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O que eu Significo Diante Disso: ação artística com espectadores teatrais

Ce que Signifie-Moi In Front of the Cell: action artistique avec des spectateurs théâtraux

Resumo:

O artigo trata de processos de criação artística realizados com o público a partir de espetáculos teatrais, com o objetivo de evidenciar elementos que constituem uma poética do espectador. O público é convidado a se debruçar sobre a cena assistida tendo em vista o impacto ocasionado pela obra. O que se busca, a partir da criação artística proposta aos espectadores, é a possibilidade de invenção de linguagem, de elaboração de enunciados que escapem dos modelos repetitivos.

Palavras-chave:
Teatro; Público; Espectadores; Ação Artística; Efeito Estético

Résumé:

L’article traite des processus de création artistique réalisés avec le public après les représentations théâtrales, dans le de mettre en évidence des éléments qui constituent une poétique du spectateur. The public is inviting to fill in the assistance, due to the impact caused by the artist. Ce qui est recherché, based on the creation artist proposée aux spectateurs, is the possibility of invention of language, elaboration of phenomena with modèles répétitifs.

Mots-clés:
Théâtre; Public; Spectateur; Action Artistique; Effet Esthétique

Abstract:

The article deals with artistic creation processes carried out with the audience through theatrical performances, aiming to highlight elements that constitute an audience poetics. The audience is invited to lean over the scene they are watching taking into consideration the impact caused by the work of art. What is sought, from the artistic creation proposed to the audience, is the possibility of language invention, of elaboration of statements that escape the repetitive role models.

Keywords:
Theater; Audience; Spectators; Artistic Action; Aesthetic Effect

O esplendor da manhã Não se abre com faca. O que quer dizer isso? Isso não quer dizer nada. Isso não quer dizer coisa nenhuma. A poesia vive de coisa nenhuma. (Manoel de Barros, 2019BARROS, Manoel de. Entrevista apresentada na Ocupação Manoel de Barros. São Paulo: Itaú Cultural, 2019. Disponível em: <Disponível em: https://www.itaucultural.org.br/ocupacao/manoel-de-barros/ >. Acesso em: 01 jul. 2019.
https://www.itaucultural.org.br/ocupacao...
)1 1 Entrevista com o poeta apresentada em vídeo na Ocupação Manoel de Barros, no Itaú Cultural - São Paulo, fev. - abr. 2019. Disponível em: <https://www. itaucultural.org.br/ocupacao/manoel-de-barros/>. Acesso em: 01 jul. 2019. .

As considerações de Manoel de Barros acerca dos meandros da poesia, acima enunciadas, nos possibilitam desdobrar fios analíticos acerca da posição do leitor - ou do espectador - em seu diálogo com a proposição artística. A leitura de uma cena - ou de um poema - não se realiza como algo estabelecido de antemão, definido previamente pelo artista e que precisa ser desvendado pelo espectador. Atribuir sentidos indica elaborá-los em relação a nós mesmos, ao modo como nos disponibilizamos para o encontro com a obra, ao que nos acontece a partir daí. Trata-se menos de descobrir o que significa uma cena e mais de se perguntar o que acontece conosco, como a proposta nos impacta. Uma cena não quer dizer nada que se resuma a um sentido anteriormente designado, a que se queira ou se deva chegar. Justamente nessa indeterminação, como evento provido de finalidade, mas sem um fim anteriormente instituído, é que se efetiva o evento artístico.

O texto (o mesmo sucede com a voz que canta) só pode me arrancar este juízo, de modo algum adjetivo: é isso! E mais ainda: é isso para mim! Este ‘para mim’ não é nem subjetivo, nem existencial, mas nietzschiano (‘no fundo, é sempre a mesma questão: O que é que é para mim?...’) (Barthes, 1987BARTHES, Roland. O Prazer do Texto. São Paulo: Perspectiva, 1987., p. 20).

A pergunta axial acerca do ato do espectador - e dizemos ato, pois a leitura solicita invenção, produção - precisa ser modificada, pois ela não visa mais somente à significação, mas principalmente aos efeitos em potencial da proposição artística. O que demanda disponibilidade para participar de um jogo que surge de modo inadvertido e sem desdobramentos preestabelecidos, porque se organiza como experiência, e, enquanto tal, só se efetiva plenamente se o próprio participante se dispuser a constituí-la enquanto joga.

Se, por um lado, a proposição artística contenta, preenche, dá euforia, por outro, propõe um estado de perda, de desconforto, ou mesmo de tédio e enfado, fazendo “[...] vacilar as bases históricas, culturais, psicológicas, do leitor, a consistência de seus gostos, de seus valores e de suas lembranças, faz entrar em crise sua relação com a linguagem” (Barthes, 1987BARTHES, Roland. O Prazer do Texto. São Paulo: Perspectiva, 1987., p. 21). A frustração se torna, também, marca do movimento de leitura e participa do efeito estético proposto. O que pode nos levar à noção, como indica Deleuze (2006DELEUZE, Gilles. Proust e os Signos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006., p. 32), de que “a decepção é um momento fundamental da busca ou do aprendizado”. O espectador é convidado a conceber percursos próprios em sua relação com a escrita ou a proposta cênica e na relação desta com a vida social. Lançado na corrente da experiência estética, o prazer do espectador pode assumir a maneira de uma deriva.

