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Processos de Composição/Ensino/Aprendizagem em Dança

Composition/Enseignement/Apprentissage en Danse

Resumo:

Reflexão sobre o solo no contexto de produções contemporâneas nomeadas instalações coreográficas, baseada no estudo das relações entre humanos e não/humanos em cena, e, por meio dela, a apresentação de uma abordagem para o ensino/aprendizagem em dança. Parte-se da ideia de que tais criações respondem a uma necessidade que se configura como busca pela experiência, operada por meio das relações com não/humanos quando estes são levados em conta como coautores de corpos, danças e cenas. A noção de solo é problematizada, uma vez que, em solo, nunca estamos sós, mas estamos e somos com, o que nos conduz a enfatizar composição e aprendizagem em dança como experimentação coletiva.

Palavras-chave:
Solo em Dança; Instalação Coreográfica; Relações entre Humanos e Não/Humanos; Aprendizagem em Dança; Composição em Dança

Résumé:

Cet article est une réflexion au sujet du solo dans le cadre des productions contemporaines dites installations chorégraphiques. Cette réflexion est basée sur l'étude des rapports entre humains et non/humains sur scène et elle propose une approche pour l'enseignement/l'apprentissage de la danse. Nous partons de l'idée que de telles créations répondent à un besoin qui se configure comme la quête de l'expérience, à travers les relations avec les non/humains en tant que co-auteurs de corps, de danses et de scènes. Ainsi, la notion de solo est mise en question, puisqu'en solo on n'est jamais seul, mais on est toujours avec, ce qui nous permet de mettre en valeur la composition et l'apprentissage en danse en tant qu'expérimentation collective.

Mots-clés:
Danse en Solo; Installation Chorégraphique; Rapports entre Humains et Non/Humains; Apprentissage de la Danse; Composition en Danse

Abstract:

This article is about contemporary dance solo productions which have been called choreographic installations. It is focused on the relations between humans and non-humans in performance and presents an approach of teaching/learning in dance. It departs from the idea that the choreographic installation responds to a search for experience, which is operated by means of relations to non-humans when these become coauthors of bodies, dance and performance. The solo notion is thus called into question, as we are never alone in it, but rather with, which leads us to emphasize dance composition and learning as a collective experimentation.

Keywords:
Solo in Dance; Choreographic Installation; Humans and Non-Humans Relations; Learning in Dance; Dance Composition

Introdução

Neste trabalho1 1 Desenvolvido a partir do artigo Sentidos do corpo em cena, de Roberta K. Matsumoto, VIII Congresso da ABRACE (2014) e da tese Corporrelacionalidades e coletivo na composição e aprendizagem inventivas em dança, de Emyle Daltro, Programa de Pós-Graduação em Arte, Universidade de Brasília (2014). nos propomos a refletir sobre a questão do solo no contexto das produções contemporâneas em dança, nomeadas como instalações coreográficas2 2 Até onde temos notícia, foi Marta Soares quem iniciou a usar o termo instalação coreográfica para se referir a alguns de seus trabalhos como O Banho, que estreou em 2004, na cidade de São Paulo. Ela chamou igualmente Vestígios de instalação coreográfica para que a obra pudesse ser considerada um trabalho de pesquisa em dança (Informação fornecida por Marta Soares em entrevista concedida a Emyle Daltro em São Paulo, em 2012). , a partir das relacionalidades que se fazem entre humanos e não/humanos3 3 Adotamos tal expressão a partir dos estudos do Grupo de Pesquisa Tecnologias, Ciências e Criação (Lab. TeCC/UFMT) que usam a expressão não/humanos, ao invés de não-humanos ou ainda não humanos, para acionar um pensamento/prática que não estabelece fronteiras fixas entre humanos e não/humanos (Galindo; Milioli; Méllo, 2013). Nos chamam a atenção também para o fato de que "O prefixo 'não', ainda que possa remeter a antagonismos entre humanos e não/humanos, é mantido para sugerir resistência a tais concepções" (Giffney; Hird apud Milioli, 2012, p. 13). em cena. Daí decorrem as possibilidades que encontramos de, a partir da investigação de duas instalações coreográficas, Vestígios - proposta por Marta Soares - e Verdades Inventadas - por Thembi Rosa, abalar as fronteiras estabelecidas, principalmente por meio da visão, nos dualismos sujeito e objeto, natureza e cultura, corpo e mente, entre outros, e experimentar estudos de movimento e composição em dança que abranjam humanos e não/humanos em relações horizontais de mútua constituição. Propusemo-nos a pensar que danças - e danças de quem/o quê - são engendradas nas instalações coreográficas que acompanhamos, e articulamos a esses trabalhos a noção de intra-ação, proposta por Karen Barad e conectada por Donna Haraway aos processos de "tornar-se com" (Haraway, 2008HARAWAY, Donna. When Species Meet. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2008. (Posthumanities. Vol. 3).; #mkp_ref_0172009HARAWAY, Donna; GANE, Nicholas. Se nós Nunca fomos Humanos, o que fazer? Entrevista com Donna Haraway. Ponto Urbe, Revista do Núcleo de Antropologia Urbana da USP, São Paulo, v. 6, p. 1-5, 2009. ; Haraway; Azerêdo, 2011HARAWAY, Donna; AZERÊDO, Sandra. Companhias Multiespécies nas Naturezaculturas: uma conversa entre Donna Haraway e Sandra Azerêdo. In: MACIEL, Maria Esther (Org.). Pensar/Escrever o Animal ensaios de zoopoética e biopolítica. Florianópolis: Editora da UFSC, 2011. P. 389-417. ) que ela discute, por perceber que interação - termo um tanto já corriqueiro no âmbito das artes visuais - muitas vezes, deixa escapar a dimensão de mútua constituição (Galindo; Milioli; Méllo, 2013GALINDO, Dolores; MILIOLI, Danielle; MÉLLO, Ricardo. Dançando com Grãos de Soja, espécies companheiras na deriva pós-construcionista. Psicologia & Sociedade, Belo Horizonte, v. 25, n. 1, p. 48-57, 2013. Disponível em: <Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/psoc/v25n1/07.pdf >. Acesso em: 12 jun. 2013.
http://www.scielo.br/pdf/psoc/v25n1/07.p...
) que ocorre com as agências que constituem essas danças. A noção de instalação coreográfica nos possibilitou pensar instalação como dança e coreografia como composição, engendrada não mais somente por determinados sujeitos - humanos - desmembrados dos diversos não/humanos que os constituem na condição de sujeitos humanos moventes.

Partimos da ideia de que tais criações respondem a uma necessidade4 4 Para Deleuze todo ato de criação parte de uma necessidade. "Um criador não é um ser que trabalha pelo prazer. Um criador só faz aquilo de que tem absoluta necessidade" (1987, informação verbal). que se configura como a busca pela experiência, por parte do bailarino, ao se entregar à imprevisibilidade das relações com não/humanos, quando estes passam a ser levados em conta como coautores de corpos, danças e cenas.

Assim, nos lançamos primeiramente sobre algumas questões relativas ao solo para entendê-lo como multitude, a partir de reflexões sobre Vestígios e Verdades Inventadas. Em seguida, partindo do escopo teórico metodológico delineado, apresentamos algumas considerações sobre nossa proposição voltada ao ensino/aprendizagem5 5 Escrevemos ensino/aprendizagem para pensarmos o ensino e a aprendizagem sendo constituídos mutuamente na relação. em dança no âmbito do ensino superior.

Experiência, Coisas e Solos

Entendemos a experiência como um acontecimento que nos modifica, nos transforma, que se dá como instante, mas que precisa se distender no/com o tempo, durar para poder se tornar cognoscível.

Para que a experiência se dê, é necessário tanto um movimento de ir - que seria o abandono de si, ou seja, o despojamento necessário que coloca em suspense padrões e valores e permite ir em direção ao diferente - como o de volta - o da compreensão em que me faço outro e pelo qual sou outro (Larrosa, 2002LARROSA, Jorge. Notas sobre a Experiência e o Saber de Experiência. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 19, p. 20-28, 2002.; 2011LARROSA, Jorge. Experiência e Alteridade em Educação. Revista Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v. 19, n. 2, p. 04-27, jul./dez. 2011.).

Esse movimento de ir e vir apresenta-se como duração e intensidade. A experiência seria assim como a própria consciência do tempo, reconhecimento do instante em sua intensidade.

