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Análise mecânica e térmica de argamassas de revestimento com substituição parcial do agregado por argila expandida

Mechanical and thermal analysis of coating mortars with partial replacement of aggregate by expanded clay

Resumo

No cenário da Construção Civil, o desempenho dos elementos construtivos constitui uma temática pertinente para a pesquisa científica. Sob esse viés, o objetivo do trabalho consistiu em analisar o comportamento mecânico e térmico de argamassas de revestimento, utilizando diferentes teores - 10%, 20%, 30%, 40% e 50% - de uma fração fina de argila expandida como substituta parcial do agregado convencional, a fim de compará-las a uma argamassa de referência sem argila expandida. Para isso, foram determinadas importantes propriedades mecânicas das argamassas, tanto no estado fresco como no estado endurecido. Além disso, foi determinada a condutividade térmica das argamassas e realizados testes laboratoriais com o auxílio de simuladores de incidência e transferência de calor nas amostras. Os resultados apontam que as argamassas com incorporação de argila expandida não apresentaram impactos negativos nas suas propriedades mecânicas. Em contrapartida, observou-se que o aumento do teor de argila expandida na composição dos traços reduziu a condutividade térmica e aumentou o isolamento térmico das amostras. Desse modo, fica evidente a influência do agregado leve no comportamento térmico das argamassas em estudo, sem comprometer o seu comportamento mecânico.

Palavras-chave:
Conforto térmico; Propriedades mecânicas; Argamassa isolante

Abstract

In the construction industry context, the performance of constructive elements is a relevant topic for scientific research. Hence, the aim of this study was to analyse the mechanical and thermal behaviour of lining mortars, using different contents - 10%, 20%, 30%, 40% and 50% - of a fine fraction of expanded clay as a partial substitute for the conventional aggregate, in order to compare them with a reference mortar without expanded clay. With that purpose, important mechanical properties of the mortars were identified, both in the fresh state and in the hardened state. In addition, the thermal conductivity of the mortars was determined and laboratory tests were carried out on the samples with the aid of incidence and heat transfer simulators. The results show that the mortars incorporating expanded clay did not present negative impacts on their mechanical properties. On the other hand, the increase in the expanded clay content in the composition of the mixes reduced the thermal conductivity and increased the thermal insulation of the samples. Thus, the influence of light aggregate on the thermal behaviour of the mortars under study is evident, without compromising their mechanical behaviour.

Keywords:
Thermal comfort; Mechanical properties; Insulating mortar

Introdução

A preocupação com o desempenho térmico das edificações propicia o desenvolvimento de melhorias na execução e na fiscalização dos serviços no setor da construção civil. Nessa perspectiva, muitos países já possuem normas de desempenho de edificações residenciais e comerciais. No Brasil, por exemplo, encontram-se em vigor a NBR 15220 (ABNT, 2005dASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15220: desempenho térmico de edificações. Rio de Janeiro, 2005d. ) e a NBR 15575 (ABNT, 2013ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15575: edificações habitacionais: desempenho. Rio de Janeiro, 2013. ), que tratam do desempenho das edificações habitacionais, assunto que vem ganhando cada vez mais espaço na pesquisa científica. Em meio às exigências observadas nas normas supracitadas, algumas remetem ao conforto térmico das edificações. Essa temática possui vasta relevância, não somente devido aos gastos energéticos associados a isso, como também a sua indissociável relação com a qualidade de vida dos usuários, sobretudo em países de clima predominantemente tropical.

Com relação ao conforto ambiental em áreas urbanas, muitas instituições internacionais têm feito projeções pessimistas para os próximos anos e, diante desse quadro, serão necessárias estratégias que visem à substituição de métodos de resfriamento e ventilação mecânicos por métodos alternativos que minimizem os gastos com energia (SOUZA, 2012SOUZA, H. M. P. de. O conforto ambiental na arquitetura colonial brasileira: heranças muçulmanas. ARCHITECTON - Revista de Arquitetura e Urbanismo, Recife, v. 2, p. 41-54, 2012.).