A deriva advém toda vez que eu não respeito o todo e que, à força de parecer arrastado aqui e ali ao sabor das ilusões, seduções e intimidações da linguagem, qual uma rolha sobre as ondas, permaneço imóvel, girando em torno da fruição intratável que me liga ao texto (ao mundo). Há deriva, toda vez que a linguagem social, o socioleto, me falta (como se diz: falta-me o ânimo) (Barthes, 1987BARTHES, Roland. O Prazer do Texto. São Paulo: Perspectiva, 1987., p. 27).

Em 2004, criamos o Instável Núcleo de Estudos de Recepção Teatral2 2 O INerTE foi criado em 2004, em São Paulo, junto ao Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade de São Paulo (USP). Em 2015, o grupo se transfere para Florianópolis, passando a atuar com o Programa de Pós-Graduação em Teatro da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Disponível em: <https://youtu.be/R5ivJxQI2Ro>. Acesso em: 01 jul. 2019. (iNerTE), a partir do interesse de seus participantes em investigar o efeito estético, detendo-se mais especificamente no processo criativo do espectador teatral, buscando enunciar, a partir do estudo de teóricos da recepção e de procedimentos artísticos propostos em eventos coletivos, aspectos desse modo de produção. A cena que o núcleo se propõe a descortinar e analisar é aquela que emerge do encontro entre espectador e proposição artística, que pode ser evidenciada pela seguinte questão: como tornar reconhecíveis as instâncias da construção poética própria ao ato de leitura, evidenciando os elementos que sustentam a noção de uma arte do espectador?3 3 Maiores detalhes sobre o grupo podem ser encontrados em Desgranges e Simões (2017).

Figura 1
Debates performativos realizados no Teatro do SESC Prainha, em Florianópolis, no âmbito do projeto Por uma Arte do Espectador

Os estudos de recepção propostos pelo iNerTE buscam relacionar as investigações teóricas realizadas com as experimentações práticas propostas pelo núcleo. O objetivo central desses estudos pode ser definido como a tentativa de colocar o participante, espectador do evento, em condições de perceber a si mesmo, mantendo-se atento aos próprios processos receptivos, que engendra enquanto assiste às cenas e atua nas proposições artísticas. Para efetivar esses encontros com os espectadores, o núcleo tem organizado duas linhas de ação. A primeira linha de ação constitui-se em um espetáculo teatral, criado pelo grupo, que apresenta a trajetória de uma espectadora que se vê diante de uma cena prestes a começar. Intitulado Efeito, o espetáculo aborda distintos aspectos da experiência estética. As cenas intentam trazer à tona a experiência de uma espectadora que, ante o descortinar de um acontecimento teatral, se depara com a angústia suscitada pelo desconhecido, pelo que está prestes a ser revelado.

A segunda linha de ação do núcleo - sobre a qual nos deteremos neste texto - constitui-se nos atos artísticos coletivos efetivados junto com espectadores, propostos após espetáculos de outros grupos teatrais. Denominamos esses encontros, realizados com coletivos teatrais de várias regiões do País, e com grupos de outros países, de debates performativos (Figura 1). Esses debates tiveram início em junho de 2013, sendo inaugurados a partir do espetáculo Folias Galileu4 4 Artigo sobre esse debate performativo está publicado em Simões e Desgranges (2017) , no Galpão do Folias, na cidade de São Paulo5 5 Debate Performativo Folias Galileu (vídeo): <https://www.youtube. com/watch?v=VCGEycR3tGU>. Acesso em: 01 jul. 2019. .

Desde fevereiro de 2018, o iNerTE, ampliando as suas ações, vem realizando também o projeto Por Uma Arte do Espectador, que conta com o apoio do SESC-SC, em que espetáculos teatrais são apresentados, no Teatro do SESC Prainha, para estudantes da Educação para Jovens e Adultos (EJA). Grupos de alunos, formados por trabalhadores que estudam no período noturno, e que, de maneira geral, nunca haviam tido a oportunidade de ir ao teatro. Após cada um dos espetáculos, debates são propostos aos espectadores, convidados a elaborar leituras poéticas da obra teatral em questão. Os espetáculos e debates acontecem uma vez por mês e, além de propostos aos alunos das escolas, são abertos ao público em geral.

Os debates performativos podem ser compreendidos como desdobramentos poéticos do público a partir de um espetáculo teatral. A ideia central é a de evidenciar uma poética da recepção, criando condições para que o ato artístico do espectador seja realizado de modo coletivo. Os espectadores que assistiram a um determinado espetáculo são convidados para participar de um debate em que aspectos do acontecimento teatral serão retomados, incentivando os participantes a empreenderem leituras cênicas acerca do evento artístico em questão.

A proposta central desses encontros é a de desencadear no espectador o desdobramento e o reconhecimento da poesia que ele próprio, como (co)autor da obra, é instado a criar enquanto se relaciona com o espetáculo. Poesia que surge a partir dos significantes oferecidos pelo espetáculo e das sensações e afetos suscitados, das imagens inventadas, das memórias revisitadas, e do potencial de futuro surgido dos vislumbres estéticos e históricos de cada espectador-participante.

