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Embodiment (Corporalização), Soma e Dança: alguns nexos possíveis

Embodiment, Soma et Danse: quelques liens possibles

Resumo:

Apresenta-se, primeiramente, uma revisão de aspectos centrais da teoria da mente corporificada de George Lakoff e Mark Johnson. Em seguida, discute-se a ideia de consciência celular pela perspectiva da neurobiologia. Em um terceiro momento, apresenta-se o campo da Educação Somática. Por fim, aproximando-se da área da Dança, expõe-se o tema da influência exercida pela somática nessa área e desenvolve-se um exercício de identificação e possibilidade de nexos existentes entre a somatização na dança e a corporalização.

Palavras-chave:
Embodiment; Educação Somática; Consciência celular; Dança

Résumé:

Cet article présente, en premier lieu, une révision des aspects centraux de la théorie d’embodiment de George Lakoff et de Mark Johnson. Il discute ensuite l’idée de conscience cellulaire du point de vue de la neurobiologie. Dans un troisième moment, il présente le champs de l’éducation somatique. Enfin, en abordant le champs de la danse, il expose le thème de l’influence somatique dans ce champs et développe un exercice d’identification et de possibilité de liens existants entre la somatisation en danse et l’embodiment.

Mots-clés:
Embodiment; Education Somatique; Conscience cellulaire; Danse

Abstract:

This article´s first objective is to approach the fundamentals of the embodied mind theory by George Lakoff and Mark Johnson to discuss the idea of cellular consciousness from the perspective of neurobiology. We also discuss the field of Somatics and its potential applications on dance, highlighting the possible links between somatization and embodiment.

Keywords:
Embodiment; Somatics; Cellular consciousness; Dance

Introdução

A experiência de vivenciar-se, em intensidades mais fortes, como ser perceptivo e emotivo, se desidentificando com a dominância do ser racional, é uma característica de boa parte do fazer e do apreciar artístico. As artes da cena constituem um lugar no qual a vivência consciente da vida perceptiva do ser, do estar e do mover-se é privilegiada. É consenso que, nesses territórios artísticos, a percepção postural e cinestésica1 1 Neste artigo, apesar da propriocepção e da cinestesia serem processos muito relacionados entre si, considerou-se a seguinte distinção: que a propriocepção pode ser compreendida como percepção de localização de pontos ou zonas no espaço interno corporal, como também, das relações espaciais entre elas, dizendo respeito ao nosso sistema postural reflexo; e que a cinestesia corresponde a um perceber/sentir o movimento associado à percepção espaço-temporal/rítmica do movimento. O referencial para essa colocação encontra-se na Fisiologia, no fato de que há um tipo de receptor sensorial dominantemente proprioceptivo, e outro dominantemente cinestésico. compõe um fundamento para abordagens criativas, seja no âmbito da cena, do ensaio, ou da formação. Na produção acadêmica referente à pesquisa em artes cênicas, são muitos os estudos dedicados a discutir a presença nuclear de processos proprioceptivos e cinestésicos no fazer artístico e pedagógico.

Diante do vasto panorama das possibilidades da arte da cena, este artigo irá focar a dança e, especificamente, a dança de exploração sensório-perceptiva, que não segue nenhuma escola de codificação do movimento e da forma corporal, nem de estilização da expressão. No entanto, este artigo se inicia com uma visita a territórios da Filosofia2 2 Será usada inicial em letra maiúscula para palavras que estejam sendo utilizadas como nome de áreas, subáreas ou campos do conhecimento acadêmico. Exemplos: Filosofia, Fisiologia, Dança, Educação Somática. Quando essas mesmas palavras não estiverem se referindo a áreas, subáreas ou campos do conhecimento formalizado, mas sim a práticas ou a fenômenos, suas iniciais virão em letra minúscula, como ocorre com qualquer palavra. , seguida de adentramentos em territórios da Biologia e da Educação Somática. Por fim, territórios cruzados da Dança serão explorados. O que se objetiva é evidenciar a potência de transformação existente na prática sensório-perceptiva do movimento.

A Filosofia é trazida para o interior do texto por meio de uma revisão introdutória de aspectos centrais da teoria da corporalização (embodiment) desenvolvida por George Lakoff e Mark Johnson. A Biologia é visitada em uma discussão localizada na fisiologia celular, com foco na ideia de consciência celular, por meio de ponderações de Bonnie Brainbridge Cohen (criadora do método Body-Mind Centering - BMC) e de cientistas que se dedicam a estudos neurobiológicos, dentre eles os neurologistas Antônio Damásio e Oliver Sacks. A Educação Somática é abordada partindo-se da conceitualização de soma tal qual demarcada por Thomas Hanna, e avançando-se para a ideia de somatização.

Finalizo esta introdução explicando por que iniciei o artigo pela Filosofia. Porque a filosofia aqui revisada, e que tem sua legitimidade e atualidade reconhecida em grande parte do meio científico-acadêmico, pode ser utilizada como parâmetro ou como provocação para refletirmos a respeito das práticas criativas de exploração sensório-perceptiva do movimento, assim como a respeito de sua importância e potência. E também porque essa filosofia, que se baseia em paradigmas emergidos das Ciências Cognitivas, nos ajuda a entender que todas as práticas de exploração sensório-perceptiva do movimento, e não apenas as artísticas, precisam continuar extrapolando territórios, para agir de modo mais difundido na sociedade, já que as experiências vivenciadas nessas práticas abrem novos caminhos para a inteligência sensório-perceptiva, vibrando adiante no tempo, aprofundando-se nos corpos-mentes.

Em territórios da Filosofia...

Em 1999, no livro Philosophy in the flesh (Filosofia na carne), George Lakoff e Mark Johnson, a partir de um encontro da Filosofia com as Ciências Cognitivas, organizaram ideias que desafiaram questões centrais da filosofia ocidental apresentando uma alternativa ao dualismo corpo/mente fortemente nela enraizado: a teoria da corporalização (embodiment) do entendimento humano. Segundo os autores, a primeira descoberta das Ciências Cognitivas soou surpreendente: a descoberta de que “a maior parte do nosso pensamento é inconsciente”3 3 O termo inconsciente não é usado por Lakoff e Johnson no sentido freudiano, mas sim no sentido de ser aquilo que opera abaixo da cognição consciente. (Lakoff; Johnson, 1999, p. 10, tradução nossa), ou seja, transcorre abaixo da consciência, a esta inacessível.

Nas Ciências Cognitivas, o sentido do termo cognição é bem mais amplo do que aquele que lhe é dado na maior parte das tradições filosóficas, nas quais esse termo é utilizado exclusivamente como referente a estruturas conceituais ou proposicionais. Para as Ciências Cognitivas, cognição designa “[...] qualquer tipo de operação ou estrutura mental que pode ser estudada em termos precisos” (Lakoff; Johnson, 1999LAKOFF, George; JOHNSON, Mark. Philosophy in the flesh: the embodied mind and its challemge to western thought. New York: Basic Books, 1999., p. 11, tradução nossa).

As investigações de Lakoff e Johnson moldaram uma filosofia da mente que pode ser sintetizada em três sentenças que refletem os cruciais achados das Ciências Cognitivas: “A mente é inerentemente corporalizada. O pensamento é na maioria das vezes inconsciente. Conceitos abstratos são em grande medida metafóricos” (1999, p. 3, tradução nossa). A partir dessas premissas, temos que a razão humana não é descorporalizada, não está separada da carne, sendo incondicionalmente ligada a peculiaridades do funcionamento orgânico em interação com o meio físico e cultural. O senso de realidade do ser humano não depende apenas de sua capacidade racional, mas, principalmente, de processos cognitivos inconscientes desenvolvidos a partir da interação sensório-perceptiva do ser com o ambiente. Logo, os conceitos, os entendimentos que nos guiam na vida, são corporalizados.

Lakoff e Johnson apresentam três níveis de corporalização que estão sempre presentes, não havendo independência entre eles: o nível neural, o nível do inconsciente cognitivo e o nível da experiência consciente fenomenológica. O nível neural é visto como nível físico, porque os elementos que nele atuam, como as células gliais, estão vinculados diretamente a fenômenos da instância atômica, como os canais iônicos. As concepções metafóricas que ajudam os cientistas a entender esse nível da corporalização são abstrações vinculadas à ideia de circuitos (eles precisam metaforizar para tentar entender os fenômenos físicos microscópicos que estudam). O nível do inconsciente cognitivo diz respeito a todas as operações cognitivas que sucedem abaixo da consciência, e que são inacessíveis a ela. Engloba operações de complexidades diferentes, como: categorizações de nível básico envolvendo entendimentos temporais e espaciais; protótipos; esquemas de imagens, vogais, nomes, verbos. O nível da experiência consciente é fenomenológico, sendo o único acessível à consciência. Nele, encontra-se tudo o que podemos experienciar, como: todo tipo de pensamento (incluindo raciocínios matemáticos), o uso da linguagem, a interação com outras pessoas ou com o meio, nossos estados sentimentais (como sentir-se apaixonado), emocionais (reconhecer-se em pânico, ver-se em prantos etc.) e sensório-perceptivos (estar atento ao movimento dos pés ao andar, identificar um calafrio, sentir os olhos lacrimejarem etc.).