Nesse contexto, o uso de agregados leves nas argamassas vem sendo estudado e tem apresentado resultados que indicam o aumento da eficiência no tocante aos isolamentos térmicos. Palomar, Barluenga e Puentes (2015)PALOMAR, I.; BARLUENGA, G.; PUENTES, J. Lime-cement mortars for coating with improved thermal and acoustic performance. Construction and Building Materials , v. 75, p. 306-314, 2015. estudaram argamassas de cimento-cal com incorporação de agregados graduados por lacuna, agregados leves e fibras. Os autores verificaram que a proporção de agregados leves - argila expandida, perlita e vermiculita - afetou significativamente o desempenho térmico das argamassas. Guardia et al. (2019)GUARDIA, C. et al. Thermal enhanced cement-lime mortars with phase change materials (PCM), lightweight aggregate and cellulose fibers. Construction and Building Materials , v. 221, p. 586-594, 2019. também observaram o comportamento térmico de argamassas, em que foi utilizado um material de mudança de fase, perlita expandida e fibras de celulose, e constataram que a incorporação do agregado leve aumentou a porosidade, enquanto reduziu a resistência e a condutividade térmica das argamassas.

Dessarte, a pesquisa parte do pressuposto de que a incorporação de argila expandida na produção de argamassas pode acarretar um melhor conforto térmico aos usuários, tendo em vista sua leveza e elevada porosidade se comparada aos agregados convencionais, devido à estrutura porosa de seus grãos (MORAVIA et al., 2006MORAVIA, W. G. et al. Caracterização microestrutural da argila expandida para aplicação como agregado em concreto estrutural leve. Cerâmica, v. 52, n. 322, p. 193-199, 2006.). Ozguven e Gunduz (2012)OZGUVEN, A.; GUNDUZ, L. Examination of effective parameters for the production of expanded clay aggregate. Cement and Concrete Composites, v. 34, n. 6, p. 781-787, 2012. constataram que as principais características das unidades de alvenaria realizadas com argila expandida são a sua baixa densidade, alta resistência aos ciclos gelo-degelo, elevada resistência ao fogo, bom isolamento térmico e acústico e boa resistência à ação de agentes químicos.

Diante disso, o presente trabalho pretende preencher a lacuna do conhecimento com relação à análise de propriedades térmicas das argamassas com incorporação, em volume, de diferentes teores - 10%, 20%, 30%, 40% e 50% - de uma fração fina de argila expandida em substituição ao agregado convencional, a fim de comparar os resultados com os de uma argamassa de referência sem incorporação do agregado leve. Além disso, objetiva verificar se o uso da argila expandida interfere nas propriedades mecânicas requeridas para se ter uma argamassa de revestimento adequada para aplicações gerais em obras.

Materiais

Foram utilizados o cimento Portland de alta resistência inicial e resistente a sulfatos (CP V-ARIRS) e dois tipos de agregados miúdos: areia natural fina (AN) e uma fração fina de argila expandida (AE) - passante na peneira 2,0 mm e retida na peneira 1,18 mm. A distribuição granulométrica dos agregados utilizados é mostrada na Figura 1 e as suas propriedades físicas estão dispostas na Tabela 1. A água utilizada foi a proveniente da rede de distribuição local.

Métodos

As argamassas foram preparadas de modo padronizado utilizando misturador mecânico, de acordo com a NBR 16541 (ABNT, 2016bASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 16541: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos: preparo da mistura para a realização de ensaios. Rio de Janeiro, 2016b. ). Como referência, utilizou-se uma argamassa sem argila expandida, de traço 1:3 (cimento:areia) em volume. A areia natural foi substituída, também em volume, pelas porcentagens de 10%, 20%, 30%, 40% e 50% de argila expandida. A Tabela 2 mostra o consumo de materiais - cimento (Cc), areia (Ca) e argila expandida (Cae) - empregados na composição das argamassas estudadas, bem como o traço dessas em volume e suas respectivas porcentagens de substituição do agregado convencional pelo agregado leve.