Buscamos, por meio dos debates, fazer emergir e decifrar aspectos inquietantes da experiência receptora e produtora que surge da relação entre espectador e proposição artística. As produções cênicas dos espectadores carregam consigo todo um estilo de vida, toda uma concepção das relações sociais, uma ética pessoal e coletiva, que aí é posta em questão. Ou seja, não somente o espetáculo teatral está posto em debate, mas também o posicionamento de cada espectador em face das questões urgentes suscitadas a partir da proposição dos artistas. E o que surge daí pode nos colocar em confronto com a heterogeneidade dos elementos que participam da produção de subjetividades.

Já que aí encontramos: 1. componentes semiológicos significantes que se manifestam através da família, da educação, do meio ambiente, da religião, da arte, do esporte; 2. elementos fabricados pela indústria dos mídia, do cinema, etc. 3. dimensões semiológicas a-significantes colocando em jogo máquinas informacionais de signos, funcionando paralelamente ou independentemente, pelo fato de produzirem e veicularem significações e denotações que escapam então às axiomáticas propriamente linguísticas (Guattari, 2006GUATTARI, Félix. Caosmose. Um Novo Paradigma Estético. São Paulo: Editora 34, 2006., p. 14).

Com os debates performativos intentamos descortinar alguns desses elementos de leitura, ou chaves de pensamento que operam na relação que travamos com a proposição artística, de modo a desvendar o mosaico de impressões que o coletivo de espectadores enuncia ao reverberar conjuntamente os impactos provocados pela cena. Para isso, buscamos deixar claro, desde o início, que não estamos em busca de um debate tradicional que pretende contemplar ou desvendar o que o espetáculo quis dizer. Não queremos, nem nos sentimos autorizados a estabelecer vetores de leitura ou mesmo a explicar para os espectadores aquilo que eles deveriam entender. Como integrantes do núcleo, estamos, ao contrário, colocados na posição de mais um dos espectadores do coletivo que se forma, buscando capturar lampejos de como o espetáculo atingiu, atravessou a cada um de nós. Ou seja, nos importa menos responder à pergunta o que isso quer dizer? e mais a tentativa de enfrentar a questão o que aconteceu comigo?, ou o que pode advir daí?.

A nossa tentativa consiste em analisar o modo como, aquele que dialoga com um espetáculo, além de colocar-se como tradutor da obra, a partir de experiências tão pessoais quanto legítimas, pode colocar-se também como espectador consciente de seu ato criativo. Um espectador instado a manter-se atento ao fato de que a obra conta com o seu ato de leitura para efetivar-se como tal. Em busca de capturar o espectador em pleno voo, em pleno processo de criação, com os debates performativos, partimos da perspectiva de colocar o espectador na posição de pesquisador, de quem se deixa atravessar pelo processo investigativo, e passa a observar a si mesmo enquanto observa o espetáculo. O que subverte os limites estabelecidos do binômio sujeito-objeto.

Com base na investigação de si mesmo, em busca de uma relação singular com a proposição artística, talvez possamos evidenciar disparos ou lampejos de uma catálise poético-existencial própria ao fazer artístico.

Essa catálise poético-existencial, que encontraremos em operação no seio de discursividades escriturais, vocais, musicais ou plásticas, engaja quase sincronicamente a recristalização enunciativa do criador, do intérprete, do apreciador da obra de arte. Sua eficácia reside essencialmente em sua capacidade de promover rupturas ativas, processuais, no interior de tecidos significacionais e denotativos semioticamente estruturados (Guattari, 2006GUATTARI, Félix. Caosmose. Um Novo Paradigma Estético. São Paulo: Editora 34, 2006., p. 33).

Dessa maneira, as rodas de espectadores intentam fomentar contralances - compreendendo as propostas dos artistas como lances, os espectadores são convidados a desferir contralances - que rompam com as estruturas do já classificado, e se coloquem em tensão com pressupostos simbólicos em voga, que definem leituras determinadas e cristalizadas do contexto estético e social. De modo a bagunçar os dispositivos de subjetivação, tirando-os da serialidade para que “[...] entrem em processos de subjetivação, que restituem à existência o que se poderia chamar de sua auto-essencialização” (Guattari, 2006GUATTARI, Félix. Caosmose. Um Novo Paradigma Estético. São Paulo: Editora 34, 2006., p. 32).

A própria relação com a arte teatral emerge, sendo colocada em questão, enunciada direta ou indiretamente no jogo, evidenciando a pergunta nodal que de fato sustenta a proposição desses encontros com espectadores: Por que teatro hoje? Pergunta essa que, no caso dos debates, busca ressonâncias e possíveis respostas a partir do potencial de efeito estético proposto aos espectadores-participantes. Longe de buscar um fim previamente definido para a arte ou para um espetáculo, o que se quer é fustigar o acontecimento artístico, fazendo vir à tona contralances significativos, que arranhem e contornem o impossível de ser dito. Sem perder de vista que “[...] a única finalidade aceitável das atividades humanas é a produção de uma subjetividade que enriqueça de modo contínuo sua relação com o mundo” (Guattari, 2006GUATTARI, Félix. Caosmose. Um Novo Paradigma Estético. São Paulo: Editora 34, 2006., p. 33)

As rupturas de sentido, que podem promover a reorganização de malhas e tecidos significacionais, podem acontecer em planos amplos, coletivos, ou em escala individual, molecular: “[...] em uma atividade política, em uma cura analítica, na instalação de um dispositivo para mudar a vida da vizinhança, para mudar o modo de funcionamento de uma escola, de uma instituição psiquiátrica” (Guattari, 2006GUATTARI, Félix. Caosmose. Um Novo Paradigma Estético. São Paulo: Editora 34, 2006., p. 34). As estruturas de linguagem constituem-se, portanto, como ordenações estéticas, que carregam consigo padrões ideológicos, que sustentam modos de ver, sentir, pensar e agir no mundo.