Lakoff e Johnson usam a metáfora do iceberg para definir o tamanho da consciência fenomenológica quando comparada com o inconsciente cognitivo. A consciência é a pontinha do iceberg, que fica para fora da água, e o inconsciente cognitivo é a enorme porção submersa do iceberg. A parte submersa “configura e estrutura todo o pensamento consciente” (Lakoff; Johnson, 1999, p. 13, tradução nossa). E, complementando a metáfora do iceberg, Lakoff e Johnson usam a metáfora da mão invisível: o inconsciente cognitivo é a mão oculta que “modela a maneira como nós conceitualizamos todos os aspectos da nossa experiência” (p. 13, tradução nossa).

A própria estrutura da razão vem de detalhes da nossa corporalização. Os mesmos mecanismos neurais e cognitivos que nos permitem perceber e nos mover, também criam nossos sistemas conceituais e modos de razão. Portanto, para compreender a razão, nós precisamos compreender os detalhes do nosso sistema visual, nosso sistema de movimento e os mecanismos gerais da ligação neural (Lakoff; Johnson, 1999LAKOFF, George; JOHNSON, Mark. Philosophy in the flesh: the embodied mind and its challemge to western thought. New York: Basic Books, 1999., p. 4, tradução nossa).

A corporalização dos conceitos é iniciada por meio da elaboração de metáforas ou esquemas metafóricos de nível básico por parte do inconsciente cognitivo. A seguir serão apresentadas metáforas de nível básico referentes à metaforização do tempo. O esquema metafórico do Quadro 1 é apresentado por Lakoff e Johnson como a mais básica metaforização do tempo: um observador no presente encarando à frente o futuro e, tendo atrás de si, o passado. Nesse esquema, vemos que o inconsciente cognitivo se referencia no registro do espaço e na memória espacial para delimitar discernimentos temporais:


Quadro 1 - Metáfora da orientação no tempo

O lugar observado lá na frente não é o agora. Para estar lá, o observador terá que se deslocar. No nível linguístico, esse esquema metafórico inconsciente se reflete em metáforas faladas tais quais: ‘Vamos deixar tudo para trás e seguir adiante’, ‘Vamos olhar para frente e enxergar o futuro’, ‘Ela tem um grande futuro à frente’. Vejamos o segundo esquema:


Quadro 2 - Metáfora do tempo em movimento

O Quadro 2 mostra a significação de objetos moventes que passam pelo observador. E agora vejamos, no Quadro 3, a combinação dos dois esquemas apresentados:


Quadro 3 - Combinação da Metáfora da orientação no tempo com a Metáfora do tempo em movimento

Nesse esquema composto, temos situações como: algo se desloca, vindo de longe; esse algo está à frente do observador, vindo em sua direção; ao se aproximar, acaba por passar pelo observador, ficando para trás do foco de visão do observador. Esse esquema é base para as seguintes metáforas que usamos no dia a dia: ‘O tempo está voando’, ‘Muitas transformações estão chegando para nós’, ‘É chegado o tempo da colheita’, ‘O prazo final está se aproximando’. Vejamos a seguir, Quadro 4, o esquema no qual há um observador movente:


Quadro 4 - Metáfora do observador em movimento

Essa metáfora ou esquema metafórico também pode ser chamada de metáfora da paisagem do tempo. Nela, o observador é dinâmico, e cada localização em seu caminho é um tempo. Por meio desse esquema, o tempo é conceitualizado como localizações e pedaços de um percurso espacial em uma paisagem. No próximo e último quadro, Quadro 5, temos mais um esquema composto: a combinação do esquema do Quadro 1 com o esquema do Quadro 4:


Quadro 5 - Combinação da Metáfora da orientação no tempo com a Metáfora do observador em movimento

Essa combinação gera a possibilidade de medir, delimitar o tempo, que será equivalente a uma extensão - comprido ou curto. O observador realiza uma ação dentro de um intervalo de tempo atribuído. São exemplos de metáforas do nível linguístico que emergem a partir desse esquema metafórico inconsciente: ‘Não vai dar, o tempo tá curto’, ‘Vamos ficar aqui um longo tempo, é melhor ir se acostumando’, ‘A palestra passou em um estalo’, ‘Estamos nos aproximando do Natal’, ‘Ele terá seu diploma dentro de três anos’.

As metáforas expostas nos quadros são metáforas temporais de nível básico. Outros exemplos de metáforas básicas são as de causa-efeito (evento-causa). O grau de complexidade das metáforas vai aumentando conforme elas se combinam, sendo que existem metáforas bastante complexas. Com a complexificação crescente, corporalizamos entendimentos cada vez mais intrincados, de modo que até mesmo difíceis conceitos filosóficos estão baseados em esquemas corporalizados: “Os conceitos que governam nosso pensamento não são apenas conteúdos do nosso intelecto” (Lakoff; Johnson, 1997LAKOFF, George; JOHNSON, Mark. Metaphors we live by. In: O’BRIEN, Jodi (Org.). The production of reality: essays and readings on social interaction. Walnut CReek, California: Altamira Press, 1997., p. 124, tradução nossa). Por toda a vida seguiremos corporalizando entendimentos:

Quando crescemos, nós não perdemos esses entendimentos corporlizados ou nossas maneiras corporais de gerar entendimentos e reflexões. Ao invés disso, nós nos apropriamos delas e as recrutamos nas possibilidades do nosso pensar, como nos nossos mais refinados, abstratos modos de entender e refletir (Johnson, 2007JOHNSON, Mark. The meaning of the body: aesthetics of human understanding. Chicago; London: The University of Chicago Press, 2007. , p. 51, tradução nossa).

Johnson (2015JOHNSON, Mark. Embodied understanding. Frontiers in psychology, v. 6, article 875, jun. 2015.), em artigo mais recente, escrito individualmente, utiliza o termo entendimento biofuncional, cunhado em 1980 por Asghar Iran-Nejad, para se referir a essa cognição metafórica inconsciente que gera significados a partir de registros de nossas relações físicas funcionais com o meio físico e cultural em que vivemos. Esse termo nos ajuda a lembrar de algo que Johnson enfatiza no livro The meaning of the body (2007): que não somos os únicos seres do planeta Terra a ter cognição; que, ao contrário, estamos evolutivamente ligados a uma grande variedade de cognições animais. Para Johnson, é muito importante buscarmos nomes apropriados para os fenômenos que compõem a corporalização; irmos revendo os usos linguísticos que fazemos dos termos corpo e mente, pois, comumente, a maneira de falar praticada ainda aborda corpo e mente como coisas distintas. Segundo Johnson, apenas ao mencionarmos a palavra corpo ou a palavra mente, em determinados contextos semânticos, já estamos reforçando o falso dualismo corpo/mente.

Na direção contrária desse dualismo, a teoria do inconsciente metafórico aponta para uma via dupla de interferência existente entre processos cognitivos inconscientes e cognição consciente. Isso descortina a condição ilusória do objetivismo, a falácia da verdade absoluta (Lakoff; Johnson, 2002LAKOFF, George; JOHNSON, Mark. Metáforas da vida cotidiana. Campinas: Mercado de Letras; São Paulo: Educ, 2002.). Se a experiência perceptiva e emotiva, que é também experiência cultural, é a base das formulações cognitivas, nenhum pressuposto da razão pode se impor aos sentidos (entendimentos, significados) trazidos por essa experiência. Ao conceber a mente como parte do corpo, a teoria da corporalização vai na direção oposta daquela tomada por diferentes tradições filosóficas que ainda hoje são influentes. Conforme ressaltado por Lakoff e Johnson (1999), a corporalização está nuclearmente em desacordo com o pensamento, dentre outros nomes, de Noam Chomsky (1928-), de Gottlob Frege (1848-1925), de Immanuel Kant (1724-1804) e de René Descartes (1596-1650).

A corporalização vai de encontro também a concepções menos antigas, como: concepções pós-estruturalistas que radicalizam a contingência histórica, a arbitrariedade e a relativização do entendimento; concepções fenomenológicas que consideram a introspecção como chave completa para o entendimento das experiências; e concepções computacionais, para as quais a mente é como um software de computador que gera entendimentos transformando símbolos, que não possuem significados, em símbolos semânticos, por meio de um processamento de dados que segue regras pré-definidas. Na teoria do entendimento corporalizado, a concepção de significados desenvolve-se a partir de operações inconscientes de categorizações das experiências realizadas em sinergia com o meio físico e cultural. Por outro lado, Lakoff e Johnson enfatizam que houve filósofos que identificaram fenômenos da corporalização, como John Dewey (1859-1952) e Merleau-Ponty (1908-1961), mas que, por não terem o suporte de metodologias que pudessem validar empiricamente suas concepções, não tiveram como contestar com força o caráter equivocado do dualismo mente/corpo.

Nesse contexto, é válido relembrar as premissas da filosofia metafísica da mente desenvolvida por Descartes, já que ela se tornou matriz para várias outras metafísicas posteriores: “A mente pode conhecer suas próprias ideias com absoluta certeza. Todos os pensamentos são conscientes. A estrutura da mente é diretamente accessível a ela mesma. A mente é descorporalizada” (Descartes apud Lakoff; Johnson, 1999LAKOFF, George; JOHNSON, Mark. Philosophy in the flesh: the embodied mind and its challemge to western thought. New York: Basic Books, 1999., p. 392, tradução nossa). Essas ideias de Descartes geraram “[...] uma nova visão metafórica da mente enquanto ato de representar, em algum domínio interno, os objetos existentes no mundo ‘externo’” (Lakoff; Johnson, 1999, p. 391, tradução nossa).