Figura 1
Distribuição granulométrica dos agregados

Tabela 1- Propriedades
físicas dos agregados

Tabela 2
Composição das argamassas

Para os ensaios no estado fresco, inicialmente foi realizado o método para a determinação do índice de consistência das argamassas, sendo considerada ideal a quantidade de água - em cada traço - que proporcionou espalhamento médio de 260 ± 5 mm, de acordo com a NBR 13276 (ABNT, 2016aASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13276: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos: determinação do índice de consistência. Rio de Janeiro, 2016a. ). Também foi determinada a densidade de massa das argamassas, por meio da relação entre a quantidade de massa de argamassa fresca capaz de preencher um recipiente de volume conhecido, conforme estabelece a NBR 13278 (ABNT, 2005aASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13278: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos - determinação da densidade de massa e do teor de ar incorporado. Rio de Janeiro, 2005a. ).

Para a realização de ensaios no estado endurecido das argamassas, foram produzidos corpos de prova prismáticos de 4 cm x 4 cm x 16 cm, de acordo com a NBR 13279 (ABNT, 2005bASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13279: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos: determinação da resistência à tração na flexão e à compressão. Rio de Janeiro, 2005b. ). Os corpos de prova foram desmoldados entre 24 e 48 horas após sua moldagem e deixados em tanques de cura com água por 28 dias. Foi utilizada uma máquina universal de ensaios para determinar as resistências à tração na flexão e à compressão, seguindo orientações da NBR 13279 (ABNT, 2005bASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13279: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos: determinação da resistência à tração na flexão e à compressão. Rio de Janeiro, 2005b. ). O módulo de elasticidade dinâmico foi determinado por meio indireto, com base na propagação de ondas ultrassônicas, conforme a NBR 15630 (ABNT, 2008ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15630: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos: determinação do módulo de elasticidade dinâmico através da propagação de onda ultra-sônica. Rio de Janeiro, 2008. ). A densidade de massa aparente e o índice de vazios, bem como a absorção de água por imersão e fervura, também constituem o conjunto de ensaios mecânicos realizados nas argamassas no estado endurecido (ABNT, 2005cASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13280: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos: determinação da densidade de massa aparente no estado endurecido. Rio de Janeiro, 2005c. , 2005dASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15220: desempenho térmico de edificações. Rio de Janeiro, 2005d. ).

Com relação à determinação da condutividade térmica, foram confeccionados corpos de prova com 50 cm³ de volume. Os testes foram realizados 28 dias após a moldagem dos corpos de prova. Para isso, foi utilizada a sonda SH-1 do medidor de propriedades térmicas KD2-Pro, própria para materiais sólidos/granulares, constituída de duas agulhas, uma que funciona como fonte de calor e outra como termopar. O procedimento não normalizado consistiu em, inicialmente, cobrir as agulhas da sonda com uma pasta térmica para facilitar o contato com o material em estudo (Figura 2a). Em seguida, os corpos de prova foram acoplados à sonda (Figura 2b) e acondicionados no interior de uma câmara isolada termicamente, composta basicamente de um recipiente de material plástico preenchido com poliestireno expandido granulado no seu interior (Figura 2c). Antes de iniciar cada medição, o recipiente foi fechado com tampa.

As análises tiveram duração de 10 minutos para cada corpo de prova e um intervalo de 15 minutos entre uma análise e outra, de modo a assegurar que o calor gerado em cada ensaio fosse liberado e não interferisse na medição seguinte.

Enquanto isso, para determinar o isolamento térmico, foram produzidos prismas constituídos por tijolos cerâmicos envoltos pelas argamassas em estudo. Os prismas foram desenformados 24 horas após a sua moldagem e deixados em cura à temperatura ambiente por 28 dias. A Tabela 3 mostra a nomenclatura dos prismas utilizados no teste para determinar o isolamento térmico, relacionando-os com as respectivas argamassas utilizadas na sua confecção.