Para se criar condições de que o sentido de uma palavra (de um significante) se abra para outras possibilidades de escrita e de leitura, torna-se necessário revogar, ainda que temporariamente, os regimes propagados, que condicionam a significação. A instauração de outro modo de operar a linguagem solicita o reconhecimento e o enfrentamento das condições sociais que determinam tais regimes de significação. Como afirmam Deleuze e Guattari (1995DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs - capitalismo e esquizofrenia. v. 2. Rio de Janeiro: Editora 34, 1995., p. 97), “a linguagem é caso de política antes de ser caso de linguística”. Pois “[...] não existe significância independente das significações dominantes nem subjetivação independente de uma ordem estabelecida de sujeição. Ambas dependem da natureza e da transmissão das palavras de ordem em um campo social dado” (Deleuze; Guattari, 1995, p. 17). Não há, portanto, como considerar a escrita e a leitura artística como algo fora do campo político, na medida em que um enunciado se concretiza na própria tensão que estabelece com os regimes estéticos em voga.

Nos debates performativos, as ordenações de linguagem se evidenciam a todo instante, o embate entre a manutenção de leituras já classificadas e a invenção de sentidos em potencial tensionam e movimentam a roda de espectadores. Por vezes, elaborações poéticas que apontam para abordagens em escala ampla, em dimensão social, ou para uma mirada individual, molecular, surgem de maneira tão disruptiva quanto prazerosa, enchendo de ânimo os participantes, pois carregam consigo um contentamento inaudito, que só a experiência poética pode proporcionar. Outras vezes, no entanto, ainda que motivado por espetáculo dotado de intenso teor provocativo, o coletivo de espectadores formado consegue impedir o incômodo, justamente o que poderia dar o que pensar, evitando voltar o pensamento não apenas sobre o próprio espetáculo ou o lugar do teatro, mas sobre nós mesmos, a partir do que se poderiam abrir várias possibilidades de leitura. Ainda que o espetáculo consiga capturar o nosso pensamento e nos afetar com potência, o debate evidencia, em certas ocasiões, a luta cega e feroz para conformar a poesia proposta em cena com nossa maneira habitual de pensar, descortinando, como dizia Kafka, “o mar congelado que levamos dentro de nós” (Kafka apud Larrosa, 2011LARROSA, Jorge. La Experiencia de Lectura: estudios sobre literatura y formación (edição eletrônica). Barcelona: Fondo de Cultura Económica, 2011., p. 2877).

Para compreender o modo de atuação proposto nos debates performativos como ação artística - como indicado no título deste artigo -, podemos recorrer à definição conceitual proposta por Maria Lúcia Pupo (2012PUPO, Maria Lúcia de Souza Barros. Alteridade em Cena. Sala Preta, Revista do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas, São Paulo, USP, n. 12, v. 1, p. 46-57, 2012., p. 48):

No bojo das ações artísticas o que se salienta é a singularidade da percepção estética presente na experiência sensível, assim como nos riscos que ela necessariamente comporta. Ao fazer arte se constrói a subjetividade, ao mesmo tempo em que simbolicamente se reconstrói um território comum.

Nessa ótica seria oportuno distinguir, como faz Teixeira Coelho em A cultura e seu contrário (São Paulo, Iluminuras, 2008), a especificidade de uma ação artística em relação à ação mais amplamente tida como cultural, partindo do princípio de que a arte, em larga medida, é a negação da cultura. Seu caráter divergente faz com que ela seja uma exceção em relação às manifestações da cultura, que remetem à regra. Em oposição à esfera da necessidade, a dimensão do desejo, intrínseca à atividade artística é enfaticamente salientada pelo autor como seu vetor imprescindível.

As ações artísticas são deflagradas sem a necessária previsão do que acontecerá a seguir, estimulando os participantes a assumir a gestão do processo, engajando-se como propositores, responsabilizando-se também pelas decisões que vão sendo tomadas no percurso investigativo. Para, talvez, articular “[...] o tipo de pensamento que altera os estados, transforma o estado em processo, questiona o que existe e o coloca em movimento na direção do não conhecido” (Coelho, 1989COELHO, Teixeira. O Que é Ação Cultural. São Paulo: Brasiliense , 1989., p. 33).

As Tramas de um Debate pelo Avesso

[...] mas ele quer saber tudo diverso: quer não é o caso inteirado em si, mas a sobre-coisa, a outra-coisa (Guimarães Rosa, 2019GUIMARÃES ROSA, João. Grande Sertão: veredas (edição eletrônica). São Paulo: Companhia das Letras, 2019., p. 2669).