Christine Greiner e Helena Katz (2001GREINER, Christine; KATZ, Helena. Corpo e processos de comunicação. Revista Fronteiras: estudos midiáticos, v. 3, n. 2, p. 66-74, dez. 2001.), tangenciando a filosofia de Descartes, nos conduzem a um regresso no tempo para recordar o advento do espaço linear de perspectiva, que se desenvolveu durante a Renascença italiana, no século XV, e, por esse viés, exemplificam como conexões de sentido estão sempre presentes no meio, atravessando fenômenos distintos e se desdobrando no tempo. Na pintura de perspectiva feita por Filippo Brunelleschi (1377-1446), a verticalidade chapada do espaço (típica das pinturas da época medieval) é abandonada. O espaço horizontaliza-se e se faz infinito por meio do ponto de fuga. Conforme abordado por Greiner e Katz, a perspectiva espacial presente nesse tipo de pintura colocou o observador diante de uma paisagem como se estivesse observando-a através de uma janela, e essa condição, tornada um hábito, colaborou para o desenvolvimento de uma disposição psicológica: a do self exterior - o eu que observa o mundo estando fora dele, e que observa o corpo lá no mundo, não se identificando com esse corpo. Nesse contexto, o corpo é um obstáculo visual na externa paisagem observada, e um obstáculo conceitual que precisa ser removido do caminho.

Ainda considerando Greiner e Katz (2001GREINER, Christine; KATZ, Helena. Corpo e processos de comunicação. Revista Fronteiras: estudos midiáticos, v. 3, n. 2, p. 66-74, dez. 2001.), quando a fenomenologia começou a ganhar força, essa concepção de dentro/fora incomunicáveis passou a ser desestabilizada na Filosofia. A visão fenomenológica (de Husserl a Merleau-Ponty, passando por Heidegger) do ser humano - fenômeno que vive em um mundo circunstancial, no qual não há verdades objetivas - faz tremer a demarcação dentro/fora, causa deslocamentos, e traz a corporalidade e a carne humana para o foco. Entretanto, a fenomenologia tradicional não se debruçou sobre os estudos do inconsciente, nem sobre as novidades da neurofisiologia, sendo que, nesse contexto, filósofos do pragmatismo desempenharam um importante papel, como William James (1842-1910), que propôs uma psicologia fundamentada na experiência. Com isso, “[...] a concepção de que os processos de conhecimento se dão a partir de interações entre corpo e ambiente ganhou uma nova força” (Greiner; Katz, 2001, p. 70).

Quando John Dewey defendeu que há uma continuidade (da qual rupturas e retomadas fazem parte) entre a experiência relacional do organismo com o mundo e os julgamentos das circunstâncias por parte da consciência, também ele participou da reconfiguração das ideias de dentro e fora. Conforme as Ciências Cognitivas avançaram no ambiente científico e reverberaram na filosofia, a secção dentro/fora foi completamente desestabilizada. Nesse contexto, o evolucionismo colaborou fortemente na evidenciação de que a vida, em todos os seres vivos, incluindo o ser humano, é fundamentalmente troca entre organismo e meio.

Em territórios da Biologia...

Na Biologia, há uma delimitação estabelecida entre dentro e fora que consiste na própria condição evolutiva primordial para o surgimento e a manutenção da vida: a delimitação estabelecida pela membrana celular. Dentre as propriedades mais importantes da membrana, está sua atravessabilidade, ou seja, sua capacidade de realizar interação entre o dentro e o fora. A membrana só existe porque o meio ambiente existe. Como exposto por Clélia Ferraz Pereira de Queiroz (2013QUEIROZ, Clélia Ferraz de. Corpo, mente, movimento e contato: BMC e dança, arte e ciência. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora: 2013., p. 30): “As membranas crescem homomorficamente por acréscimo e inserção de tecido constitutivo em membranas preexistentes”.

Separando o interior da célula do meio exterior, a membrana, comparada com o todo do volume celular, é extremamente fina. Em organismos pluricelulares, ela também é a delimitação que separa a célula de todas as outras com as quais vive coletivamente. Formada por uma bicamada de lipídios, a membrana contorna os limites da célula como se fosse sua pele, delineando-lhe uma forma. Segundo Lauralee Sherwood (2011SHERWOOD, Lauralee. Fisiologia humana das células aos sistemas. São Paulo: Cengage Learning, 2011.), os lipídios vibram, giram e se movem trocando de lugar uns com os outros milhões de vezes por segundo.

Os movimentos existentes dentro da célula são necessários para a manutenção da vida celular, pois é por movimentos que o interior da célula se relaciona com o ambiente externo, mantendo seu equilíbrio e sobrevivência. Conhecido como homeostase, esse equilíbrio consiste em uma profusão de acontecimentos inerentes a trocas com o meio: é responder às situações para as quais o meio exige uma resposta; é responder a necessidades internas. Processos metabólicos vão acontecendo para possibilitar ajustes homeostáticos. Trata-se de uma complexa sinergia orgânica, um grande entrosamento de inúmeras operações celulares causadas por diferentes conjunturas.

Gerenciando as contínuas trocas com o meio ambiente, necessárias para a manutenção da homeostase, a membrana faz a intermediação de todo o movimento de entrada e saída de substâncias na célula - sua permeabilidade é altamente inteligente, sendo que essa inteligência é resultado de bilhões de anos de evolução. Como expõe Queiroz (2013QUEIROZ, Clélia Ferraz de. Corpo, mente, movimento e contato: BMC e dança, arte e ciência. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora: 2013., p. 29), baseando-se em Jesper Hoffmeyer: “[...] os organismos vivos levaram bilhões de anos para que as fronteiras abertas dos organismos indeterminados dessem lugar à ação reguladora das membranas”.

De acordo com Sherwood, a função de delimitação e comunicação exercida pela membrana é sua função primordial, e pode ser subdividida em funções mais específicas, dentre as quais vale destacar: “Integrar a célula a outras células, e permitir que a célula reaja a informações e mudanças do ambiente, participando da comunicação entre as células” (Sherwood, 2011, p. 53). A comunicabilidade celular depende da excitabilidade da membrana: quanto mais a membrana for excitável, rapidamente capaz de responder a estímulos, mais a célula é uma eficiente comunicadora. A capacidade celular de reagir a estímulos ambientais é então crucial, tanto para o funcionamento da célula, quanto para seu convívio com outras células, sendo que o convívio celular é condição primária para a inteligência celular evoluir em direção à inteligência orgânica e de sistemas orgânicos.

Para Bonnie Bainbridge Cohen (2015COHEN, Bonnie Bainbridge. Sentir, perceber e agir: educação somática pelo método Body-Mind Centering. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2015.), conforme exposto em seu livro sobre o método Body-Mind Centering (BMC)4 4 O livro de Bonnie Bainbridge Cohen, originalmente publicado no ano de 1993, foi escrito em inglês (título Sensing, feeling and action) e consiste no agrupamento de artigos escritos para a revista Contact Quarterly (CQ) ao longo dos anos de 1970 a 1980 (Nelson apud Cohen, 2015). (Centralização Corpo-mente), as membranas são os primeiros receptores sensoriais, pois, com mobilidade multidirecional constante de encolhimento/expansão, ocorrida por meio de inúmeros dobramentos e desdobramentos, elas registram o movimento de passagem de fluidos que as atravessam, o ritmo desse movimento e, ainda, a pressão que os fluidos exercem em suas paredes internas e externas. Por esse entendimento, fica nítido que as células, assim como nós, têm uma relação tátil com o meio, e respondem a ele de maneira inteligente. Cohen fala em feedback celular de interconexão:

Para que uma comunidade de células sobreviva, ela precisa ter um mecanismo de feedback de interconexão de cada célula para todas as outras células. Portanto, cada célula tem um sentido de si e se comunica com todas as outras células. [...] Células que têm feedback sensorial pobre têm mais dificuldade em coordenar seu ritmo com outras células. Células que são conscientes de si são mais capazes de se comunicar com suas células vizinhas. Quanto mais as células dentro de nós tomam consciência de si mesmas, há uma maior ressonância entre células, equilíbrio interior e autoconhecimento (Cohen, 2015COHEN, Bonnie Bainbridge. Sentir, perceber e agir: educação somática pelo método Body-Mind Centering. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2015., p. 7-8).