Mas, já nos perguntava Santo Agostinho (1980AGOSTINHO, Santo. Confissões. Tradução de J. Oliveira Santos, S. J., e A. Ambrosio de Pina, S. J. São Paulo: Abril Cultural, 1980. (Coleção Os Pensadores)., Livro XI, p. 14):

Que é, pois, o tempo? Quem poderá explicá-lo clara e brevemente? Quem o poderá apreender, mesmo só com o pensamento, para depois nos traduzir por palavras o seu conceito? E que assunto mais familiar e mais batido nas nossas conversas do que o tempo? Quando dele falamos, compreendemos o que dizemos. Compreendemos também o que nos dizem quando dele nos falam. O que é, por conseguinte, o tempo? Se ninguém mo perguntar, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei.

Nesse trecho, uma das citações mais conhecidas quando nos debruçamos sobre o conceito de tempo, o autor já nos assinala a complexidade da questão: se, por um lado, o tempo é algo banal e familiar, tendo em vista sua naturalização por meio de diferentes mecanismos, desde nossa mais tenra idade, por outro lado, sua explicação, sua apreensão conceitual é uma tarefa extremamente difícil.

O tempo nos persegue. Perseguimos o tempo. Compreendê-lo e explicá-lo seria como explicar a própria vida - o ser em movimento, transformação constante - e controlar de certa forma nossa finitude. Hartmut Rosa (2010ROSA, Hartmut. Accélération: une critique sociale du temps. Paris: La Découverte, 2010., p. 31 - tradução nossa) cita Robison e Godbey: "Estar com fome de tempo não provoca a morte mas, como haviam observado os filósofos antigos, impede de começar a viver".

As teorias sobre tempo, pelo menos desde a antiguidade clássica, passam pelo questionamento e apreensão do presente. A instabilidade do presente, a impossibilidade de fixá-lo, vai marcar de forma intensa as reflexões sobre a modernidade e a efemeridade que se estabelece pelo excesso de estímulos em grande parte gerados pelas inúmeras tecnologias de comunicação e de produção que começam a despontar.

Walter Benjamin e Martin Heidegger, entre outros, como nos lembra Charney (2001CHARNEY, Leo. Num instante: o cinema e a filosofia da modernidade. In: CHARNEY, Leo; SCHWARTTZ, Vanessa R. (Org.). O Cinema e a Invenção da Vida Moderna. Tradução de Regina Thompson. São Paulo: Cosac & Naify, 2001. P. 386-408., p. 387), "[...] vão procurar resgatar a possibilidade da experiência sensorial em face do caráter efêmero da modernidade" pelo conceito de instante. Desses pressupostos, dois pontos podem ser levantados: um, referente à presença que se faz quando o indivíduo então não só sente, mas experiencia uma sensação tangível e intensa. Como dizíamos mais acima, se a experiência é assim como a própria consciência do tempo, reconhecimento do instante em sua intensidade, ela se faz pela presença de algo que me atravessa, como diz Larrosa (2002LARROSA, Jorge. Notas sobre a Experiência e o Saber de Experiência. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 19, p. 20-28, 2002.; 2011LARROSA, Jorge. Experiência e Alteridade em Educação. Revista Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v. 19, n. 2, p. 04-27, jul./dez. 2011.), algo que me passa - sensível - e que me transforma - cognoscível. O outro ponto se refere à fugacidade da experiência.

Se o instante permite compreender o que seria a experiência, tal estudo também permite compreender que, na modernidade, a possibilidade de experiência se torna cada vez mais rara em virtude de seu excesso. Larrosa (2002LARROSA, Jorge. Notas sobre a Experiência e o Saber de Experiência. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 19, p. 20-28, 2002., p. 23) pontua alguns desses excessos - de informação, de opinião, de falta de tempo, de trabalho e nos lembra que "[...] ao sujeito do estímulo, da vivência pontual, tudo o atravessa, tudo o excita, tudo o agita, tudo o choca, mas nada lhe acontece". Por excesso, embotamos os nossos sentidos, passamos a sofrer de uma anestesia ou, como diz João-Francisco Duarte Jr. (2001DUARTE Jr., João-Francisco. O Sentido dos Sentidos: a educação (do) sensível. Curitiba: Criar Edições, 2001.), de uma crise de nossos sentidos.

A partir daí, podemos nos perguntar se a instalação coreográfica, sobretudo quando ela é identificada como solo - aqui entendido como sendo constituído quando apenas um humano encontra-se em cena - não seria uma busca pela experiência ou um dos lugares de resistência à perda da faculdade de narrar, à pobreza de experiências comunicáveis (Benjamin, 1985BENJAMIN, Walter. Obras Escolhidas. Magia e técnica, arte e política. Ensaios sobre literatura e história da cultura. V. 1. Tradução de Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1985., p. 197-198), uma vez que evidencia cenicamente uma multiplicidade de vozes e movimentos de dançarinos/criadores não/humanos?

Num contexto de "aceleração do tempo" e de impossibilidade de "[...] convergência das percepções do tempo da vida cotidiana, do tempo biográfico e do tempo histórico" (Rosa, 2010ROSA, Hartmut. Accélération: une critique sociale du temps. Paris: La Découverte, 2010., p. 32 - tradução nossa), as duas obras cênicas, estudadas e nomeadas como instalação coreográfica, procuram fomentar um espaço simbólico que possibilite justamente a constituição de um feixe condensado de temporalidades. Busca-se instaurar um momento no qual a experiência possa se dar por meio, dentre outras formas, da modificação da qualidade e do tipo de relação entre humanos, deixando de subjugar os objetos, assim como objetos deixando de subjugar os humanos (Lepecki, 2012LEPECKI, André. 9 variações sobre coisas e performance. Urdimento, Florianópolis, n. 19, p. 95-101, nov. 2012.). Tudo se tornaria coisa, objetos livres do utilitarismo e subjetividade não mais "[...] definida pela posse que o sujeito tem de si mesmo e dos seus objetos" (Moten apud Lepecki, 2012, p. 96). Podemos expandir essa colocação de André Lepecki nos apoiando nos estudos de Donna Haraway e Bruno Latour.

Haraway (2011HARAWAY, Donna; AZERÊDO, Sandra. Companhias Multiespécies nas Naturezaculturas: uma conversa entre Donna Haraway e Sandra Azerêdo. In: MACIEL, Maria Esther (Org.). Pensar/Escrever o Animal ensaios de zoopoética e biopolítica. Florianópolis: Editora da UFSC, 2011. P. 389-417. ) nos propõe pensar a noção de intra-ação, cunhada por Karen Barad, física feminista estadunidense. Intra-ação refere-se à mutua definição dos constituintes de uma relação, os quais emergem juntos, e passam a existir com essa relação. Nos termos de Barad, diz Haraway, a noção de interação passa a ser insuficiente para explicar as relações entre diferentes agentes, pois, usualmente, quando se fala em interação, assume-se que há entidades ou agentes individuais, com características inerentes, existindo independentemente e que preexistem à sua atuação um sobre o outro. Com a noção de intra-ação, Barad (2003BARAD, Karen. Posthumanist performativity: toward an understanding of how matter comes to matter. Signs - Journal of Women in Culture and Society, Chicago, University of Chicago Press, v. 28, n. 3, p. 801-831, 2003.) trabalha em outra perspectiva, pois pensa a realidade sem a existência prévia de elementos separados, com propriedades inerentes ou próprias. Indivíduos não preexistem como tais, mas, sim, materializam-se em intra-ação.

A partir da intra-ação, Donna Haraway (2011HARAWAY, Donna. A Partilha do Sofrimento: relações instrumentais entre animais de laboratório e sua gente. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, v. 17, p. 27-64, 2011.) propõe a expressão tornar-se com, a qual nunca se refere a uma coisa em si mesma, mas a processos de co-constituição que mantém - entre os que os constituem e são constituídos com esses processos - a consideração, o respeito e a responsabilidade compartilhados. Nesse movimento, a autora pensa a palavra humano por:

[...] suas ligações latinas com a terra, com o solo, com o húmus - com a matéria quente em que muitas coisas são gestadas e convivem, o monte de adubo que se torna húmus para fazer florescer outras plantas, animais, micróbios e pessoas (Haraway; Azerêdo, 2011HARAWAY, Donna; AZERÊDO, Sandra. Companhias Multiespécies nas Naturezaculturas: uma conversa entre Donna Haraway e Sandra Azerêdo. In: MACIEL, Maria Esther (Org.). Pensar/Escrever o Animal ensaios de zoopoética e biopolítica. Florianópolis: Editora da UFSC, 2011. P. 389-417. , p. 10).