Os debates performativos são também denominados debates pelo avesso - ou compreendidos como o avesso de um debate -, pois, ao invés de partirmos da pergunta o que quer dizer este espetáculo?, partimos da indagação o que aconteceu comigo na relação com o espetáculo?. Investigamos a cena a partir do impacto nos espectadores, das inquietações e vislumbres provocados pelo efeito estético. Com base no poema oferecido pelos artistas teatrais, os espectadores são convidados a conceber outro poema, que clara e propositadamente surgirá a partir da escrita cênica primeiramente apresentada, mas que possuirá também marcas visíveis da criação artística dos próprios espectadores.

A resposta a uma cena não precisa se limitar ao raciocínio analítico acerca dela, ou melhor, cabe ao propositor criar condições para que essa análise possa se efetivar como produção criativa.

[A resposta a um texto] Deve ser um outro texto. Assim, quando um professor lê um poema para os seus alunos, deve fazer-lhes uma provocação: ‘O que é que esse poema lhes sugere? O que é que vocês veem? Que imagens? Que associações?’. Assim o aluno, em vez de se entregar à duvidosa tarefa de descobrir o que o autor queria dizer, entrega-se à criativa tarefa de produzir o seu próprio texto literário (Alves, 2004ALVES, Rubem. Interpretar é compreender. Folha de São Paulo, Sinapse, São Paulo, p. 06, abr. 2004., p. 06).

O que está em jogo, nesse caso, não é somente o que a cena quer dizer, mas o que cada participante vai elaborar crítica e criativamente a partir daquilo que a cena enuncia. De modo a convidar cada participante a manifestar-se artisticamente sobre a cena, efetivando a (co)autoria que lhe cabe, desferindo golpes que vão sendo concebidos para além da mera análise fria e racional do que viu.

Os lances performativos surgidos nesses debates se efetivam como criações engendradas nos processos receptivos, uma espécie de fala do espectador, uma fala inventiva, exposta em forma de outra cena, e que, ao mesmo tempo que pode abrir um potencial de sentidos acerca do espetáculo em questão, incita o espectador a pensar sobre si mesmo e se posicionar em face do evento artístico, abrindo possíveis vieses de análise acerca de sua relação com a vida social.

[A performatividade] resulta de um novo arranjo dos dados, que constituem propriamente um ‘lance’. Este novo arranjo obtém-se, a maioria das vezes, pondo em conexão séries de dados tidos até então como independentes. Pode-se chamar imaginação a esta capacidade de articular juntamente o que não estava (Lyotard, 1989LYOTARD, Jean-François. A Condição Pós-Moderna. Lisboa: Gradiva, 1989., p. 106).

Os debates são pensados, assim, como espaços de fruição e de prazer, de encontro e jogo entre os participantes, pois, como afirma Roland Barthes (1987BARTHES, Roland. O Prazer do Texto. São Paulo: Perspectiva, 1987., p. 7), “[...] não é somente a ‘pessoa’ do outro que me é necessária, é o espaço: a possibilidade de uma dialética do desejo, de uma imprevisão do desfrute: que os dados não estejam lançados, mas que haja um jogo”.

Para abordar alguns dos procedimentos adotados pelo iNerTE nesses debates, ante a impossibilidade de esgotá-los no âmbito deste artigo, gostaríamos de destacar dois aspectos marcantes, e que têm sido recorrentes nos encontros propostos pelo núcleo, tendo em vista que os procedimentos adotados nesses eventos são criados em função do contexto singular de cada encontro, e em diálogo com as instâncias estéticas próprias a cada espetáculo que será posto em jogo: a) a coisidade dos elementos, e b) a presentificação da memória.

Uma das propostas feitas aos espectadores no início dos encontros é que enunciem a coisidade dos elementos presentes no espetáculo: elementos visuais, sonoros, táteis, olfativos, que, por razão evidente, ou por motivo insondável, tenham sido apenas notados, ou mesmo tomados como impactantes para cada uma das pessoas presentes. A proposta, como dito acima, parte da noção de um debate pelo avesso, em que vamos abordar o espetáculo não a partir da cena, com questões sobre a interpretação dos signos propostos pelos artistas, mas começaremos a conversa a partir do público, de como cada qual percebeu a si mesmo na relação com a proposição artística, se sentiu tocado, atingido por palavras, gestos, ações, sonoridades manifestas no evento. A conversa não segue da cena para o público, mas, de modo invertido, ocorre do público para a cena, evidenciando a ideia de que a pergunta motriz deixa de ser o que quer dizer esse espetáculo?, e passa a ser o que se passou comigo na relação com o evento?.

O convite a que cada pessoa enuncie a coisidade do que viu, sentiu, percebeu durante o evento, se estende para além da cena, abrangendo, por exemplo: os gestos e reações de outros espectadores, durante o espetáculo, ou mesmo antes (no saguão do teatro, ou na rua antes da cena efetivamente começar) ou depois da proposição artística realizada (e, vale ressaltar, durante os debates, os artistas são também convidados a participar desse momento, a partir de sua posição e de sua percepção do evento); imagens e sonoridades outras percebidas no curso do evento, para além daquelas circunscritas à escrita cênica; situações anteriores ao espetáculo, vistas naquele dia, quem sabe no caminho para o encontro teatral, ou mesmo mais cedo, em casa - quando se preparava para o evento -, ou no trabalho, ou na escola; situações observadas durante o debate em processo; entre outras.