Para a neurobiologia contemporânea, o entendimento detalhado do que seja a consciência celular pode ser a chave para o entendimento a respeito da mente humana. Os neurologistas Oliver Sacks e Antônio Damásio (Sacks et al., 2015SACKS, Oliver et al. An open letter to Christof Koch. Scientific American, Mind Guest Blog, June 2015. Disponível em: <Disponível em: http://blogs.scientificamerican.com/mind-guest-blog/exclusive-oliver-sacks-antonio-damasio-and-others-debate-christof-koch-on-the-nature-of-consciousness /> Acesso em: 24 jun. 2015.
http://blogs.scientificamerican.com/mind...
), em texto escrito juntamente com outros cientistas, relacionam a propriedade de excitabilidade da membrana celular de alguns tipos de células com as origens da mente: uma alta excitabilidade que consiste em uma capacidade celular incomum de realizar trocas em altíssima velocidade, em uma escala de milissegundos. É o processo de reconhecer estímulos e responder a esses estímulos de modo excepcionalmente rápido. Os tipos específicos de células portadoras dessa habilidade são: as células receptoras de estímulo sensorial, os neurônios e as células musculares. Para os autores, um entendimento aprofundado de que a dinâmica do intercâmbio realizado na membrana se dá de modo variável nos diferentes tipos de células pode ser a chave para que venhamos a compreender a autoconsciência primitiva, também mencionada pelos autores como fagulha da senciência. As ideias apresentadas no texto, como afirmam os próprios autores, estão enraizadas fortemente em uma teoria já bastante assentada - a Teoria da Evolução -, mas que têm sido ainda pouco explorada. Nas palavras dos autores:

Esta abordagem direciona a procura pelas propriedades subjacentes à consciência ao nível do protozoário (um organismo unicelular), a fim de identificar, a nível celular, os mecanismos fundamentais que, quando amplificados em um complexo sistema nervoso, dão origem às propriedades normalmente referidas como ‘mente’. A questão não respondida é: Quais são as características das células vivas que condizem, em última instância, com os diversos fenômenos psicológicos de alto nível; fenômenos estes aparentemente existentes apenas em determinados organismos animais? (Sacks et al., 2015SACKS, Oliver et al. An open letter to Christof Koch. Scientific American, Mind Guest Blog, June 2015. Disponível em: <Disponível em: http://blogs.scientificamerican.com/mind-guest-blog/exclusive-oliver-sacks-antonio-damasio-and-others-debate-christof-koch-on-the-nature-of-consciousness /> Acesso em: 24 jun. 2015.
http://blogs.scientificamerican.com/mind...
, tradução nossa).

Em suas conclusões, os autores enfatizam que a atividade das numerosas células excitáveis deve ser bem sincronizada para que o organismo funcione de maneira coerente, ou seja, para que o comportamento a nível orgânico seja favorável à harmonização e preservação do organismo. Em termos evolutivos, isso seria uma condição primordial para o surgimento do mais alto nível de consciência. Os autores também mencionam que as células animais não são as únicas a responder a estímulos ambientais, já que células de plantas também possuem essa capacidade. No entanto, a alta excitabilidade dos neurônios do sistema nervoso dos animais extrapola tal capacidade, e diz respeito a um modo incomum de recrutar outras células excitáveis, conduzindo a um comportamento no organismo que visa ao reestabelecimento da equanimidade biológica (Sacks et al., 2015SACKS, Oliver et al. An open letter to Christof Koch. Scientific American, Mind Guest Blog, June 2015. Disponível em: <Disponível em: http://blogs.scientificamerican.com/mind-guest-blog/exclusive-oliver-sacks-antonio-damasio-and-others-debate-christof-koch-on-the-nature-of-consciousness /> Acesso em: 24 jun. 2015.
http://blogs.scientificamerican.com/mind...
).

Os biólogos Humberto Maturana e Francisco Varela (2003MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. De máquinas y seres vivos. Autoopoiesis: la organización de lo vivo. Buenos Aires: Lumen, 2003.), em sua Teoria Autopoiética, defendem que o surgimento da vida se deu devido à capacidade de autogerenciamento protagonizada pelas células na condição de sistemas abertos - a qual denominaram autopoiesis. Mentes sem self é uma expressão usada por Varela e Maturana que aponta diretamente para a ideia de que a capacidade de autogerenciamento dos organismos é equivalente àquilo que, nos organismos mais complexos, se chama mente.

Esses estudos reforçam o entendimento de que o corpo-mente é resultado de consciências microscópicas. Cada consciência microscópica está relacionada a movimentos microscópicos. Isso nos lembra que nosso movimento corporal é resultado não apenas de decisões, sentimentos, percepções etc., mas também de uma série de acontecimentos ocorridos em nível fisiológico. Como coloca Queiroz (2013QUEIROZ, Clélia Ferraz de. Corpo, mente, movimento e contato: BMC e dança, arte e ciência. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora: 2013., p. 27): “[...] movimentos podem ser tratados como um modo para avançar na sobrevivência [...] essa visão sobre movimentos ajuda a repensá-los como protagonistas de forças cognitivas no organismo”.

Em territórios do soma...

O filósofo Alva Nöe, logo na primeira página de seu livro Action in Perception, registra: “[...] perceber é uma maneira de agir [...] não é algo que acontece conosco, ou em nós. É algo que nós fazemos” (Nöe, 2006NOË, Alva. Action in perception. Cambridge: MIT Press, 2006., p. 1, tradução nossa). Essa concepção de percepção pode ser utilizada para ilustrar o centro da epistemologia da Educação Somática: ação como escuta perceptiva, e não como finalidade.

A Educação Somática configura-se como campo do conhecimento dedicado à exploração do fenômeno da repadronização neuromotora via experiência perceptiva/sensitiva do movimento (incluindo movimentos posturais, movimentos viscerais, como a respiração, e movimentos passivos ou assistidos), por meio de processos pedagógicos de conscientização corporal que prezam pelo autoconhecimento, trilhando um caminho que valoriza a subjetividade e busca maior bem-estar5 5 Não é tarefa deste artigo detalhar o perfil epistemológico da Educação Somática e seu histórico. Para essas informações, podem ser facilmente consultados documentos disponíveis na Web por acesso livre. No que diz respeito aos artigos escritos em português, publicados no Brasil a partir do final da década de 1990, dentre os principais nomes de autoria estão: Márcia Strazzacappa; Sylvie Fortin; Débora Bolsanello; Eloísa Domenici; José Antônio de Oliveira Lima; Ciane Fernandes; Marcilio Souza Vieira; Margherita De Giorgi; Neila Cristina Baldi e Maíra Santos. Além dessas referências, vale mencionar o artigo A quem possa interessar: a Educação Somática nas pesquisas acadêmicas (publicado no ano de 2015, no periódico Revista Brasileira de Estudos da Presença), de autoria de Priscila Rosseto Costa e Márcia Strazzacappa, que apresenta um levantamento da produção de artigos, teses, dissertações e monografias brasileiras que tratam a Educação Somática como principal temática. . O movimento é vivenciado não só em movimentações corporais pelo espaço, mas também em micromovimentos de ajustes posturais e em movimentos causados pelo toque. Em algumas propostas somáticas, a imaginação e a sonorização também são exploradas como vivências somáticas.

Débora Bolsanello (2010BOLSANELLO, Débora Pereira. Afinal, o que é a Educação Somática?. In: BOLSANELLO, Débora Pereira (Org.). Em pleno Corpo: Educação Somática, Movimento e Saúde. Curitiba: Juruá, 2010. P. 18-31., p. 18) elenca algumas propostas corporais que considera fazerem parte do campo somático: “Bartenieff, Técnica de Alexander, Feldenkrais, Antiginástica, Eutonia, Ginástica Holística, Continuum, Body-Mind Centering, Cadeias Musculares G.D.S., Somaritmo, Pilates, Sistema Postural Seijas e GYROTONIC”. Em relação às propostas brasileiras, é preciso enfatizar o Método Klaus Vianna e a Conscientização do Movimento, de Angel Vianna. Eloísa Domenici (2010DOMENICI, Eloisa. O encontro entre dança e educação somática como uma interface de questionamento epistemológico sobre as teorias do corpo. Pro-Posições, Campinas, v. 21, n. 2 (62), p. 69-85, maio/ago. 2010.) também menciona o trabalho desenvolvido por José Antônio Lima.

O processo de configuração da Educação Somática, como campo do conhecimento, foi iniciado pelo filósofo e professor Thomas Hanna (1928-1990), nos Estados Unidos (Association..., 2019ASSOCIATION for Hanna Somatic Education. History and Founder. Napa, 2019. Disponível em: <Disponível em: https://hannasomatics.com/index.php/about_somatics/history_and_founder/ >. Acesso em: 05 abr. 2019.
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). Em sua teoria, Hanna desenvolveu uma nova conceitualização para o antigo termo soma. Em seu livro, Bodies in revolt (Corpos em revolta), publicado em 1970, ele apresenta o soma como o trunfo da evolução - aquilo que o ser humano tem em comum com todos os outros seres vivos -, a sabedoria orgânica capaz de se autorregular. Na condição de experiência da consciência humana, o soma é o corpo quando experienciado pela sensibilidade de movimento, em contraste com o corpo como algo que se observa, se analisa e se mensura por meio de parâmetros objetivos: “‘Soma’ não significa ‘corpo’; significa ‘Eu, o ser corporal’ [...] Soma é tipo de vida, ser orgânico que você é neste momento, neste lugar onde você está” (Hanna, 1970HANNA, Thomas. Bodies in revolt: a primer in somatic thinking. New York: Dell Publishing, 1970. , p. 35, tradução nossa). Cohen (2015COHEN, Bonnie Bainbridge. Sentir, perceber e agir: educação somática pelo método Body-Mind Centering. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2015.) conta em seu livro que, durante a década de 1960, Hanna já estava falando sobre o soma e divulgando suas ideias.