Com as noções de intra-ação e de tornar-se com como guias, torna-se improvável a oposição binária sujeito-objeto. Como a expressão humanos e não-humanos vem sendo usada por Bruno Latour (2004LATOUR, Bruno. Políticas da Natureza: como fazer ciência na democracia. Tradução Carlos Aurélio Mota de Souza. Bauru, São Paulo: Edusc, 2004.; 2012LATOUR, Bruno. Reagregando o Social: uma introdução à teoria do Ator-Rede. Salvador: Edufba; Bauru: São Paulo: Edusc, 2012. ) como sinônima de proposições ou de associações, tendo uma significação negativa, ou seja, negando a dicotomia entre sujeito e objeto, optamos pelo uso dessa expressão, adensando a ideia de coisa de Lepecki, mas escrevendo-a da seguinte forma: humano e não/humano. Quando falamos em não/humanos, podemos estar nos referindo a partículas, grãos de areia, projeções videográficas, equipamentos de iluminação, vestimenta, árvores, animais não humanos, grades, paredes..., ou seja, materialidades relacionais que costumeiramente não são levadas em conta como sujeitos, agentes de ações.

Danielle Milioli (2012MILIOLI, Danielle. Dançando com não/humanos: processos sociotécnicos em dança contemporânea como experimentos em pesquisa. 2012. 89 f. Dissertação (Mestrado em Cultura Contemporânea) - Instituto de Linguagens, Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2012.) lembra-nos que não/humanos sempre estiveram na dança, objetos cênicos constantemente integram processos composicionais de dança e nos recorda dos questionamentos feitos sobre seu uso por artistas e pesquisadores como António Pinto Ribeiro e Helena Katz (Milioli, 2012MILIOLI, Danielle. Dançando com não/humanos: processos sociotécnicos em dança contemporânea como experimentos em pesquisa. 2012. 89 f. Dissertação (Mestrado em Cultura Contemporânea) - Instituto de Linguagens, Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2012.).

Havemos de nos recordar também das diversas experimentações com objetos realizadas por artistas do Judson Dance6 6 O Judson Dance era um grupo de dançarinos que performavam na Judson Memorial Church, em Greenwich Village, cidade de Nova Iorque, entre os anos de 1962 e 1964. De acordo com Jorge Glusberg (2008, p. 37), "[...] a Judson Dance Company vai desenvolver uma atividade efervescente, através dos trabalhos inovadores de Steve Paxton, Simone Forti, Yvonne Rainer, Trisha Brown, Deborah Hay, Lucinda Childs, Philip Corner, entre outros, atraindo a atenção de inúmeros artistas, cuja colaboração com os bailarinos e coreógrafos suscita criações que rompem a fronteira da dança - mesmo da dança moderna -, injetando novos e ricos elementos ao happening e delineando os contornos que caracterizarão a bodyart nos anos setenta". , na década de 1960, num movimento de afastamento da subjetividade, do erotismo e da teatralidade, onde o interesse no que se refere ao objeto era:

[...] sua especificidade material, seu peso-forma-volume com os quais os bailarinos deveriam interagir. O uso dos objetos (arrastar móveis pesados no palco, por exemplo), alterava o tipo de movimento a ser utilizado em cena, removendo o drama da performance (Fernandes, 2010FERNANDES, Mariana Patrício. Por que calafrios?: interações entre imagem, corpo e desejo em Yvonne Rainer. Revista Alea, Rio de Janeiro, v. 12, n. 1, p. 150-163, jun. 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1517-106X2010000100011&script=sci_arttext >. Acesso em: 13 jan. 2011.
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S151...
, s/p).

Pensava-se o corpo humano como objeto "[...] que deveria então ser examinado friamente sem motivações psicológicas sociais ou mesmo formais" (Banes apud Fernandes, 2010FERNANDES, Mariana Patrício. Por que calafrios?: interações entre imagem, corpo e desejo em Yvonne Rainer. Revista Alea, Rio de Janeiro, v. 12, n. 1, p. 150-163, jun. 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1517-106X2010000100011&script=sci_arttext >. Acesso em: 13 jan. 2011.
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S151...
, s/p).

Lepecki (2012LEPECKI, André. 9 variações sobre coisas e performance. Urdimento, Florianópolis, n. 19, p. 95-101, nov. 2012., p. 98) nos permite avançar na questão quando propõe que é preciso:

Investir em coisas, não como substitutos do corpo, nem como elementos significantes ou representativos de uma narrativa, mas como parceiros, como entidades co-extensivas no campo da matéria, é ativar uma mudança fundamental na relação entre objetos e seus efeitos estéticos (na dança, no teatro, nas artes visuais, na performance e na instalação).

Apesar do teórico chamar a atenção para o fato de essa atitude ontológica ainda não ser dominante, entendemos, como ele, que seja atualmente uma linha-de-fuga que encontramos nos trabalhos cênicos contemporâneos aqui tratados. Conjugada a esta ideia de estar com e se fazer com, ser coisa (humano e não/humano), a busca pela experiência se coloca de forma mais intensa e explícita em solo.

Podemos exemplificar por meio das instalações coreográficas compostas pelos encontros de Thembi Rosa ou de Marta Soares com não/humanos que compuseram os trabalhos cênicos, respectivamente, Verdades Inventadas e Vestígios.

No primeiro, vemos Thembi Rosa subir na tábua da ponta de uma espécie de palco, afundando-a um pouco com um leve pisar. Ela caminha por toda a extensão desse tablado, percebendo os sons que surgem a cada passo, ao pisar de diversos modos nas tábuas. Acompanhamos danças em/de um chão movente e emissor de sonoridades que é um alarm floor, mecanismo de segurança, mas que se torna instalação, parceiro de improvisações de dança e música, coautor de partituras de movimentos, torna-se também imagens em vídeo e, na itinerância do trabalho artístico, já se tornou até prateleiras...

Figura 1
Thembi Rosa, Verdades Inventadas, 2011.

Figura 2
Mecanismo sonoro microfonado (com foco em um bastão e peça de ferro), compondo o chão de Verdades Inventadas.

No segundo, Vestígios, acompanhamos também danças de/em chãos-sambaquis, que se tornam fotografias, projeções em telões, chão-mesa de pedras e areia esvoaçante embalada pelo vento de um ventilador, que se tornam exumação poética. Assistimos, durante 55 minutos, um ventilador ligado em alta potência produzir o vento que sopra a areia, que vaza pelas frestas das pedras de arenito rachadas que, se encaixando umas nas outras, formam o tampão de uma mesa de ferro e mdf.

Um monte de areia - pouco mais que 100 quilos - dança em cima dessa mesa, ao som de ruídos ora mais, ora menos estridentes, de modo que vestígios de um corpo humano, aos poucos, anunciam sua presença7 7 Vestígios, de Marta Soares e Verdades Inventadas, de Thembi Rosa, são amplamente analisados na Tese Corporrelacionalidades e coletivo na composição e aprendizagem inventivas em dança de Emyle Daltro (2014). .

Figura 3
Marta Soares. Vestígios, 2012.

Figura 4
Marta Soares. Vestígios, 2012.

Ambos os trabalhos são o que usualmente é chamado de solo. Entretanto, Thembi Rosa nos chama a atenção quando diz que é necessário evidenciar o trabalho solo como algo não só dela e mostrar como se move todo o mecanismo constituído, ou seja, a pesquisa de movimento em Verdades Inventadas só é possível considerando todas as agências que constituem esse trabalho, e a instalação nos provoca no sentido de pensarmos o espaço físico como parceiro de dança8 8 Informação fornecida por Thembi Rosa em entrevista concedida a Emyle Daltro, em Belo Horizonte/MG, em 2013. .

Partindo do ponto de que nunca estamos sós, mas estamos e somos com, o conceito de solo, como um espaço onde um humano se coloca sozinho, deve ser problematizado. Faz-se necessário repensá-lo como multitude inventora de mundos.