Com dimensões de 38 cm x 21 cm x 13 cm, cada prisma para ensaio térmico foi constituído por dois tijolos cerâmicos de 8 furos e argamassa de revestimento em ambas as faces. Foram feitos furos para a inserção de guias indicando a espessura - estabelecida como 2 cm - dos revestimentos (Figura 3a). Esses furos serviram também para a colocação de sensores a serem utilizados para a determinação da transmissão térmica individualmente (argamassas e tijolo) e no conjunto. Antes da confecção dos prismas, os tijolos receberam uma camada de chapisco. A argamassa foi aplicada primeiramente até a demarcação inferior das guias (Figura 3b). Posteriormente, foram colocados os tijolos acima da camada de argamassa (Figura 3c). Após a colação dos tijolos, procedeu-se com o preenchimento da fôrma e o rasamento da superfície (Figura 3d).

Figura 2
Determinação de propriedades térmicas das argamassas

Tabela 3
Nomenclatura dos prismas em função das argamassas que os compõem

Figura 3
Moldagem de prisma para ensaio de isolamento térmico

O ensaio de determinação do isolamento térmico das amostras consistiu em simular a aplicação de uma fonte de calor sobre a alvenaria de vedação externa de uma edificação, medindo a temperatura em cada elemento constituinte da alvenaria, com a finalidade de determinar o quanto cada elemento contribui para o isolamento total da alvenaria. Para isso, foi confeccionado um aparato experimental (Figura 4), composto de uma caixa de madeira com dimensões de 80 cm x 60 cm x 50 cm, uma fonte de calor (lâmpada halógena) de 250 W e uma divisória interna, em que foi posicionado o prisma, envolto por espuma de poliuretano. A divisória interna é constituída por uma placa de madeira de 2 cm de espessura, na qual foi fixada uma placa de aço de 5 mm de espessura, com a finalidade de uniformizar a temperatura na superfície do prisma. Foram inseridos 10 sensores de temperatura nos prismas, de forma centralizada e todos no mesmo alinhamento horizontal (Figura 4). Os sensores foram conectados a um arduino que transmite as leituras das temperaturas obtidas a cada minuto para um software (CoolTerm).

As amostras foram ensaiadas uma a uma, tendo cada ensaio duração de 180 minutos, tempo em que se observou a estabilização da temperatura. Foram feitas duas análises principais: uma do isolamento térmico total dos prismas e outra do isolamento térmico das argamassas de revestimento próximas à fonte de calor. Na primeira, foi considerada a diferença entre a média das temperaturas detectadas pelos sensores 1, 2 e 3 e a média das temperaturas detectadas pelos sensores 8, 9 e 10. E, na segunda, foi considerada a diferença entre a média das temperaturas detectadas pelos sensores 1, 2 e 3 e a média das temperaturas detectadas pelos sensores 4 e 5. Além dessas análises, foi possível identificar a contribuição dos tijolos cerâmicos no isolamento total dos prismas - diferença entre a média das temperaturas detectadas pelos sensores 4 e 5 e a média das temperaturas detectadas pelos sensores 6 e 7 - e a contribuição das argamassas internas - diferença entre a média das temperaturas detectadas pelos sensores 6 e 7 e a média das temperaturas detectadas pelos sensores 8, 9 e 10.

Resultados e discussões

Nesta seção, serão expostos os resultados obtidos com a realização dos ensaios no estado fresco e no estado endurecido das argamassas, bem como o comportamento térmico estudado.