Alguns anos após a publicação de Bodies in Revolt, Hanna cunhou o termo Somatics, que passou a ser usado para nomear o campo do conhecimento destinado a investigar a experiência somática e seus desdobramentos. Em português, a tradução desse termo ficou como Educação Somática. Somatics também foi o nome dado à primeira publicação periódica voltada para os fenômenos estudados por esse campo, criada por Hanna no ano de 1976 (Cohen, 2015COHEN, Bonnie Bainbridge. Sentir, perceber e agir: educação somática pelo método Body-Mind Centering. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2015.). Em seu artigo What is Somatics?, publicado postumamente, Hanna (1995a) novamente conceitualiza o soma referindo-se a ele como algo percebido pela perspectiva da interioridade corporal:

Quando um ser humano é observado de uma perspectiva exterior - isto é, do ponto-de-vista da terceira pessoa do discurso - o fenômeno percebido é o corpo humano. Mas, quando esse mesmo ser humano é observado pelo ponto-de-vista da primeira pessoa do discurso, ou seja, a partir de suas próprias sensações proprioceptivas, o que é percebido é um fenômeno categoricamente diferente: o soma humano (Hanna, 1995aHANNA, Thomas. What is Somatics? In: JOHNSON, Don Hanlon (Ed.). Bone, breath and gesture: practices of embodiment. Berkeley: North Atlantic Books; San Francisco: The California Institute of Integral Studies, 1995a. P. 341-352., p. 341, tradução nossa).

Como se pode notar, a experiência somática é fundamentada na inversão da ocultação da percepção, ou seja, ao invés de estarmos focando algo que acontece no ambiente, vivenciando nossa interação com o meio enquanto a percepção ocultamente realiza seu trabalho constante, focamos no funcionamento da percepção sensório-motora, procurando alinhar ou sintonizar a consciência atentiva com essa percepção. Sendo assim, nosso sexto sentido - o sentido gravitacional - está no núcleo da investigação somática.

Isso pode dar a impressão de que a experiência somática se caracteriza por ser um encontro da pessoa consigo mesma. Contudo, trata-se de uma vivência de conexão sensível consigo mesmo, com o outro e com o ambiente, já que, quando sensibilizados e sintonizados com nossas membranas, sentimos mais intensamente que somos atravessados pelo meio; que somos parte de algo maior: a sociedade, a natureza, o mundo, o tempo, o mistério. Isso significa que o soma pode ser desbravado pela consciência na interação com o outro e com o ambiente. Logo, estar em estado somático não é estar alienado em si mesmo, é estar em um estado intenso (que não significa tenso) de atenção perceptiva, que pode ser de dois tipos: focada e espalhada, sendo que ambas podem sondar tanto o dentro, quanto o fora (considerando a pele como fronteira dentro-fora). O soma, então, abrange a percepção em primeira pessoa sem que dele seja excluída a percepção em terceira pessoa:

O soma tem um talento duplo: ele pode sentir suas funções individuais próprias via percepção de primeira-pessoa, e pode perceber estruturas externas e situações objetivas via percepção de terceira-pessoa. Ele tem o talento distinto de possuir dois modos de percepção (Hanna, 1995aHANNA, Thomas. What is Somatics? In: JOHNSON, Don Hanlon (Ed.). Bone, breath and gesture: practices of embodiment. Berkeley: North Atlantic Books; San Francisco: The California Institute of Integral Studies, 1995a. P. 341-352., p. 346, tradução nossa).

A respeito da natureza interdisciplinar e transdisciplinar da Educação Somática, nota-se que há diálogo com as Artes, a Filosofia, a Fisioterapia, a Biologia, além de outras áreas. Dentre as ideias e teorias que influenciaram Hanna, temos: as filosofias de Merleau-Ponty, Nietzsche, Camus, Cassirer, Marx, Kierkegaard e Kant; a Teoria da Evolução, de Darwin; a Teoria Psicanalítica, de Freud; a Teoria do Desenvolvimento, de Piaget; a Teoria da Bioenergética, de Reich; e teorias da Etologia (Hanna, 1970). Conforme contextualiza Martha Eddy, esse percurso investigativo vivido por Hanna estava imerso em um ambiente filosófico que rompia com antigos paradigmas, valorizando a experiência perceptiva:

No século XX, como o racionalismo foi influenciado pelo existencialismo e pela fenomenologia, ocorreu, em parte das culturas acadêmica e escolar, uma mudança gradual nos suportes teóricos em direção à aprendizagem experiencial e à pesquisa sensorial. Essas mudanças foram catapultadas pelas teorias de Dewey, Merleau-Ponty e Whitehead (Eddy, 2009EDDY, Martha. A brief history of somatic practices and dance: historical development of the field of somatic education and its relationship to dance. Journal of Dance and Somatic Practices, v. 1, n. 1, p. 5-27, 2009., p. 6, tradução nossa).

No meio acadêmico, desde a proposição do campo somático, são comuns os exercícios teóricos que relacionam experiências somáticas com reflexões fenomenológicas, como, por exemplo, os textos de Elisabeth Behnke. Em algumas dessas discussões, encontramos o termo ‘corporalização’. No entanto, o exercício de relacionar o soma com a corporalização, encarando-se esta como fenômeno de nível físico (celular) e inconsciente, é mais raro.

No que tange ao alcance da proposta epistemológica e terminológica somática, é interessante notar que, na condição de acontecimento estadunidense, ela repercutiu de modo diferente em distintos locais do globo. No Brasil, parece ter havido uma recepção desobstruída à epistemologia da Educação Somática, assim como à sua terminologia, embora isso não signifique que não haja no Brasil pessoas que não se identificam com a proposta de Hanna. Mesmo nos Estados Unidos há discursos contrários ao entendimento de que os fenômenos relacionados pela epistemologia somática possam ser, de fato, configurados como campo do conhecimento. Em relação à França, é possível identificar que o termo education somatique (educação somática) está se tornando mais comum nos textos da área, substituindo às vezes o termo analyse du mouvement (análise do movimento), que é o mais usado para denominar o campo das práticas pedagógicas de investigação sensório-perceptiva do movimento. Em textos de Hubert Godard, Isabelle Ginot e Christine Roquet, dentre outros, podemos identificar o emprego de tal terminologia.

A história do surgimento da Educação Somática antecede a organização do campo somático, e nos remete às variadas ginásticas de conscientização e expressividade corporal muito praticadas na Europa e nos Estados Unidos na virada do século XIX para o século XX (Mullan 2016MULLAN, Kelly. Harmonic Gymnastics and Somatics: a genealogy of ideas. Currents, 2016. Disponível em: <Disponível em: https://www.academia.edu/32938188/Harmonic_Gymnastics_and_Somatics >. Acesso em: 07 abr. 2019.
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; Souza, 2011SOUZA, Elisa Teixeira de. O sistema de François Delsarte, o método de Emile Jaques-Dalcroze e suas relações com as origens da dança moderna. 2011. 273 f. Dissertação (Mestrado em Artes) - Programa de Pós-Graduação em Artes, Universidade de Brasília, Brasília, 2011. Disponível em: <Disponível em: http://repositorio.unb.br/bitstream/10482/9475/1/2011_ElisaTeixeiradeSouza.pdf >. Acesso em: 13 abr. 2019.
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). Conforme expõe Ciane Fernandes (2015FERNANDES, Ciane. Quando o todo é mais que a soma das Partes: somática como campo epistemológico contemporâneo. Revista Brasileira de Estudos da Presença, Porto Alegre, v. 5, n. 1, p. 9-38, jan./abr. 2015. Disponível em: <Disponível em: https://seer.ufrgs.br/presenca/article/view/47585 >. Acesso em: 17 abr. 2019.
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, p. 11), “[...] a origem da somática está na revolta contra o dualismo cartesiano a partir do movimento europeu de ginástica do final do século XIX, com o trabalho de François Delsarte, Emile Jaques-Dalcroze e Bess Mensendieck”. Nessa fala de Fernandes, aglutinam-se os dois principais tipos de ginásticas expressivas praticadas na época: as ginásticas pantomímicas delsartistas, Harmonic Gymnastic, Gymnastic (Ginástica Harmônica, Ginástica), e as ginásticas rítmicas, como a Eurritmia6 6 Em português, o nome do método de Emile Jaques-Dalcroze é escrito da mesma maneira: Eurritmia. de Jaques-Dalcroze.

Dentre as gerações de artistas-professores delsartistas, é válido enfatizar a importância da atuação de James Steele MacKaye nos EUA (1842-1894), e de Genevieve Stebbins (1857-1934) nos Estados Unidos (EUA) e na Europa, pois o movimento delsartista estadunidense foi um movimento cultural que repercutiu significativamente no continente europeu (Thomas, 1995THOMAS, Helen. Dance, modernity & culture: explorations in the sociology of dance. New York: Routledge, 1995. ; Ruyter, 1999RUYTER, Nancy Lee Chalfa. The cultivation of body and mind in nineteenth-century American Delsartism. London: Greenwood Press, 1999.; Souza, 2012SOUZA, Elisa Teixeira de. François Delsarte e a dança moderna: um encontro na expressividade corporal. Revista Brasileira de Estudos da Presença , Porto Alegre, v. 2, n. 2, p. 428-456, jul./dez. 2012. Disponível em: <Disponível em: https://seer.ufrgs.br/presenca/article/view/30315 >. Acesso em: 13 abr. 2019.
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). MacKaye foi quem sistematizou os princípios da análise da expressividade gestual desenvolvida por Delsarte, organizando-os em um formato de exercícios ginásticos e pantomímicos. Stebbins, que fora sua aluna, foi professora de Mensendieck (1864-1958) e de Hede Kallmeyer (1881-1976) - os nomes mais influentes da Gymnastic alemã (Hanna, 1995bHANNA, Thomas. Interview with Carola Speads. In: JOHNSON, Don Hanlon (Ed.). Bone, breath and gesture: practices of embodiment . Berkeley: North Atlantic Books ; San Francisco: The California Institute of Integral Studies , 1995b. P. 25-35.; Mullan, 2016MULLAN, Kelly. Harmonic Gymnastics and Somatics: a genealogy of ideas. Currents, 2016. Disponível em: <Disponível em: https://www.academia.edu/32938188/Harmonic_Gymnastics_and_Somatics >. Acesso em: 07 abr. 2019.
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) - e é apontada por especialistas em história da dança como precursora da modern dance dos EUA, pois desenvolveu uma prática de movimentações espiraladas como entremeio às poses ou atitudes pantomímicas (Ruyter, 1999; Thomas, 1995).

