mais de um concerto da natureza (Schafer, 2001:212), pois revela os encontros fortuitos na rua, os rituais cotidianos de compras de alimentos para a casa, os itinerários dos habitantes que percorrem as ruas da casa para o trabalho e vice-versa, as expressões religiosas de diversos tipos, a sociabilidade dos bares e das calçadas, a vida cotidiana no bairro, entre muitos outros, e são aspectos que podem ser etnografados para se pensar as feições que a crise assume no contexto das modernas sociedades complexas. A composição de vozes e trânsito, dos sons de passos e risadas, das sonoridades dos utensílios técnicos: celulares, caixas-registradoras, o barulho do arcondicionado, televisão, rádio, etc. remetem à complexidade do ambiente urbano em termos de suas expressões sonoras.

 

Para Schafer (2001), o mundo urbano contemporâneo está sonoramente poluído, e uma das razões seria o aumento irreversível das obras da cultura que produzem máquinas e tecnologias, responsáveis pela produção de ruídos não-informativos - em relação às antigas sonoridades (assobio, sino) - que por sua vez habitam o mundo dos mais diversos sons. Para Schafer, uma degradação da paisagem sonora mundial, o que o levou a elaborar um projeto de despoluir sonoramente o mundo. Para o autor, se podemos fechar os olhos em situações em que estamos vulneráveis e expostos, os ouvidos, pelo contrário, permanecem abertos a mercê do horizonte acústico em que se vive. Estes comentários do autor (Schafer, 2001:680) nos permitem pensar, portanto, o tema do ruído (som indesejável) na paisagem sonora das grandes metrópoles como parte do que G. Simmel denominou, a tragédia da cultura.

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Biografia do Autor

Priscila Farfan Barroso, BIEV - PPGAS - UFRGS

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Publicado

2008-03-03

Como Citar

BARROSO, P. F.; ROCHA, A. L. C. da; VEDANA, V. O sentido do trágico na paisagem sonora do mundo urbano contemporâneo. ILUMINURAS, Porto Alegre, v. 9, n. 19, 2008. DOI: 10.22456/1984-1191.9274. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/iluminuras/article/view/9274. Acesso em: 28 mar. 2024.