Essa situação levaria a uma tensão entre o estar só e o estar com, um jogo de alteridade. Quando pensamos ainda no solo, podemos entender que não estou só, estou com, mas devo estar com, para estar só. É um jogo entre a solitude (escolha de estar sem outros seres humanos em cena) e a solidão (estado). Essas camadas são assim trabalhadas por contraste. Elas compõem poeticamente uma contradição não antagônica subvertendo o que em si seria uma contradição antagônica. Podemos estar sós, desconectados, desarticulados de nós e dos outros (solidão) mesmo em meio a uma multidão de pessoas e podemos estar com uma multidão de humanos e não/humanos, com suas ações, espacialidades e temporalidades corporificadas em/com a nossa experiência que se individua (solitude) na/com a cena. Nesse sentido, vale atrelarmos nosso pensamento aos estudos de Gilbert Simondon sobre processos de individuação.

Virgínia Kastrup (2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007., p. 83) escreve que Simondon indica que tratemos a cognição como um sistema metaestável, "[...] isto é, um sistema portador de uma diferença de potencial. Usando uma linguagem energética, ele descreve o funcionamento de um sistema complexo e heterogêneo, portador de uma diferença interna". Kastrup (2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007., p. 83) registra que:

[...] o ser individuado tem condições problemáticas. Em tais condições, a individuação surge como solução de um problema. Mas Simondon adverte que se trata aí de uma 'resolução parcial e relativa', o que significa que a individuação não abole a metaestabilidade [...] Há sempre um resto. O sistema continua guardando uma certa incompatibilidade em relação a si mesmo.

Nos passos de Simondon, Kastrup (2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007., p. 83) diz que a individuação é tanto gênese das formas individualizadas, como de um devir do indivíduo.

As formas emergem de um fundo de processualidade e restam nele imersas. As condições da forma não são formais, mas metaestáveis ou complexas. Se o indivíduo não é dado, mas resultado da individuação, há que se conceber um regime anterior ao das formas individuadas. Simondon denomina-o regime pré-individual. Ele remete a um nível de realidade onde não existem unidades definidas, mas singularidades, partículas descontínuas, semelhantes às concebidas pela física quântica (Kastrup, 2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007., p. 83, grifos nossos).

Nesse fundo de processualidade, dançam as singularidades com suas memórias - que articulamos a húmus -, ativadas no presente, que se voltam para o devir das materialidades/socialidades, nutrindo processos de mudança co-constituídos na relação. Segundo Kastrup (2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007., p. 84 - grifos nossos), a física quântica evidenciou que:

[...] o real se desdobra em dois planos ou regimes distintos e coexistentes, o macroscópico e o microscópico. Para Simondon, o nível pré-individual [que também é pré-representacional] é semelhante ao nível quântico, correspondendo a um plano de forças ou partículas invisíveis, que condicionam as formas individuadas visíveis e respondem pelo seu devir. O importante é que, mesmo após a operação de individuação, o regime pré-individual persiste num nível próprio, distinto do das formas individuadas. A diferença interna aparece na forma de duas ordens de grandeza, ou dois regimes coexistentes: o pré-individual e o do sistema individuado.

Associamos a noção de memória a esse regime pré-individual que persiste mesmo nos resultados da individuação, com isso queremos habitar, mesmo que temporariamente, esse lugar da diferença de nós mesmos na qualidade de seres individuados. É com os processos de individuação, entendidos nos termos de Simondon, que o solo como multitude encontra possibilidades de ser constituído e pensado.

É interessante lembrar a argumentação de Josette Féral quando defende que seria mais apropriada a denominação de teatro performativo ao invés de teatro pós-dramático, baseada no aspecto central desse teatro, a performatividade. Entre outras coisas, a autora chama a atenção para os apontamentos de Derrida:

A reflexão de Derrida marca um redirecionamento na evolução do conceito de performatividade na medida em que ele afirma que a ação contida no enunciado performativo pode ou não ser efetiva. Portanto, na medida em que essa observação se torna um real princípio inerente à própria natureza dessa categoria de locução, o 'valor do risco', 'o malogro' tornam-se constitutivos da performatividade e devem ser considerados como lei (Féral, 2008FÉRAL, Josette. Por uma Poética da Performatividade: o teatro performativo. Sala Preta, São Paulo, v. 8, p. 97-210, nov. 2008., p. 203 - aspas do autor).

Se consideramos que, assim como o teatro performativo, a instalação coreográfica tem como aspecto essencial a performatividade, entendemos que eles trazem em si o princípio do risco.

A escrita cênica não é aí mais hierárquica e ordenada; ela é desconstruída e caótica, ela introduz o evento [événement], reconhece o risco. Mais que o teatro dramático, e como a arte da performance, é o processo, ainda mais que produto, que o teatro performativo coloca em cena (Féral, 2008FÉRAL, Josette. Por uma Poética da Performatividade: o teatro performativo. Sala Preta, São Paulo, v. 8, p. 97-210, nov. 2008., p. 04 - grifos da autora).

Esse valor de risco, próprio à performatividade, apresenta-se no solo como uma necessidade de se lançar no abismo, uma necessidade de que algo aconteça, de se confrontar com um outro, num movimento de exposição e deslocamento impulsionado pela alteridade. Se colocar em solo é suscitar um espaço para que a experiência possa se dar para humanos e para não/humanos, tornando-se todos coisa.

Dessa forma, a busca pela experiência seria pela própria captura do instante por meio do "reconhecimento recíproco de existências" (Hope, 2006HOPE, Jonathan. Considérations sur la Présence (Relatório de pesquisa - 2006). Disponível em: <Disponível em: http://effetsdepresence.uqam.ca/publications/articles/188-considerations-sur-la-presence.html >. Acesso em: 20 nov. 2014.
http://effetsdepresence.uqam.ca/publicat...
) e também, sobretudo, pelo acompanhamento e mediação dos processos de problematização desses modos de vida, ou seja, de sua invenção9 9 Com Virgínia Kastrup (2007) entendemos invenção como colocação de problemas. continuada. Quando isso ocorre, percebemos de maneira sensível o instante e nele, por ele e com ele, há presença potencializada.

Explicitamos a seguir como essas reflexões puderam reverberar em uma proposição de ensino/aprendizagem no âmbito de um curso de graduação em dança.

Corpos/Espaços: constituindo aprendizagem e experimentações coletivas e inventivas em dança

Apresentamos algumas considerações sobre nossa proposição voltada ao ensino/aprendizagem em dança, no âmbito do ensino superior, que constituímos com estudantes10 10 Agradecemos aos alunos e alunas Ana Carla de Souza Campos, Ana Carolina Moreira de Oliveira, Ariel Ferreira do Nascimento, Bruno Rodrigues Mendonça, Danilo Batista de Sousa, Edcleyton (Ed) Rodrigues da Silva, Franciely Ketelyn Lima de Sousa, Gustavo de Paula Mineiro, Inélia Cardoso Brito, Isabella Moreira de Oliveira, Jéssica Maria Fernandes Noronha, Leonice Pereira de Oliveira, Luisa Viana Elizeu da Silva, Vanessa Santos Viana, Vitória Avelina Barboza Almeida e William Deimyson Pereira da Silva, que cursaram a disciplina Corpo e Espaço, no segundo semestre de 2013, e com os quais pudemos compartilhar as experimentações que compõem o estudo mencionado neste texto. matriculados/as na disciplina Corpo e Espaço, ofertada por nós, no segundo semestre do ano de 2013, nos cursos de Bacharelado e Licenciatura em Dança da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Conduzimos a disciplina pensando objetos como não/humanos, de modo a criar tensão na separação hierarquizante entre sujeito e objeto. Os objetos, que sempre permearam as danças, foram considerados, em nossa proposta com os/as estudantes da disciplina Corpo e Espaço, não/humanos co-coreógrafos de corpos e danças. Em nossas aulas, discutimos não/humanos não como elementos apartados de nós sujeitos que, costumeiramente, os reduzimos a meros recursos, mas os abordamos como parceiros de dança, como actantes11 11 Danielle Milioli (2012, p. 13) nos lembra que nos estudos sociotécnicos "[...] o termo actante é empregado para aludir a não diferenciação entre humanos e não humanos em contraposição ao emprego da noção de atores vinculada aos primeiros". , como agências que atuam, que agem ativamente em pesquisas de movimento e composições em dança e como aqueles que "[...] já se encontrando no processo quando este começa, constituem a criação. São, portanto, criadores; estão na origem da criação" (Latour apud Milioli, 2012MILIOLI, Danielle. Dançando com não/humanos: processos sociotécnicos em dança contemporânea como experimentos em pesquisa. 2012. 89 f. Dissertação (Mestrado em Cultura Contemporânea) - Instituto de Linguagens, Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2012., p. 12). Daí que, com Danielle Milioli (2012MILIOLI, Danielle. Dançando com não/humanos: processos sociotécnicos em dança contemporânea como experimentos em pesquisa. 2012. 89 f. Dissertação (Mestrado em Cultura Contemporânea) - Instituto de Linguagens, Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2012.), falamos em um dançar com, para pensarmos dança menos como movimento de um/uma dançarino/a - que passa a não ser contado/a como apenas um/uma, mas entendido/a como multiplicidade - porém, surgindo também de outras associações. Esse pensamento tende a favorecer a diversidade, a alteridade na/da dança, considerando diferentes modos de conexão entre diferentes atores, como meios potentes de se fazer/compor danças capazes de desvencilhar os corpos - que se tornam dançantes nessas relações - de padronizações, classificações e normatizações hegemônicas.