É possível identificar as relações significativas entre essas ginásticas expressivas e parte das pioneiras abordagens especificamente somáticas, havendo uma genealogia ligando esses dois mundos, sendo exemplos disso as trajetórias de vida de Elsa Gindler (1885-1961), a criadora da Ginástica Holística, e de Gerda Alexander (1908-1994), a criadora da Eutonia (Souza, 2016SOUZA, Elisa Teixeira de. Conscientização e expressividade corporal com base na Educação Somática: reflexões, diretrizes e repertórios de temas para estudos de movimentos. 2016. 358 f. Tese (Doutorado em Artes) - Programa de Pós-Graduação em Artes, Universidade de Brasília, Brasília, 2016. Disponível em <Disponível em repositorio.unb.br/bitstream/10482/21962/1/2016_ElisaTeixeiradeSouza.pdf >. Acesso em: 02 abr. 2019.
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). Além disso, é importante observar que o quadro genealógico da Educação Somática possui uma matriz ampla, abrigando diversos nomes que não possuem relações com as ginásticas pantomímicas e rítmicas, como é o caso, por exemplo, de Mathias Alexander (1869-1955), de Mabel Todd (1880-1956) e de Moshe Feldenkrais (1904-1984).

A utilização de metáforas imagéticas como provocadoras de alterações em padrões sensório-motores é um aspecto importante no campo somático, e pode-se considerar que Todd foi uma importante pioneira nessa aplicação. Sua pesquisa está diretamente ligada ao método Ideokinesis, sistematizado por sua aluna Lulu Sweigard. Assim como muitos dos estudos desenvolvidos por pioneiros somáticos, os estudos de Todd se basearam nas relações da filogênese com a ontogênese (Todd, 1937TODD, Mabel E. The thinking body: a study of the balancing forces of dynamic man. Princeton: Dance Horizons Book; Princeton Book Company, 1937.). Dentre as perguntas que ela se fez, estavam indagações como: ‘De que maneira se deu a associação das curvas e das retificações da coluna para que a espécie humana fosse capaz de vencer a força da gravidade?’; ‘Qual a relação entre a bipedia e a coordenação motora existente em movimentos precisos de observação e manipulação?’; ‘Como atuam as linhas que operam continuamente sobre o esqueleto?’.

Para Eddy (2009EDDY, Martha. A brief history of somatic practices and dance: historical development of the field of somatic education and its relationship to dance. Journal of Dance and Somatic Practices, v. 1, n. 1, p. 5-27, 2009.), o atual campo somático se ramificou em três - psicologia somática, trabalho corporal somático e movimento somático - e seu escopo geral pode ser agrupado e representado na expressão Somatic Movement Education and Therapy (SME&T) (Educação e Terapia do Movimento Somático), um nome mais detalhado que o termo proposto por Hanna. A história contemporânea da Educação Somática traz novos personagens para a cena, como a International Somatic Movement Education and Therapy Association (ISMETA) (Associação Internacional de Educação e Terapia do Movimento Somático), em um contexto de expansão.

Conforme observado por Cohen (2015COHEN, Bonnie Bainbridge. Sentir, perceber e agir: educação somática pelo método Body-Mind Centering. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2015.), as ferramentas do trabalho somático são: movimento, toque, visualização e sonorização, sendo válido lembrar que o termo movimento, nesse contexto, inclui movimentos de ajuste postural, movimentos assistidos e movimentos respiratórios. Essas ferramentas podem ser usadas individualmente ou em duplas, trios, grupos. Podem ser trabalhadas de maneira isolada (apenas uma ferramenta) ou combinada (mais de uma ferramenta ao mesmo tempo). O uso de orientação falada, por parte do condutor da vivência somática, pode ser continuado, estimulando constantemente o desenrolar da experiência, ou mais pausado, podendo também acontecer apenas como uma instrução anterior à experiência.

As vivências somáticas podem se dar tanto como experiências recebidas pelas mãos de um profissional da área, por meio de toque e manipulação, quanto como experiências realizadas (práticas), seja no contexto de um protocolo somático ordenado, seja no contexto de uma exploração somática, algo mais aberto. As práticas normalmente são guiadas por um profissional da área, mas não necessariamente, pois também são possíveis de serem vivenciadas autonomamente. Ao mover-se somaticamente, a pessoa está vivendo o movimento como um meio, e não como um fim. Não há objetivo a alcançar: o movimento não acontece porque preciso pegar algo ou chegar a algum lugar, ele acontece porque o objetivo é perceber. As técnicas somáticas empregadas podem ser de movimentação, de sonorização, de visualização e de toque/manipulação.

Em relação à expressão exploração somática, vale contextualizar que a palavra exploração é aqui referida em um sentido que se harmoniza com a visão de Nöe a respeito da percepção (perceber é agir), e com entendimentos expostos pela cientista cognitiva do desenvolvimento, Esther Thelen, conforme apresentados por Queiroz (2013QUEIROZ, Clélia Ferraz de. Corpo, mente, movimento e contato: BMC e dança, arte e ciência. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora: 2013., p. 100): “Exploração são movimentos que geram informação sobre quem percebe e o que é percebido [...] Cada exploração é um processo de testar e selecionar mais informação [...] não há separação entre ação e percepção na exploração”.

A maior parte das propostas somáticas lidam com conteúdos corporais que possuem uma forma e que são potencialmente palpáveis, o que engloba tanto as partes corporais que podemos tocar, quanto as partes que não conseguimos tocar diretamente, mas que são potencialmente sujeitas ao toque. São exemplos: músculos, ossos, ligamentos, pele, pulmão. Esses estudos somáticos podem ser considerados estudos em anatomia experimental ou anatomia funcional, termos aos quais recorreram muitos especialistas da área em suas produções bibliográficas, como no subtítulo de um livro de Irene Dowd: Taking root to fly: articles on functional anatomy by Irene Dowd (Enraizar para voar: artigos em anatomia funcional por Irene Dowd) (1981); e no subtítulo do livro de Cohen: Sensing, feeling, and action: the experimental anatomy of Body-Mind Centering (Sentir, perceber e agir: a anatomia experimental do Body-Mind Centering) (1993).

Todavia, algumas propostas somáticas extrapolam os territórios dos conteúdos corporais palpáveis, almejando acessar territórios microscópicos. Penso que poderíamos chamar essas abordagens de fisiologia experiencial. Nos Bartenieff’ Fundamentals (Fundamentos de Bartenieff) temos um exemplo desse tipo de exploração, pois Irmgard Bartenieff desenvolveu procedimentos que visam sintonizar consciência fenomenológica com consciência celular respiratória. Essa exploração foi nomeada respiração celular, e Bartenieff contou com a colaboração de Cohen durante a concepção dessa proposta (Hackney, 2002HACKNEY, Peggy. Making connection: total body integration through Bartenieff Fundamentals. New York; London: Routledge, 2002.). Nesse estudo, o entendimento da função da membrana celular é um elemento crucial, e há a prática de uma analogia entre ela e a pele. A visualização e o toque são especialmente estratégicos como escolhas didáticas.

Para fazer referência a vivências somáticas experienciadas via movimento, Cohen (2015COHEN, Bonnie Bainbridge. Sentir, perceber e agir: educação somática pelo método Body-Mind Centering. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2015.) passou a utilizar o termo somatização, dando a essa palavra um uso semântico diferente daquele que lhe fora dado na Medicina e na Psicologia:

Eu usei esse termo ‘somatização’ para engajar diretamente a experiência cinestésica, [...] Por meio da somatização as células do corpo estão informando o cérebro tanto quanto o cérebro está informando as células. Eu derivei essa palavra ‘somatização’ da palavra ‘soma’ conforme usada por Thomas Hanna (Cohen, 1993, p. 1, tradução nossa).

Apesar da delimitação conceitual que originalmente fora dada por Cohen ao termo somatização, nota-se hoje seu emprego praticamente irrestrito para fazer referência a qualquer vivência somática, e não apenas àquelas que ocorrem por meio de movimentação.

Em territórios cruzados da Dança...

