Sociopatologia do fogo e o feminino em Amanda Lovelace
Resumo
Na perspectiva dos estudiosos da mente e sua relação com as entranhas sociais, a sociopatologia descreve um estado de morbidez que parte do indivíduo para o corpo social, resultando em condutas e comportamentos nocivos que estão ligados a uma sintomatologia coletiva, fruto das interações culturais. Desde a Idade Média, existe o que ora denominamos de sociopatologia do fogo, a noção de que os elementos heréticos, sobretudo femininos, precisam ser queimados. Essa visão sobre o feminino, que no medievo se configurou um legítimo feminicídio, com muitas mulheres sendo acusadas de práticas heréticas e sendo lançadas em uma fogueira real, tem perdurado na sociedade, mesmo que tenhamos avançado em direitos civis e um esboço de equidade de gênero que ainda precisa ser consolidado. Em sua obra A bruxa não vai para a fogueira neste livro, a escritora Amanda Lovelace, em sua poética engajada, discute os vestígios dessa inclinação social a vitimar a mulher, transformá-la em uma bruxa e lançá-la em uma fogueira simbólica. Todavia, Lovelace propõe que a mulher se emancipe, que desafie o status quo e que definitivamente, em seus versos subversivos, lance ela mesma na fogueira quem deseja queimá-la. Trata-se de uma nadar contra a corrente, ideia também cara a outros pesadores e escritores desde a segunda metade do século XX.