Essa proposta quer evidenciar o modo performativo como os espectadores podem se disponibilizar para as reverberações e interferências das coisas ao redor no decorrer do processo receptivo-investigativo. Essa noção de performance como abertura para que os elementos da cena e os do entorno possam se tornar atuantes no processo de leitura artística pode ser compreendida com base nas proposições do teórico Paul Zumthor (2014ZUMTHOR, Paul. Performance, Recepção, Leitura. São Paulo: Cosac Naify, 2014.). O autor, para explicar a sua ideia de performance, recorre a uma cena de sua infância, referindo-se ao prazer que sentia, na Paris dos anos 1930, depois da escola, no caminho para casa, em parar para assistir a atuação de numerosos cantores de rua existentes no período. A pequena plateia que parava para assistir ao evento, formada sempre por 15 ou 20 pessoas, era convidada a cantar em coro com o artista. “Havia um texto, em geral muito fácil, que se podia comprar por alguns trocados, impresso grosseiramente em folhas volantes” (Zumthor, 2014, p. 32). Contudo, o que prendia a atenção dos passantes era tudo o que envolvia o show: o homem fazia chacotas, vendia as canções, apregoava, passava o chapéu. Todos os elementos que compunham o acontecimento eram parte integrante e inseparável da canção:

Havia o grupo, o riso das meninas, sobretudo no fim da tarde, na hora em que as vendedoras saiam de suas lojas, a rua em volta, os barulhos do mundo e, por cima, o céu de Paris que, no começo do inverno, sob as nuvens de neve, se tornava violeta. Mais ou menos tudo isso fazia parte da canção. Era a canção (Zumthor, 2014ZUMTHOR, Paul. Performance, Recepção, Leitura. São Paulo: Cosac Naify, 2014., p. 32).

O caráter performativo da canção era composto por todos os elementos que integravam o evento. Analisar a canção do repentista somente por seus versos, ou sua melodia, ou pelo gestual do intérprete pode ser tão válido quanto redutor para se pensar a potência estética do acontecimento artístico. Por mais que a análise de cada elemento separadamente possa aprimorar o conhecimento acerca do fato, é somente em seu caráter performativo, que integra toda a substância presente no presente, inclusive os barulhos e gestos do mundo, que a canção pode se efetivar como um “encontro luminoso” (Zumthor, 2014ZUMTHOR, Paul. Performance, Recepção, Leitura. São Paulo: Cosac Naify, 2014., p. 33).

Enunciar as coisas simplesmente percebidas ou tomadas como impactantes por cada espectador no evento teatral - a noção de evento aqui, reiteramos, inclui o que ocorre também para além da cena, e que, de algum modo, se coloca em relação com o que acontece com cada espectador - tem o intuito de evocar o efeito de presença dessas coisas sobre o espectador. Ou seja, todos os elementos presentes no evento, em amplo espectro de abordagem, que afetam os espectadores, e participam direta ou indiretamente do ato receptivo, são convocados para o debate performativo. O que “[...] aponta para todos os tipos de eventos e processos nos quais se inicia ou se intensifica o impacto dos objetos ‘presentes’ sobre corpos humanos” (Gumbrecht, 2010GUMBRECHT, Hans-Ulrich. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto; PUC-RJ, 2010., p. 13).

Evocar a coisidade dos elementos tem o intuito de manifestar o que o sentido não consegue transmitir, de fazer ressoar, no espaço do encontro, a presença, a materialidade de cada objeto enunciado por cada espectador. Sem que cada coisa evocada precise necessariamente fazer sentido com o espetáculo em questão, ou com a sequência de lances desferidas pelo coletivo de espectadores no correr do processo de leitura. Pois, “[...] se atribuirmos um sentido a alguma coisa presente, isto é, se formarmos uma ideia do que essa coisa pode ser em relação a nós mesmos, parece que atenuamos inevitavelmente o impacto dessa coisa sobre o nosso corpo e os nossos sentidos” (Gumbrecht, 2010GUMBRECHT, Hans-Ulrich. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto; PUC-RJ, 2010., p. 14).

De modo que os espectadores, no correr da experiência estética que se efetiva, e que se evidencia ali, no espaço de trocas estabelecido entre as pessoas, se disponibilizem para fazer com que as “coisas do espetáculo”, em tensão com as “coisas do mundo”, que se façam presentes durante o ato artístico coletivo, possam “oscilar entre efeitos de presença e efeitos de sentido” (Gumbrecht, 2010GUMBRECHT, Hans-Ulrich. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto; PUC-RJ, 2010., p. 15).

Outro aspecto marcante e recorrente nos debates performativos propostos pelo iNerTE está no convite à presentificação da memória, surgida em tensão com os lances propostos pelos artistas, e na chispa dos contralances inauditos efetuados pelos espectadores no ato em processo.