Nos territórios da dança (e não apenas em territórios acadêmicos), o campo somático foi significativamente atuante na emersão de um novo paradigma estético-corporal: a subjetividade sensório-motora e seus dados perceptivos posturais e cinestésicos como elementos do trabalho pedagógico e motivação para criação. Domenicci (2010), ao abordar as transformações que a Educação Somática causou na dança, aponta para uma mudança paradigmática: do paradigma tecnicista da repetição mecânica, passamos ao paradigma sistêmico ou dinamicista, no qual a autopercepção é vivência fundamental. Como enfatizado por Márcia Strazzacappa Hernandez (2000HERNANDEZ, Márcia Strazzacappa. Fondements et enseignement des techniques corporelles des artistes de la scène dans l’état de São Paulo (Brèsil) au XXème siècle. 2000. Tese (Doctorat en Esthétique, Sciences et Technologie des Arts) - Université Paris 8, Vincennes, Saint Denis, 2000. ), a Educação Somática, quando entra nas salas de aula e nos ensaios de dança, é instrumento de mudança na qualidade do trabalho desenvolvido, sendo muito mais que procedimentos de autocuidado e prevenção de lesões. É nítido que, embora a somática, muitas vezes, tenha entrado nas salas de aula de dança pela porta do terapêutico, atualmente ela já se espalhou pelo chão de madeira e pelo ar; já se tornou um gene da dança.

Segundo Sylvie Fortin (2011FORTIN, Sylvie. Nem do lado direito, nem do lado avesso: o artista e suas modalidades de experiência de si e do mundo. In: WOSNIAK, Cristiane; MARINHO, Nirvana. O avesso do avesso do corpo: educação somática como práxis. Joinville: Nova Letra, 2011. P. 25-42.), foi a partir do início da década de 1970 que a Educação Somática começou a adentrar nos territórios da dança. A presença e importância do campo somático na dança tornou-se tão marcante que o termo Educação Somática foi inclusive listado no Dicionário de Dança Larousse, em sua segunda edição: “Campo disciplinar que emerge de um conjunto de métodos que têm por objetivo o aprendizado da consciência do corpo em movimento no espaço” (Larousse, 2007, p. 210 apud Fortin, 2011, p. 27). Diante disso, parece válido que nos perguntemos se não seria interessante usarmos um termo específico para nos referirmos à dança que está sendo explorada e performada dentro de paradigmas somáticos. Penso que a expressão dança somática seja uma boa possibilidade; um nome bem contextualizado para nos referirmos à ‘dança de exploração sensório-perceptiva que não segue nenhuma escola de codificação do movimento e da forma corporal, nem de estilização da expressão’. A emersão da dança somática nos territórios da dança trouxe uma nova paleta de cores para os estudos pedagógicos, assim como para a prática da criação em dança, afetando a maneira como professores trabalham, como artistas desenvolvem seus processos criativos e como estudiosos teorizam a respeito da dança.

Em parte, a entrada da Educação Somática na dança se deu devido ao fato de sua genealogia abrigar links diretos com práticas expressivas do movimento, o que significa que em algumas práticas somáticas já havia um pensamento de dança dinamizado. Isso foi uma das causas do entrosamento completo que veio a ocorrer. Como nos lembra Domenici (2010DOMENICI, Eloisa. O encontro entre dança e educação somática como uma interface de questionamento epistemológico sobre as teorias do corpo. Pro-Posições, Campinas, v. 21, n. 2 (62), p. 69-85, maio/ago. 2010.), Anna Halprin (1920-), a partir da década de 1950, em suas aulas e processos criativos, trabalhou atividades muito diferentes das que eram comumente praticadas em aulas de técnicas de dança. Desenvolveu um trabalho próximo de proposições somáticas. Um exemplo de proposta trabalhada por ela era a exploração dos movimentos de cada articulação do corpo. Experienciando essas proposições, uma importante geração de dançarinos foi marcada pelo trabalho de Halprin, sendo que alguns deles viriam a participar do Judson Church.

Steve Paxton (1939-) e muitos nomes importantes do Contato Improvisação acompanharam e instigaram o desenvolvimento do BMC. A abordagem pedagógica corporal posteriormente organizada por Paxton - Material for the Spine (Material para a coluna) - é baseada em fundamentos da Educação Somática. A consciência da coluna é tratada por Paxton como consciência dorsal intrinsecamente conectada com as periferias, o que é bastante poderoso no sentido de ajudar no desenvolvimento da tridimensionalidade da atenção, da intenção de movimento e de sua iniciação. Isso gera transformações nas organizações sensório-motoras, colaborando significativamente para a evolução da integração cinética corporal.

No Brasil, os trabalhos de Klauss Vianna (1928-1992) e de Angel Vianna (1928-), ao focar a potência expressiva do movimento consciente, enriqueceram os ambientes da dança e do teatro, assim como hibridismos entre essas duas artes. Esses trabalhos, que muitas vezes foram mencionados como expressão corporal, são discutidos por várias autoras brasileiras, como Letícia Teixeira, Jussara Miller, Neide Neves, Lela Queiroz e Enamar Ramos.

Nos territórios da dança, as ferramentas da exploração somática - movimento, toque, visualização e sonorização - são experimentadas em propostas naturalmente contaminadas pelo background da dança. Em minha atuação na docência em Dança, a enunciação que utilizo para sugerir usos das ferramentas somáticas aos alunos me interessa mais em seu caráter verbal do que no substantivado, pois penso que, quando concebidas como verbos, essas ferramentas nos ajudam ainda mais a praticar o entendimento de que percepção é ação. Creio que, quando ao invés de dizer ‘procure um movimento que investigue...’, digo ‘se mova investigando...’, ajudo a pessoa a praticar melhor o entendimento de que o movimento que ela realiza é ela, e não algo com o qual ela lida. Esse é um entendimento distinto de outras compreensões que já estão bem corporalizadas em nós, como os entendimentos de que o movimento é algo que acontece ao nosso redor, algo que analisamos racionalmente, algo que observamos etc.

Em explorações da dança somática, as ferramentas somáticas são empregadas de modos variados, sendo combinadas ou não (exemplos: se mover; se tocar e se mover ao mesmo tempo; visualizar e ser tocado ao mesmo tempo; se mover sendo tocado por alguém; sonorizar; sonorizar se tocando). São frequentes as explorações de anatomia experimental, tanto em estudos de toques, quanto em estudos dinâmicos dos formatos ósseos, volumes, pesos e suas conexões esqueléticas. A anatomia dos músculos também pode ser explorada, embora estudos de sensibilidade tônica muscular sejam mais comuns que estudos anatômicos musculares. O corpo-mente músculo-esquelético pode ser explorado em cadeias de movimento e em padrões ontogenéticos. Diferentes qualidades de toque podem ser usadas para estimular mudanças na escala de tensionabilidade da pele, dos músculos, das vísceras (embora seja menos comum a exploração tônica focada nos órgãos). A escala de tensionabilidade também é frequentemente explorada em estudos que focam relações entre atividade e passividade no movimento. Nesse contexto, estudos do relaxamento são muito importantes, já que são estratégicos para o alcance de níveis bem baixos de tônus, o que possibilita a identificação dos contrastes tônicos. São igualmente importantes os estudos exploratórios da manipulação, por meio de atividades em duplas ou grupos, nas quais uma pessoa, ao ser manipulada, pode vivenciar o movimento passivo em toda sua potência de sensibilidade. A respiração é também um território comumente explorado nas práticas somáticas do mundo da dança, principalmente no que tange à alternância entre movimento expansivo e movimento de recolhimento. Em simultaneidade com outras explorações somáticas, as explorações respiratórias podem envolver saltos, desmontes articulares, quedas etc. Os ligamentos podem ser estimulados por meio de manipulações que puxam partes corporais subsequentes em sentidos contrários, causando o surgimento ou o reconhecimento de espaços nas articulações, ou por meio de estudos de resposta gravitacional entre o ceder e o empurrar, e que também podem envolver o projetar e o alcançar. As explorações somáticas que nos lançam à procura da sintonia entre consciência atentiva e consciência celular (fisiologia experiencial) trazem para a dança somática algo bastante sutil, embora bem poderoso: a experienciação de singulares estados sensório-perceptivos e seu potencial poético.

As inúmeras somatizações em dança nos abrem portas para uma multiplicidade de possíveis outras somatizações. No trabalho criativo de adaptar exercícios já conhecidos, de renovar etapas, de mesclar objetivos, somos, por fim, guiados somaticamente em direção à experimentação de procedimentos. Para isso acontecer, é essencial que haja conhecimento a respeito do que sejam temas somáticos de estudo da expressividade do movimento, e de como estes podem se combinar. São exemplos de temas: passividade e atividade na tonicidade do movimento; relação entre eixo, ação antigravitacional e projeção vetorial óssea; contrastes e proximidades entre alinhamento, equilíbrio e desequilíbrio; respiração como irradiação de energia cinética; relações entre enraizamento e levitação.