Nesse sentido é que propusemos modos de fazer que pudessem ser atrelados à noção de dança experimental, numa abordagem cuja ênfase incide em articulações definidas e redefinidas em rede, compondo coletivos governados por estabilizações provisórias. Aproximamo-nos da noção de coletivo de Bruno Latour para pensarmos uma experimentação que não é autônoma, mas coletiva, na qual se experimenta com, sendo afetado e modificado pelo mundo e afetando-o, modificando-o. Foi assim que passamos a pensar/fazer danças experimentais coletivas.

Com Bruno Latour (2012LATOUR, Bruno. Reagregando o Social: uma introdução à teoria do Ator-Rede. Salvador: Edufba; Bauru: São Paulo: Edusc, 2012. ), aprendemos que é preciso agregar uma quantidade cada vez maior de participantes ativos socialmente - e, em nosso caso, artisticamente - que serão estabilizados e desestabilizados em danças. Assim, nossas aulas foram constituídas levando-se em conta humanos e não/humanos como dançarinos coreograficamente ativos, entendimento articulado aos estudos sociotécnicos.

Os Estudos Sociotécnicos enfatizam descrições de arranjos sociomateriais constituídos por humanos e não/humanos, considerando:

[...] a importância do homem do mesmo modo que de suas produções, criações, em outros termos, dos seus objetos, de suas técnicas, de suas práticas, de suas máquinas, de suas ambientações; porém, sem a pretensão de igualá-los, bastando-nos apenas os inserir em uma mesma trama sociotécnica. Os estudos sociotécnicos, portanto, propõem uma valorização de simetria de atuação (Leite, 2012LEITE, Vanessa Ferraz. Tecnologias do Cuidado no Cotidiano: descrições sociotécnicas de computadores que habitam uma pediatria. 2012. 300 f. Dissertação (Mestrado em Estudos de Cultura Contemporânea) - Instituto de Linguagens, Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2012., p. 24).

Passaremos a usar, a partir deste ponto do texto, as expressões humanos/não/humanos, corpo/espaço, materialidades/socialidades, em que as barras entre os termos foram colocadas para nos provocar a vê-los em processos de constituição mútua, sempre na relação.

Por meio da produção tanto de questionamentos como de respostas em processos coletivos de experimentar e de conhecer, nossa investigação com a disciplina Corpo/Espaço alinhou-se ao viés epistemológico da objetividade feminista de Donna Haraway, a qual pode ser traduzida como Conhecimento Situado (Haraway, 1995HARAWAY, Donna. Saberes Localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, Campinas, v. 5, p. 07-41, 1995.). A autora nos lembra que:

Todas as narrativas culturais ocidentais a respeito da objetividade são alegorias das ideologias das relações sobre o que chamamos de corpo e mente, sobre distância e responsabilidade, embutidas na questão da ciência para o feminismo. A objetividade feminista trata da localização limitada e do conhecimento localizado, não da transcendência e da divisão entre sujeito e objeto. Desse modo podemos nos tornar responsáveis pelo que aprendemos a ver (Haraway, 1995HARAWAY, Donna. Saberes Localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, Campinas, v. 5, p. 07-41, 1995., p. 21).

Quando um coletivo é constituído em composições artísticas que (re)fazem modos de ver/modos de vida, atuam aí, ao nosso entender, visões parciais, que se situam e se especificam, visões encarnadas que provocam a atuação de outras visões desse mesmo tipo. Práticas habilidosas de visualização (Haraway, 1995HARAWAY, Donna. Saberes Localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, Campinas, v. 5, p. 07-41, 1995.) que, ao serem compartilhadas, instigam questionamentos.

Interessamo-nos pela possibilidade de compor um coletivo com alunos de graduação em dança e seus estudos de movimento primeiramente com uma sala de aula do Instituto de Cultura e Arte (ICA), da Universidade Federal do Ceará e depois com o bosque da Reitoria dessa mesma instituição.

Salientamos que, em consonância com o que escrevem André Lepecki e Ric Allsopp, entendemos que nossas proposições com os/as educandos/as trabalharam com enfoques coreográficos que abalam relações normativas entre movimento, composição e a produção de dança e expandem "[...] a noção de coreografia para uma arte que inclui uma gama abrangente de ferramentas conceituais, de materiais e de estratégias" (Allsopp; Lepecki, 2008ALLSOPP, Ric; LEPECKI, André. On Choreography. Performance Research Journal, v. 13, n. 1, 2008. Disponível em: <Disponível em: http://on-the-move.org/news/article/12494/call-for-papers-performance-research-on/ >. Acesso em: 04 Abr. 2011.
http://on-the-move.org/news/article/1249...
, s/p).

Com os/as estudantes de Corpo/Espaço, realizamos experimentações que abrangeram cada um dos/as estudantes com uma coisa, ou coisas; vários/as alunos/as com uma coisa; além também de realizar experimentações envolvendo os/as discentes com a sala de aula e posteriormente com o bosque da Reitoria da UFC.

No que tange às coisas com as quais dançamos, há que se destacar a discussão que Latour propõe, relativa à separação operada por todas as disciplinas científicas entre as "coisas mudas" e os "homens falantes", informando-nos que "[...] as coisas se tornam, no laboratório, por meio indireto dos instrumentos, pertinentes àquilo que dizemos delas" (Latour, 2004LATOUR, Bruno. Políticas da Natureza: como fazer ciência na democracia. Tradução Carlos Aurélio Mota de Souza. Bauru, São Paulo: Edusc, 2004., p. 129 - grifos do autor). Tal situação colocou e ainda coloca a palavra do cientista como indiscutível, mas quando tais entidades - as "coisas mudas" - ficam livres da obrigação, tradicionalmente delegadas a elas pelas disciplinas científicas, de "fecharem a boca dos humanos" (Latour, 2004LATOUR, Bruno. Políticas da Natureza: como fazer ciência na democracia. Tradução Carlos Aurélio Mota de Souza. Bauru, São Paulo: Edusc, 2004., p. 128), temos aí um modo outro de reconhecermos a realidade exterior.

Sabemos que a separação de que fala Latour também está encarnada no âmbito das danças cênicas ocidentais, no qual as coisas mudas - lembrando que, durante muito tempo e ainda hoje, bailarinos se comportam como coisas mudas - se tornam, na sala de aula, de ensaio (laboratórios), por meio indireto dos instrumentos (técnicas de dança codificadas, hierarquização de funções, tipo de chão e músicas adequados para essas danças, barras, sapatilhas, entre outros), pertinentes àquilo que dizemos delas, o que colocou e, em muitos casos, ainda coloca a palavra do coreógrafo e a do professor como indiscutível. Atentos a essa situação e apostando que, com o foco no movimento, ou seja, em quem/o que move; quem/o que faz mover; quem/o que compõe dança, podemos fazer diferença nessas relações, propusemos desestabilizar a divisão entre humanos dançantes e coisas paradas, percebendo de que modo as relações que os constituem se estendem para além dessas categorizações, fazendo com que as danças compostas em conjunto possam figurar de modos diversos.

Entendemos uma sala de aula de dança, por exemplo, como um híbrido, um mediador - na acepção de Latour (2012LATOUR, Bruno. Reagregando o Social: uma introdução à teoria do Ator-Rede. Salvador: Edufba; Bauru: São Paulo: Edusc, 2012. ) - cuja rede que o constitui, e da qual ele é nó, extrapola e muito suas paredes. Para percebermos a mediação da/na sala de aula, nossa proposta foi evidenciar as coisas mudas e paradas que a constituem como entidades que fazem dançar. Esse mesmo procedimento foi realizado com o bosque da Reitoria da UFC.