Tal como Proust ante a experiência da madeleine, quando se percebe estranhamente impactado ao saborear o tradicional bolinho acompanhado de uma xícara de chá. E se vê lançado em momento fecundo, que faz vibrar o campo da subjetividade, que desencadeia uma deriva em busca do tempo perdido, em busca do que se perdeu no tempo, do essencial que resta esquecido e pode fazer movimentar o antes, o agora e o depois, e que pressiona a busca por outro modo de compreender a própria noção de tempo. Um tempo que, nesses instantes singulares, não se permite mais ser recortado em passado, presente e futuro, segundo esquemas espaciais, mas que propõe a experiência não-discursiva da duração, tão mobilizadora quanto de difícil enunciação:

E logo, maquinalmente, acabrunhado pelo dia tristonho e a perspectiva de um dia seguinte igualmente sombrio, levei à boca uma colherada de chá onde deixara amolecer um pedaço de madeleine. [...] Invadira-me um prazer delicioso, isolado sem a noção de sua causa. [...] Já não me sentia medíocre, contingente, mortal. De onde poderia ter vindo essa alegria poderosa? Sentia que estava ligada ao gosto do chá e do biscoito, mas ultrapassava-o infinitamente, não deveria ser da mesma espécie. De onde vinha? Que significaria? [...] Deponho a xícara e me dirijo ao meu espírito. Cabe a ele encontrar a verdade. Mas de que modo? Incerteza grave, todas as vezes em que o espírito se sente ultrapassado por si mesmo; quando ele, o pesquisador, é ao mesmo tempo a região obscura que deve pesquisar e onde toda a sua bagagem não lhe servirá para nada [...] (Proust, 2003PROUST, Marcel. No Caminho de Swann. São Paulo: Folha de São Paulo, 2003., p. 48-51).

Proust percebe que há a necessidade de um corte, de uma interrupção, de uma mudança de referenciais temporais para que possa capturar-se em pleno voo, captar o que acontece nesse momento privilegiado. Mas sabe também que, nesse instante fecundo, seu capital cultural terá pouca utilidade, sua bagagem não lhe servirá para nada, pois “não se trata de um acontecimento de ordem cognitiva e sim de um fenômeno de intensidade existencial” (Guattari, 2006GUATTARI, Félix. Caosmose. Um Novo Paradigma Estético. São Paulo: Editora 34, 2006., p. 81), que evoca lances significativos da memória, surgidos de maneira involuntária:

E de súbito a lembrança me apareceu. Aquele gosto era o do pedacinho de madeleine que minha tia Léonie me dava aos domingos pela manhã em Combray (porque nesse dia eu não saía antes da hora da missa), quando ia lhe dar bom-dia no seu quarto, depois de mergulhá-lo em sua infusão de chá ou de tília. [...]

E logo reconheci o gosto do pedaço de madeleine mergulhado no chá que me dava minha tia (embora não soubesse ainda e devesse deixar para bem mais tarde a descoberta de por que essa lembrança me fazia feliz), logo a velha casa cinzenta que dava para a rua, onde estava o quarto dela, veio como um cenário de teatro se colar ao pequeno pavilhão, que dava para o jardim, [...] a praça para onde me mandavam antes do almoço, as ruas aonde eu ia correr, os caminhos por onde passeava quando fazia bom tempo. [...] e toda Combray e suas redondezas, tudo isso que toma forma e solidez, saiu, cidade e jardins, de minha xícara de chá (Proust, 2003PROUST, Marcel. No Caminho de Swann. São Paulo: Folha de São Paulo, 2003., p. 48-51).

Seria ineficaz, segundo Proust, querer trazer à tona esses lances do passado através da lembrança, pois o que é catalogado e disponibilizado pela memória voluntária, a memória da inteligência, não conserva nada de significativo dos fatos vividos. “É trabalho perdido procurar evocá-lo; todos os esforços da inteligência são inúteis. Ele está escondido fora de seu domínio e de seu alcance” (Proust apud Benjamin, 2006BENJAMIN, Walter. Passagens. Belo Horizonte: Editora UFMG; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2006., p. 447).

Contudo, no campo dos signos artísticos, daquilo que pode ser evocado pela memória involuntária por meio da potência das proposições artísticas, fazendo vibrar formações estéticas inconscientes, tal como podemos compreender em diálogo com Proust, não se trata de uma perspectiva freudiana, de trazer à tona uma relação esperada, previamente estabelecida mas até então escondida nas profundezas da psique. Trata-se muito mais da invenção de sentidos, de composições e elaborações inauditas, que não partem em busca de uma verdade pré-existente, que precisa ser desvendada. Não se trata, pois, de reaver um dado momento traumático do passado que possa esclarecer e resolver os sintomas do presente, ou de “partir à procura de chaves interpretativas entre um conteúdo manifesto e um conteúdo latente” (Guattari, 2006GUATTARI, Félix. Caosmose. Um Novo Paradigma Estético. São Paulo: Editora 34, 2006., p. 81).