Ao refletirmos a respeito do valor das somatizações na formação e criação em dança, vale a pena considerar a teoria do inconsciente cognitivo metafórico de Lakoff e Johnson, pois ela nos ajuda a compreender melhor que o conteúdo do aprendizado, nas explorações somáticas, é a própria percepção de movimento, e não um passo de dança que se pretende apreender; é a escuta perceptiva como ação, e não como passividade ou pura recepção; é novidade potente na corporalização. Nessa perspectiva, o movimento deixa de ser apenas resposta motora, para ser também estímulo. No paradigma computacional, que sucedeu o paradigma do corpo-máquina, os movimentos são meros acionamentos motores comandados pelo cérebro: a percepção é apenas recepção (input), e o movimento é apenas resposta (output). O cérebro recebe as informações ambientais pelos dados sensoriais (dados de entrada), trabalha esses dados no processamento perceptivo e depois decide o que fazer, enviando comandos de movimento ao corpo (dados de saída). Entretanto, no paradigma da corporalização, o movimento não é apenas output ou dado de saída, ele é input, ele é dado de entrada, ele possibilita a cognição, juntamente com o cérebro. Como sintetiza Queiroz (2006QUEIROZ, Clélia Ferraz de. Corpulações: informação, comunicação, movimento e contato. 2006. 206 f. Tese (Doutorado em Comunicação e Semiótica) - Programa em Comunicação e Semiótica, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2006. Disponível em: <Disponível em: https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/4867/1/Clelia%20Ferraz%20Pereira%20de%20Queiroz.pdf >. Acesso em: 20 abr. 2019.
https://sapientia.pucsp.br/bitstream/han...
, p. 14): “os movimentos que o corpo faz participam ativamente na construção da cognição”.

Desse modo, é importante mencionar que o gene somático atuando no organismo dançante não se limita a agir apenas em explorações desgarradas de forma, pois mesmo quando estamos em uma aula de dança moderna, por exemplo, o conhecimento corporalizado estará trabalhando em nós. Além disso, as aulas de técnicas codificadas podem ser, somaticamente, uma experiência de ressignificação. Isso irá acontecer à medida que os passos de dança sejam explorados como ambientes. Ao explorar-se somaticamente, o dançarino está vivendo o passo de dança como um meio, e não como um fim. A repetição de um movimento não precisa ser entendida como algo oposto à exploração, pois repetir também é explorar. Ou seja, se a qualidade exploratória estiver presente, a repetição não será algo mecânico, não será apenas uma cópia. Então, não há que se criar preconceitos com as técnicas codificadas, como se elas fossem acervos cristalizados. Os professores, ao desenvolverem abordagens somáticas em suas aulas de danças codificadas, contribuirão para isso.

E, finalizando, considero imprescindível enfatizar que, no jogo da exploração somática, a propriocepção não é a única modalidade de escuta perceptiva, pois também há o perceber-se cinestesicamente: perceber-se como ocupação dinâmica do espaço-tempo. Nesse caso, a ação continua sendo meio (e não finalidade), pois não é porque não há um monitoramento postural consciente em contínuo andamento, que não esteja acontecendo a escuta perceptiva. Quando nos viciamos em conceber escuta perceptiva do movimento como sinônimo de escuta da percepção postural, não conseguimos reconhecer que existe outra gama enorme de explorações possíveis - a gama cinestésica: sentir-se movendo-se no tempo, sentir-se em diálogo com o espaço circundante, sentir a gravidade no tempo pelo uso dinâmico de força, de tônus, de direção espacial. A dança somática é surfar no oceano do inconsciente cognitivo.

Considerações finais

Tanto a experiência de vivenciar-se como ser perceptivo mais do que como ser pensante, quanto o exercício de refletir acerca dessa condição, contaminam a noção que se tem de corpo, carregando-a em direção à perspectiva da integração corpo-mente, que considera que a mente é corporificada; que corpo é mente; que a percepção e a emoção geram significados imanentes que fundamentam o raciocínio. Essa perspectiva, preciosa para os saberes artísticos, exige de nós que comecemos a encontrar uma maneira apropriada de construir nossos discursos a seu respeito. O termo corpo-mente, por portar certa reminiscência dualística, começa vez ou outra a parecer insuficiente. Tentativas de mudanças no vocabulário dos nossos discursos são necessárias, e podem ajudar nossa consciência cognitiva a identificar-se mais com a corporalidade que é. Precisamos repadronizar o jeito como falamos, como escrevemos. Ao praticarmos isso, é provável que potencializemos mais o ser integrado que somos, assim como nossa integração com os outros e com a natureza, ou seja, nossa capacidade de transcendência horizontal - termo usado por Johnson (2007JOHNSON, Mark. The meaning of the body: aesthetics of human understanding. Chicago; London: The University of Chicago Press, 2007. ) para denominar a relação emocional de atravessamento não hierárquico vivenciada nos sentimentos de conexão com as existências que coabitam conosco a terra dentro do tempo.

A perspectiva da corporalização do entendimento ou significados está muito em sintonia com o modo como a Educação Somática e parte da Dança encaram a percepção, o agir, a sensibilidade, a inteligência, a criatividade, a interpessoalidade e a interação com o mundo. Mesmo sendo jovem, a Educação Somática já realizou significativas contribuições para diversas áreas. Certamente, a Educação Somática e as Artes constituem uma área-fonte nutritiva na qual as Ciências Cognitivas e a Filosofia podem encontrar novas composições. A dança e, em especial, a dança somática, pode oferecer inúmeras oportunidades de experiências úteis ao avanço do entendimento do que é o corpo-mente.

Em seu livro, The meaning of the body: aesthetics of human understanding (O significado do corpo: estética do entendimento humano) (2007), Johnson (2007JOHNSON, Mark. The meaning of the body: aesthetics of human understanding. Chicago; London: The University of Chicago Press, 2007. , p. 261) argumenta: “[...] observando como a arte nos afeta, nós ganhamos insights profundos no que diz respeito à base corporal do significado e do entendimento” (tradução nossa). Ele enfatiza a propriedade que a arte tem de consumar e transformar significados quando vivenciada para além do entretenimento: “[...] quando você investiga obras de várias artes, você está investigando o que é o significado, de onde ele vem e como pode se desenvolver” (Johnson, 2007, p. 261-262, tradução nossa).

O porquê de a arte possibilitar insights a respeito do que seja a geração imanente de significados está, certamente, relacionado com o fazer criativo, que é intrinsecamente perceptivo e emotivo. O papel da percepção e da emoção na arte é o que a coloca como potente objeto de estudo das Ciências Cognitivas. A criatividade, no entanto, na perspectiva da corporalização, não é vista como a capacidade totalmente livre de colorir uma página em branco, pois todos nós somos páginas que já estão grafadas com inconscientes esquemas metafóricos de geração de significados. No entanto, podemos exercer uma possibilidade interessante para o alcance de uma criatividade mais expandida: concebermos, cada vez mais, nossa potência criativa como dinamização de nossa corporalização, e explorar isso intencionalmente de diferentes maneiras. Nesse sentido, a somatização - seja em territórios da Educação Somática, seja em territórios da Dança - oferece muitas oportunidades.

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  • 1
    Neste artigo, apesar da propriocepção e da cinestesia serem processos muito relacionados entre si, considerou-se a seguinte distinção: que a propriocepção pode ser compreendida como percepção de localização de pontos ou zonas no espaço interno corporal, como também, das relações espaciais entre elas, dizendo respeito ao nosso sistema postural reflexo; e que a cinestesia corresponde a um perceber/sentir o movimento associado à percepção espaço-temporal/rítmica do movimento. O referencial para essa colocação encontra-se na Fisiologia, no fato de que há um tipo de receptor sensorial dominantemente proprioceptivo, e outro dominantemente cinestésico.
  • 2
    Será usada inicial em letra maiúscula para palavras que estejam sendo utilizadas como nome de áreas, subáreas ou campos do conhecimento acadêmico. Exemplos: Filosofia, Fisiologia, Dança, Educação Somática. Quando essas mesmas palavras não estiverem se referindo a áreas, subáreas ou campos do conhecimento formalizado, mas sim a práticas ou a fenômenos, suas iniciais virão em letra minúscula, como ocorre com qualquer palavra.
  • 3
    O termo inconsciente não é usado por Lakoff e Johnson no sentido freudiano, mas sim no sentido de ser aquilo que opera abaixo da cognição consciente.
  • 4
    O livro de Bonnie Bainbridge Cohen, originalmente publicado no ano de 1993, foi escrito em inglês (título Sensing, feeling and action) e consiste no agrupamento de artigos escritos para a revista Contact Quarterly (CQ) ao longo dos anos de 1970 a 1980 (Nelson apud Cohen, 2015).
  • 5
    Não é tarefa deste artigo detalhar o perfil epistemológico da Educação Somática e seu histórico. Para essas informações, podem ser facilmente consultados documentos disponíveis na Web por acesso livre. No que diz respeito aos artigos escritos em português, publicados no Brasil a partir do final da década de 1990, dentre os principais nomes de autoria estão: Márcia Strazzacappa; Sylvie Fortin; Débora Bolsanello; Eloísa Domenici; José Antônio de Oliveira Lima; Ciane Fernandes; Marcilio Souza Vieira; Margherita De Giorgi; Neila Cristina Baldi e Maíra Santos. Além dessas referências, vale mencionar o artigo A quem possa interessar: a Educação Somática nas pesquisas acadêmicas (publicado no ano de 2015, no periódico Revista Brasileira de Estudos da Presença), de autoria de Priscila Rosseto Costa e Márcia Strazzacappa, que apresenta um levantamento da produção de artigos, teses, dissertações e monografias brasileiras que tratam a Educação Somática como principal temática.
  • 6
    Em português, o nome do método de Emile Jaques-Dalcroze é escrito da mesma maneira: Eurritmia.
  • Este texto inédito também se encontra publicado em inglês neste número do periódico.
  • Editor-responsável: Marcelo de Andrade Pereira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    01 Maio 2019
  • Aceito
    12 Maio 2020
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