A sala de aula número 18, do Instituto de Cultura e Arte e o bosque da Reitoria, ambos da Universidade Federal do Ceará (UFC) - locais com os quais nossa proposição ganhou corpos/espaços - contaram e contam com uma gama de humanos/não/humanos trabalhando em associações em sua construção e manutenção, cujas ações agiram e agem compondo esses espaços, além de fazerem agir quem/o que venha a compor com os mesmos. Sendo assim, nossa proposta foi realizar pesquisas de movimento com a sala 18 e, posteriormente, com o bosque da Reitoria, como experimentações coletivas que favorecessem composições de humanos/não/humanos em dança.

Figura 5
Improvisação de dança da aluna Luisa com duas pilastras da frente do prédio da Reitoria da UFC, 2013.

A metodologia foi pensada com a realização de aulas práticas que se abriram a improvisações em dança; às diversas interferências promovidas por leituras e discussões de textos; à exibição de vídeos; a relatos de experiências, entre outros. Importante destacar que, desde o primeiro dia de aula dessa disciplina, solicitamos que os/as discentes mantivessem consigo, em nossas aulas, um caderno para registro de processo.

Em Corpo/Espaço, propusemo-nos a trabalhar com um dançar que não ocorre com um adequar-se a padrões dados de movimento corporal e a determinados espaços e figuras já estabilizados, mas provocamos situações em que fôssemos impelidos a encontrarmo-nos com os resíduos, com o que ainda permanece instável nas coisas, em nós, com o que pode abrir possibilidades de invenção com corpos e com espaços - onde haja a invenção de ambos - e que pode se constituir como solução parcial e relativa - como um produto de dança e também como aprendizagem em dança.

Nessa trilha, entendemos que inventar, na esteira de Virgínia Kastrup (2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.), não é des-cobrir soluções já previstas, mas estarmos atentos à criação de problemas diferentes dos que já estão dados, sendo que nem sempre são os humanos que colocam esses problemas. Seguindo esse caminho, durante o desdobrar da disciplina Corpo/Espaço, sentimos que precisávamos sair de nós mesmos como centros geradores de ações controladas por nós e eficazmente consumadas; sair da apreensão do já representado; ativar as memórias da/na sala 18, para que dançássemos com elas, conscientizando-nos delas; sair da sala de aula para dançar com outros corpos/espaços; sair da compreensão de relações do tipo já experimentadas, para buscar condições de coreografar com as coisas, com espaços/corpos.

Figura 6
Discentes improvisando com o banco de cimento do bosque da Reitoria da UFC, 2013.

Importante situarmos a noção de memória nesse processo vivido com os/as estudantes, entendendo-a não como representação, mas como composto - memórias húmus, aproximamo-nos dos estudos de cognição realizados por Virgínia Kastrup, que já mencionamos neste texto.

Queremos dançar abrindo-nos a processos de dançarmos com, exercitando possibilidades de problematizar-nos, inventando-nos e inventando mundos. Daí que precisamos acionar memórias com as quais nos tornamos outros, podendo então considerá-las como memórias inventivas - nos termos de Kastrup - que podem ser acionadas por humanos e por não/humanos.

A aprendizagem que se constitui como colocação de problemas, ou seja, como invenção, para nós, se alinha com experimentação e composição coletiva, nos termos de Latour. Em nossa proposição com os/as estudantes de Corpo/Espaço, não fechamos as possibilidades em termos de composição, não elegemos modelos, mas nos empenhamos em aprender a acompanhar humanos/não/humanos em movimento e em permanente devir, co-constituindo-se como dançarinos e coreógrafos.

O eu cognoscente é parcial em todas suas formas, nunca acabado, completo, dado ou original; é sempre construído e alinhavado de maneira imperfeita e, portanto, capaz de juntar-se a outro, de ver junto sem pretender ser outro (Haraway, 1995HARAWAY, Donna. Saberes Localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial. Cadernos Pagu, Campinas, v. 5, p. 07-41, 1995., p. 26).

Nossa proposição com os/as educandos/as de Corpo/Espaço pautou-se por um entendimento de que "[...] não são os indivíduos que têm experiência, mas os sujeitos é que são constituídos através da experiência", como escreveu Joan W. Scott (1999SCOTT, Joan W. Experiência. Tradução de Ana Cecília Adoli Lima. In: SILVA, Alcione L.; LAGO, Mara C. S; RAMOS, Tânia R. O. Falas de Gênero. Santa Catarina: Editora Mulheres, 1999. P. 21-55., p. 27). Scott (1999SCOTT, Joan W. Experiência. Tradução de Ana Cecília Adoli Lima. In: SILVA, Alcione L.; LAGO, Mara C. S; RAMOS, Tânia R. O. Falas de Gênero. Santa Catarina: Editora Mulheres, 1999. P. 21-55., p. 48) escreve também que "[...] experiência é, ao mesmo tempo, já uma interpretação e algo que precisa de interpretação. O que conta como experiência não é nem auto-evidente, nem definido; é sempre contestável, portanto, sempre político". Ela fala também da necessidade de um projeto não de "[...] reprodução e transmissão de um conhecimento ao qual se chegou pela experiência", mas sim de "análise da produção desse conhecimento" (Scott, 1999SCOTT, Joan W. Experiência. Tradução de Ana Cecília Adoli Lima. In: SILVA, Alcione L.; LAGO, Mara C. S; RAMOS, Tânia R. O. Falas de Gênero. Santa Catarina: Editora Mulheres, 1999. P. 21-55., p. 48).

Ainda, Larrosa (2011LARROSA, Jorge. Experiência e Alteridade em Educação. Revista Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v. 19, n. 2, p. 04-27, jul./dez. 2011., p. 19) nos alerta:

Se um experimento é por definição, antecipável, ainda que seja antecipável, ainda que sua antecipação dependa de um cálculo de probabilidade, a experiência não pode ser antecipada. Não se pode saber de antemão qual vai ser o resultado de uma experiência, onde pode nos conduzir, o que vai fazer de nós. Isso porque a experiência não tem a ver com o tempo linear da planificação, da previsão, da predição, da prescrição, senão com o tempo da abertura. A experiência sempre tem algo de imprevisível (do que não se pode ver de antemão), de indizível (do que não se pode dizer de antemão, do que não está dito), de imprescritível (do que não se pode escrever de antemão, do que não está escrito). E mais, a incerteza lhe é constitutiva.

Assim, as propostas conduzidas em Corpo/Espaço procuraram tensionar esta relação entre experimento e experiência ao buscar constituir um espaço de indefinições e imprevisibilidades para que algo pudesse acontecer formando e transformando, no devir das relacionalidades, humanos/não/humanos.

Com as propostas conduzidas em Corpo/Espaço, pudemos evidenciar uma potencialização de nossas presenças em dança. Ao trabalharmos a atenção ao outro - humano/não/humano -, nos ocuparmos em conhecê-lo e não só a reconhecê-lo, e produzirmos danças que experimentam abranger o movimento de seus devires, criamos condições de nos tornar presentes de modos até então não experimentados. As presenças dos/as estudantes, nas pesquisas de movimento constituídas conjuntamente, ganharam em complexidade. Seus movimentos, ao serem pensados/feitos abrindo-se à conscientização de ações humanas/não/humanas - antes não levadas em conta do modo como experimentamos -, ensaiaram possibilidades de mudança de padrões tanto em relação a movimentos, corpos e danças, quanto em relação aos espaços a serem mobilizados para aulas, experimentações e composições em dança.

Dançar pode ser um verbo intransitivo, com ênfase somente na ação; pode ser também transitivo direto, significando executar passos. Entretanto, nessas aulas e na experiência no bosque da Reitoria, vi que é o adjunto adverbial 'dançar com o espaço' que faz a diferença12 12 Trecho do relato de processo escrito pelo aluno Bruno Mendonça, em Fortaleza/CE, 2013. .

Os/as discentes, ao usarem cadernos para registro do processo, anotaram situações, tentaram traduzir sensações e perceberam diferenças que enriqueceram a aprendizagem de todos nós. Tais observações propiciaram ainda a elaboração de textos em grupos, além da própria composição deste artigo.