Ou seja, se, nos debates performativos propostos pelo iNerTE, nos valemos de dispositivos que convidam os espectadores a se relacionar e a elaborar substâncias provenientes da memória involuntária, essas propostas não estão voltadas prioritariamente para a evidenciação de cenas do passado, em uma perspectiva nostálgica, ou de liberação e elaboração de conteúdos recalcados. E, de fato, não é isso o que se efetiva, pois não se trata mais das cenas do passado. Os lances sensoriais, imagéticos e narrativos enunciados pelos espectadores presentificam uma outra cena, uma cena que se produz ali, instaurada naquele instante fecundo, e que se faz como ato artístico, marcado por tensões estéticas - em fricção com as provocações artísticas do espetáculo em questão, com os dispositivos propostos no debate e com os demais lances desferidos por outros participantes do encontro - e marcado por tensões sociais - em diálogo com os vislumbres do presente histórico, surgidos da profusão de agoras, carregados de frustrações, angústias, desejos, sonhos, necessidades, que brotam da interrupção do continuum do tempo (Benjamin, 1993BENJAMIN, Walter. Obras Escolhidas: magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1993.).

Ou seja, os lances performativos efetivados pelos espectadores, motivados pelo debate, presentam outra cena, a partir das angústias do presente. Não se trata mais da cena do passado, mas de uma narrativa que se faz como gesto performativo, como ato artístico, que se dá em diálogo com o contexto estético, estabelecido pelo espetáculo e pelos dispositivos cênicos propostos nos debates, e com o contexto histórico, em tensão com as incertezas do próprio tempo.

O processo de leitura artística coletiva consiste na busca por evidenciar coordenadas enunciativas e não em fornecer chaves explicativas. O que se busca é a possibilidade de invenção de linguagem, de elaboração de enunciados que escapem dos modelos repetitivos, que fomente a revisão crítica dos modelos adotados. Trata-se da tentativa - sempre fugidia, instável, incerta, e por vezes frustrada - “[...] não apenas de elucidar, de discernibilizar componentes já existentes, mas também de produzir componentes que ainda não estejam presentes” (Guattari, 2006GUATTARI, Félix. Caosmose. Um Novo Paradigma Estético. São Paulo: Editora 34, 2006., p. 82), e que se tornarão sempre já presentes a partir do momento em que são engendrados.

Referências

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    » https://www.itaucultural.org.br/ocupacao/manoel-de-barros/
  • BARTHES, Roland. O Prazer do Texto. São Paulo: Perspectiva, 1987.
  • BENJAMIN, Walter. Obras Escolhidas: magia e técnica, arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1993.
  • BENJAMIN, Walter. Passagens. Belo Horizonte: Editora UFMG; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2006.
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  • DESGRANGES, Flávio; SIMÕES, Giuliana (Org.). O Ato do Espectador: perspectivas artísticas e pedagógicas. São Paulo: Hucitec, 2017.
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  • GUIMARÃES ROSA, João. Grande Sertão: veredas (edição eletrônica). São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
  • GUMBRECHT, Hans-Ulrich. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto; PUC-RJ, 2010.
  • LARROSA, Jorge. La Experiencia de Lectura: estudios sobre literatura y formación (edição eletrônica). Barcelona: Fondo de Cultura Económica, 2011.
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  • SIMÕES, Giuliana; DESGRANGES, Flávio. Folias Galileu: o espectador em ato performativo. Sala Preta , São Paulo, v. 17, n. 1, p. 331-343, 2017. Disponível em: <Disponível em: https://doi.org/10.11606/issn.2238-3867.v17i1p331-343 >. Acesso em: 01 jul. 2019.
    » https://doi.org/10.11606/issn.2238-3867.v17i1p331-343
  • ZUMTHOR, Paul. Performance, Recepção, Leitura. São Paulo: Cosac Naify, 2014.
  • 1
    Entrevista com o poeta apresentada em vídeo na Ocupação Manoel de Barros, no Itaú Cultural - São Paulo, fev. - abr. 2019. Disponível em: <https://www. itaucultural.org.br/ocupacao/manoel-de-barros/>. Acesso em: 01 jul. 2019.
  • 2
    O INerTE foi criado em 2004, em São Paulo, junto ao Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade de São Paulo (USP). Em 2015, o grupo se transfere para Florianópolis, passando a atuar com o Programa de Pós-Graduação em Teatro da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Disponível em: <https://youtu.be/R5ivJxQI2Ro>. Acesso em: 01 jul. 2019.
  • 3
    Maiores detalhes sobre o grupo podem ser encontrados em Desgranges e Simões (2017DESGRANGES, Flávio; SIMÕES, Giuliana (Org.). O Ato do Espectador: perspectivas artísticas e pedagógicas. São Paulo: Hucitec, 2017.).
  • 4
    Artigo sobre esse debate performativo está publicado em Simões e Desgranges (2017SIMÕES, Giuliana; DESGRANGES, Flávio. Folias Galileu: o espectador em ato performativo. Sala Preta , São Paulo, v. 17, n. 1, p. 331-343, 2017. Disponível em: <Disponível em: https://doi.org/10.11606/issn.2238-3867.v17i1p331-343 >. Acesso em: 01 jul. 2019.
    https://doi.org/10.11606/issn.2238-3867....
    )
  • 5
    Debate Performativo Folias Galileu (vídeo): <https://www.youtube. com/watch?v=VCGEycR3tGU>. Acesso em: 01 jul. 2019.
  • Este texto inédito também se encontra publicado em inglês neste número do periódico.
  • Editores-responsáveis: Verônica Veloso, Maria Lúcia Pupo e Gilberto Icle

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    30 Jul 2019
  • Aceito
    05 Dez 2019
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