Figura 4
Esquema da vista superior do aparato experimental térmico e posicionamento dos sensores

Estado fresco das argamassas

A partir do ensaio de índice de consistência, foi possível verificar que, para manter o mesmo espalhamento, a relação água/materiais secos aumentou conforme aumentou a quantidade de argila expandida na mistura. Devido à estrutura porosa dos seus grãos, a argila expandida apresenta alta porosidade em relação aos agregados convencionais, o que explica o aumento da absorção de água (MORAVIA et al., 2006MORAVIA, W. G. et al. Caracterização microestrutural da argila expandida para aplicação como agregado em concreto estrutural leve. Cerâmica, v. 52, n. 322, p. 193-199, 2006.). Consequentemente, foi necessária uma maior quantidade de água nas misturas para se obter a mesma trabalhabilidade.

Enquanto isso, a densidade de massa das argamassas diminuiu com o acréscimo de argila expandida, pois o agregado natural foi substituído por um agregado leve, com massa unitária de aproximadamente 3 vezes menor que o agregado natural. A regra da mistura dos materiais compósitos corrobora esse resultado, uma vez que a densidade do compósito depende da densidade dos materiais que o compõem e suas respectivas frações volumétricas. A Tabela 4 mostra tanto a relação água/materiais secos quanto a densidade de massa das argamassas estudadas.

Estado endurecido das argamassas

Os dados obtidos nos ensaios de resistência à tração na flexão (RTF) e à compressão (RC) das argamassas estudadas e o consumo de cimento estão dispostos na Figura 5.

Pode-se constatar que RTF permaneceu praticamente constante para todos os traços analisados. Contudo, notou-se um aumento de 26,2% na RC do MR para o M50. Nesse aspecto, observou-se uma tendência ao aumento da resistência à compressão à medida que aumentou a quantidade de argila expandida nos traços. Isso aconteceu, possivelmente, devido ao consumo de cimento (Cc), que, como pode ser observado também na Figura 7, aumentou aproximadamente 16,1% do MR ao M50.

A Figura 6 relaciona o módulo de elasticidade dinâmico (Ed) das argamassas com seus respectivos valores de absorção de água (A) e índice de vazios (Iv).

O módulo de elasticidade dinâmico é afetado pela porosidade do material, sendo menor quanto maior for a porosidade. Verifica-se que a inclusão de agregados leves e porosos tende a reduzir a velocidade do pulso ultrassônico e, consequentemente, o módulo de elasticidade dinâmico em todas as amostras analisadas em relação à amostra de referência, em virtude da maior porosidade das argamassas produzidas constatada pela redução da densidade de massa aparente e pelo aumento do índice de vazios. Nota-se que, com o incremento de argila expandida, o índice de vazios da argamassa M50 aumentou cerca de 21,6% em relação à amostra MR, provocando uma redução do módulo de elasticidade dinâmico em 26%. Esse fato foi relatado em outros trabalhos sempre seguindo a mesma tendência (BADACHE et al., 2018BADACHE, A. et al. Thermo-physical and mechanical characteristics of sand-based lightweight composite mortars with recycled high-density polyethylene (HDPE). Construction and Building Materials, v. 163, p. 40-52, 2018.; LATROCH et al., 2018LATROCH, N. et al. Physico-mechanical and thermal properties of composite mortars containing lightweight aggregates of expanded polyvinyl chloride. Construction and Building Materials , v. 175, p. 77-87, 2018. ; UYGUNOǦLU; TOPÇU, 2010UYGUNOǦLU, T.; TOPÇU, I. B. The role of scrap rubber particles on the drying shrinkage and mechanical properties of self-consolidating mortars. Construction and Building Materials , v. 24, n. 7, p. 1141-1150, 2010.; WANG; MEYER, 2012WANG, R.; MEYER, C. Performance of cement mortar made with recycled high impact polystyrene. Cement and Concrete Composites , v. 34, n. 9, p. 975-981, 2012.).