Como compor com os sons dos pássaros e os sons dos carros? Como compor com o olhar dos transeuntes e com os dos guardas? Como compor com a areia e com o concreto do estacionamento? Como se mover nas escadas com restos de cocô de passarinho? Como compor com o verdejante dançante das folhas das árvores? Se entregar. Essa foi a estratégia de alguns!13 13 Relato de processo escrito conjuntamente pelos/as alunos/as: William, Vitória, Ana Carla, Ariel e Inélia, em Fortaleza/CE, 2013.

O bosque da Reitoria, pelo menos nos dias de nossos encontros, ganharam movimentos, olhares, atenção diferenciada dos que ali trabalham, passam, vivem.

Oxigênio emanado das árvores com o gás carbônico dos carros. Pessoas que transitam. Pessoas que são barradas pelas grades. Olhares que vem e vão. Olhares curiosos. Olhares que se relacionam com o que está ocorrendo depois das grades. Olhares que ousam e ocupam o mesmo espaço14 14 Relato de processo escrito conjuntamente pelas alunas: Isabella, Vanessa, Leonice e Carolina, em Fortaleza/CE, 2013. .

A disciplina Corpo/Espaço permitiu experienciarmos e nos inventou como seres dançantes, que aprendem, ensinam, compõem; inventou-nos como pesquisadores/as e como pesquisados/as, fez-nos transitar por posições de sujeito, objeto, coisa, humano, não/humano - agências as quais iniciaram uma trajetória de aprendizagem agregando e não separando, opondo e hierarquizando...

A curiosidade; a abertura ao outro; relações de proximidade entre materialidades/socialidades; intensificação de trocas por meio do toque e de outras maneiras de contato, envolvendo todos os sentidos; coleta de humanos e não/humanos para compor coletivos em dança; autoria compartilhada, entre humanos/não/humanos, de pesquisas de movimento e de situações que gerassem improvisações em dança; não hierarquização de papéis e posições nas etapas dos processos de criação; dançar/compor junto e em conjunto; ativação de memórias húmus, humanas/não/humanas, no processo de constituição de movimentos e de conduta; escutas/convite, ou seja, escutar de modo a perceber como é que se está sendo convidado a dançar - todos esses procedimentos compuseram nossa experimentação coletiva em dança.

Seguindo Kastrup (2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.), consideramos a experiência em seus aspectos inventivos e não só em termos de reconhecimento, repetição, reprodução, representação, senso comum, ou seja, não somente em seus aspectos recognitivos. Daí que percebemos que aprendizagens inventivas foram efetivadas de modos diversos em cada um dos encontros com o bosque, ou seja, se considerarmos os dias 25/11, 02/12 e 09/12 como os dias oficiais de nossa experiência com o bosque, podemos falar em três diferentes composições coletivas em dança. Não conduzimos as aulas, improvisações, composições incentivando repetições mecanicistas e sim agenciamentos, sendo que alguns deles foram estabilizados temporariamente.

Submeter a aprendizagem à repetição é subsumi-la à forma da recognição. Tanto como produção de respostas quanto como produção de regras, trata-se da ênfase na consolidação de seus resultados nas figuras estáveis da recognição e do saber (Kastrup, 2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007., p. 95).

Propomos que os pensamentos/movimentos que precisam ser experimentados são os que envolvem técnica como agenciamento com fluxos e não como repetição mecânica (Kastrup, 2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.), de modo a forjarmos uma aprendizagem que envolva devires aparelhados, uma aprendizagem que exija "destreza no trato com o devir" (Kastrup, 2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007., p. 175). Repetir sim, mas se for para diferenciar, para problematizar, para perceber diferenças sendo produzidas e, tudo isso, requer tempo...

Mais tempo para coletar... Mais tempo para registrar os processos... Mais tempo para experimentar com, dançar com... Mais tempo para desdobrar composições, de modo também a gerar produtos... Mais tempo para inventar o coletivo... Este é só um início...15 15 Trecho de relato de processo escrito por Emyle Daltro, em Fortaleza/CE, 2013. .

Mais tempo de aprendizagem como invenção, como colocação de problemas, voltada para o tempo presente, a articular-se com uma memória entendida como memória húmus que há em todos nós, humanos e não/humanos, como algo que vibra e faz vibrar, composto que nutre devires.

Considerações Finais

A instalação coreográfica, sobretudo quando ela é identificada como solo, do modo que ocorre com os dois trabalhos artísticos estudados, parece-nos constituir como uma busca pela experiência ou como um dos lugares de resistência à perda da faculdade de narrar, à pobreza de experiências comunicáveis, uma vez que evidencia cenicamente uma multiplicidade de vozes e movimentos de dançarinos/criadores não/humanos.

Entendemos as instalações coreográficas estudadas como proposições cênicas, mas cenas que, pelo modo como foram nomeadas, pelos procedimentos que as compuseram e pelas possibilidades que encontramos nelas para pensar/praticar associações de humanos e não/humanos em coreografias de mútua constituição, reinventam as noções de coreografia e instalação e reforçam a prática da composição como um modo de dançar, conhecer e viver que consideramos mais promissor do que a prática da dominação.

Com os estudantes da disciplina Corpo/Espaço, propusemo-nos a compor com o espaço e não a dominar o espaço; a compor com técnicas e não as dominar; a compor com objetos que transitam entre posições de sujeito e de objeto, posições às quais nós também ocupamos. Esses procedimentos que enfatizam a composição também foram observados nas instalações coreográficas Vestígios e Verdades Inventadas.

Não somos autossuficientes, nem automoventes (Lepecki, 2010LEPECKI, André. Planos de Composição. In: GREINER, Christine; SANTO, Cristina Espírito; SOBRAL, Sonia. CARTOGRAFIA Rumos Itaú Cultural Dança 2009-2010. São Paulo, 2010. P. 13-20.), compomos dança e nós mesmos em relações, o que foi acompanhado com o estudo das duas instalações coreográficas e com a experimentação que propusemos com os/as educandos de Corpo/Espaço. Esse pensamento/procedimento, o qual considera humanos/não/humanos como co-coreógrafos de danças, promove uma articulação - nos termos de Bruno Latour (2008LATOUR, Bruno. Como Falar do Corpo? A dimensão normativa dos estudos sobre a ciência. In: NUNES, João Arriscado; ROQUE, Ricardo. Objetos Impuros: experiências em estudos sobre a ciência. Porto: Edições Afrontamento e autores, 2008. P. 39-61. ) - entre diferentes temporalidades e espacialidades, mostrando como corpos, movimentos e danças são efeitos relacionais de performances com objetos, realidades, pessoas, entre outras agências.

Nessa trilha é que propomos composição em dança em termos de experimentação coletiva (Latour, 2004LATOUR, Bruno. Políticas da Natureza: como fazer ciência na democracia. Tradução Carlos Aurélio Mota de Souza. Bauru, São Paulo: Edusc, 2004.), em que processos de tornar-se com (Haraway, 2008HARAWAY, Donna. When Species Meet. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2008. (Posthumanities. Vol. 3).; Haraway; Azerêdo, 2011HARAWAY, Donna; AZERÊDO, Sandra. Companhias Multiespécies nas Naturezaculturas: uma conversa entre Donna Haraway e Sandra Azerêdo. In: MACIEL, Maria Esther (Org.). Pensar/Escrever o Animal ensaios de zoopoética e biopolítica. Florianópolis: Editora da UFSC, 2011. P. 389-417. ) engendram mutuamente dançarinos - humanos/não/humanos - e danças. Ao acompanharmos esse processo, nos trabalhos estudados, verificamos a insurgência de múltiplos modos de movimentar, de ser e de viver forjando um dançar com (Milioli, 2012MILIOLI, Danielle. Dançando com não/humanos: processos sociotécnicos em dança contemporânea como experimentos em pesquisa. 2012. 89 f. Dissertação (Mestrado em Cultura Contemporânea) - Instituto de Linguagens, Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2012.) que aciona memórias inventivas. Memórias que se diferem do entendimento tradicional que as postulam em termos de representação, pautadas na resolução de problemas pertinentes aos processos de individuação (Simondon apud Kastrup, 2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.), mas se aproximam dos resíduos, restos desses processos, os quais possibilitam constantes devires mesmo às formas individuadas - memórias húmus, que nos possibilitam transgredir fronteiras e nos diferenciarmos, mesmo que temporariamente, do que somos; memórias que nutrem mudanças.

As instalações coreográficas, bem como nossa proposição com os/as estudantes, tendem a fortalecer o trânsito de um espaço, tradicionalmente destinado à dança, para outros espaços; de um tipo de chão para outros chãos que forjam entendimentos de corpo, movimento e dança como formas provisórias resultantes de processos de mediação. Processos estes em que riscos são assumidos quando humanos com não/humanos, natureza com cultura, arte com política dançam juntos instaurando temporalidades não unilineares, capazes de colocar o tempo cronológico em suspensão e abrirem frestas para que revejamos, reouçamos, repensemos e re-habitemos outras histórias, que possam constituir mundos a partir de projetos "[...] de liberdade finita, abundância adequada de material, significado modesto em sofrimento e felicidade finita" (Haraway apud Schneider, 2005SCHNEIDER, Joseph. Donna Haraway: live theory. New York; London: Continuum, 2005., p. 102 - tradução Lab. TeCC/UFMT), onde possamos morar - mundos co-memoráveis!

Referências

  • AGOSTINHO, Santo. Confissões. Tradução de J. Oliveira Santos, S. J., e A. Ambrosio de Pina, S. J. São Paulo: Abril Cultural, 1980. (Coleção Os Pensadores).
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  • 33
    Este texto inédito também se encontra publicado em inglês neste número do periódico.
  • 1
    Desenvolvido a partir do artigo Sentidos do corpo em cena, de Roberta K. Matsumoto, VIII Congresso da ABRACE (2014MATSUMOTO, Roberta Kumasaka. Sentidos do corpo em cena. In: CONGRESSO DA ABRACE, 8, 2014, Belo Horizonte, UFMG. (No prelo).) e da tese Corporrelacionalidades e coletivo na composição e aprendizagem inventivas em dança, de Emyle Daltro, Programa de Pós-Graduação em Arte, Universidade de Brasília (2014DALTRO, Emyle. Corporrelacionalidades e Coletivo na Composição e Aprendizagem Inventivas em Dança. 2014. 233f. Tese (Doutorado em Arte) - Departamento de Artes Visuais, Programa de Pós-Graduação em Arte, Universidade Federal de Brasília, Brasília/DF, 2014.).
  • 2
    Até onde temos notícia, foi Marta Soares quem iniciou a usar o termo instalação coreográfica para se referir a alguns de seus trabalhos como O Banho, que estreou em 2004, na cidade de São Paulo. Ela chamou igualmente Vestígios de instalação coreográfica para que a obra pudesse ser considerada um trabalho de pesquisa em dança (Informação fornecida por Marta Soares em entrevista concedida a Emyle Daltro em São Paulo, em 2012).
  • 3
    Adotamos tal expressão a partir dos estudos do Grupo de Pesquisa Tecnologias, Ciências e Criação (Lab. TeCC/UFMT) que usam a expressão não/humanos, ao invés de não-humanos ou ainda não humanos, para acionar um pensamento/prática que não estabelece fronteiras fixas entre humanos e não/humanos (Galindo; Milioli; Méllo, 2013GALINDO, Dolores; MILIOLI, Danielle; MÉLLO, Ricardo. Dançando com Grãos de Soja, espécies companheiras na deriva pós-construcionista. Psicologia & Sociedade, Belo Horizonte, v. 25, n. 1, p. 48-57, 2013. Disponível em: <Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/psoc/v25n1/07.pdf >. Acesso em: 12 jun. 2013.
    http://www.scielo.br/pdf/psoc/v25n1/07.p...
    ). Nos chamam a atenção também para o fato de que "O prefixo 'não', ainda que possa remeter a antagonismos entre humanos e não/humanos, é mantido para sugerir resistência a tais concepções" (Giffney; Hird apud Milioli, 2012MILIOLI, Danielle. Dançando com não/humanos: processos sociotécnicos em dança contemporânea como experimentos em pesquisa. 2012. 89 f. Dissertação (Mestrado em Cultura Contemporânea) - Instituto de Linguagens, Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2012., p. 13).
  • 4
    Para Deleuze todo ato de criação parte de uma necessidade. "Um criador não é um ser que trabalha pelo prazer. Um criador só faz aquilo de que tem absoluta necessidade" (1987DELEUZE, Gilles. Qu'Est-ce que l'Acte de Création? Palestra proferida no âmbito do "Mardi de la Fondation" da FEMIS, em 17 mar. 1987. Tradução de José Marcos Macedo. , informação verbal).
  • 5
    Escrevemos ensino/aprendizagem para pensarmos o ensino e a aprendizagem sendo constituídos mutuamente na relação.
  • 6
    O Judson Dance era um grupo de dançarinos que performavam na Judson Memorial Church, em Greenwich Village, cidade de Nova Iorque, entre os anos de 1962 e 1964. De acordo com Jorge Glusberg (2008GLUSBERG, Jorge. A Arte da Performance. Tradução de Renato Cohen. São Paulo: Perspectiva, 2008., p. 37), "[...] a Judson Dance Company vai desenvolver uma atividade efervescente, através dos trabalhos inovadores de Steve Paxton, Simone Forti, Yvonne Rainer, Trisha Brown, Deborah Hay, Lucinda Childs, Philip Corner, entre outros, atraindo a atenção de inúmeros artistas, cuja colaboração com os bailarinos e coreógrafos suscita criações que rompem a fronteira da dança - mesmo da dança moderna -, injetando novos e ricos elementos ao happening e delineando os contornos que caracterizarão a bodyart nos anos setenta".
  • 7
    Vestígios, de Marta Soares e Verdades Inventadas, de Thembi Rosa, são amplamente analisados na Tese Corporrelacionalidades e coletivo na composição e aprendizagem inventivas em dança de Emyle Daltro (2014DALTRO, Emyle. Corporrelacionalidades e Coletivo na Composição e Aprendizagem Inventivas em Dança. 2014. 233f. Tese (Doutorado em Arte) - Departamento de Artes Visuais, Programa de Pós-Graduação em Arte, Universidade Federal de Brasília, Brasília/DF, 2014.).
  • 8
    Informação fornecida por Thembi Rosa em entrevista concedida a Emyle Daltro, em Belo Horizonte/MG, em 2013.
  • 9
    Com Virgínia Kastrup (2007KASTRUP, Virgínia. A Invenção de Si e do Mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.) entendemos invenção como colocação de problemas.
  • 10
    Agradecemos aos alunos e alunas Ana Carla de Souza Campos, Ana Carolina Moreira de Oliveira, Ariel Ferreira do Nascimento, Bruno Rodrigues Mendonça, Danilo Batista de Sousa, Edcleyton (Ed) Rodrigues da Silva, Franciely Ketelyn Lima de Sousa, Gustavo de Paula Mineiro, Inélia Cardoso Brito, Isabella Moreira de Oliveira, Jéssica Maria Fernandes Noronha, Leonice Pereira de Oliveira, Luisa Viana Elizeu da Silva, Vanessa Santos Viana, Vitória Avelina Barboza Almeida e William Deimyson Pereira da Silva, que cursaram a disciplina Corpo e Espaço, no segundo semestre de 2013, e com os quais pudemos compartilhar as experimentações que compõem o estudo mencionado neste texto.
  • 11
    Danielle Milioli (2012MILIOLI, Danielle. Dançando com não/humanos: processos sociotécnicos em dança contemporânea como experimentos em pesquisa. 2012. 89 f. Dissertação (Mestrado em Cultura Contemporânea) - Instituto de Linguagens, Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2012., p. 13) nos lembra que nos estudos sociotécnicos "[...] o termo actante é empregado para aludir a não diferenciação entre humanos e não humanos em contraposição ao emprego da noção de atores vinculada aos primeiros".
  • 12
    Trecho do relato de processo escrito pelo aluno Bruno Mendonça, em Fortaleza/CE, 2013.
  • 13
    Relato de processo escrito conjuntamente pelos/as alunos/as: William, Vitória, Ana Carla, Ariel e Inélia, em Fortaleza/CE, 2013.
  • 14
    Relato de processo escrito conjuntamente pelas alunas: Isabella, Vanessa, Leonice e Carolina, em Fortaleza/CE, 2013.
  • 15
    Trecho de relato de processo escrito por Emyle Daltro, em Fortaleza/CE, 2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr 2016

Histórico

  • Recebido
    12 Dez 2014
  • Aceito
    17 Jun 2015
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