Tabela 4
Relação água/aglomerante e densidade de massa das argamassas

Figura 5
Relação entre a resistência à tração na flexão, a resistência à compressão e o consumo de cimento das argamassas

Figura 6
Relação entre a absorção e o índice de vazios com o módulo de elasticidade dinâmico das argamassas

Comportamento térmico

A Figura 7 apresenta a relação entre a condutividade térmica (k), o índice de vazios (Iv) e a densidade de massa aparente (D) das misturas estudadas. Verificou-se que a condutividade térmica diminuiu à medida que aumentou a quantidade de argila expandida nos traços. Isso se deve ao aumento do índice de vazios e à redução da densidade de massa aparente das argamassas. Diversos pesquisadores relataram a redução da condutividade térmica ao adicionar agregados leves em compósitos cimentícios (BORGES; FLORES-COLEN; BRITO, 2018BORGES, A.; FLORES-COLEN, I.; BRITO, J. de. Physical and mechanical performance of cement-based renders with different contents of fly ash, expanded cork granules and expanded clay. Construction and Building Materials , v. 191, p. 535-543, 2018.; CORINALDESI; MAZZOLI; SIDDIQUE, 2016CORINALDESI, V.; MAZZOLI, A.; SIDDIQUE, R. Characterization of lightweight mortars containing wood processing by-products waste. Construction and Building Materials , v. 123, p. 281-289, 2016. ; NEPOMUCENO; SILVA, 2014NEPOMUCENO, M. C. S.; SILVA, P. D. Experimental evaluation of cement mortars with phase change material incorporated via lightweight expanded clay aggregate. Construction and Building Materials , v. 63, p. 89-96, 2014.; QUIÑONES-BOLAÑOS et al., 2021QUIÑONES-BOLAÑOS, E. et al. Potential use of coconut fibre modified mortars to enhance thermal comfort in low-income housing. Journal of Environmental Management, v. 277, jan. 2021.; WANG; MEYER, 2012WANG, R.; MEYER, C. Performance of cement mortar made with recycled high impact polystyrene. Cement and Concrete Composites , v. 34, n. 9, p. 975-981, 2012.).

Houve uma redução de aproximadamente 34,1% na condutividade térmica das argamassas ao relacionar o traço sem incremento de argila expandida (MR) com o traço com a maior quantidade de argila expandida empregada (M50), ao passo que o índice de vazios aumentou 21,6% e a densidade de massa aparente reduziu 17,5%. Sacht, Rossignolo e Santos (2010)SACHT, H. M.; ROSSIGNOLO, J. A.; SANTOS, W. N. Avaliação da condutividade térmica de concretos leves com argila expandida. Revista Matéria, Rio de Janeiro, v. 15, n. 1, p. 31-39, 2010. também observaram que, a partir da diminuição dos valores de massa específica do concreto com substituição de brita basáltica por argila expandida, ocorre um decréscimo da sua condutividade térmica. Neste estudo, isso está relacionado ao fato da existência de ar aprisionado na estrutura celular dos agregados leves, fazendo com que haja uma redução na transferência e na absorção de calor.

O isolamento térmico de cada prisma deste estudo está descrito na Figura 8, que relaciona o isolamento térmico com o tempo em que as amostras foram submetidas à exposição de calor.

Observa-se que o prisma composto da argamassa que contém a maior quantidade de argila expandida (TM50) foi o que obteve o maior valor de isolamento térmico entre a face interna e a face externa. Esse prisma isolou 15,9% a mais que o TMR, que é composto da argamassa sem incorporação de argila expandida. Os demais prismas obtiveram valores intermediários entre TMR e TM50.

A Figura 9 apresenta os resultados obtidos, considerando apenas o isolamento térmico das argamassas de revestimento que estão submetidas diretamente à fonte de calor. Nesse aspecto, nota-se que a argamassa M50 isolou 34,7% a mais que MR.

Figura 7
Relação entre a condutividade térmica, o índice de vazios e a densidade de massa aparente das argamassas

Figura 8
Isolamento térmico dos prismas

Figura 9
Isolamento térmico das argamassas

Verifica-se, pois, que o que mais influenciou a discrepância entre os resultados obtidos nos testes com os prismas foi a incorporação de argila expandida às argamassas. É possível constatar que o isolamento apresentou três fases distintas. Uma fase inicial, na qual o material absorve calor, apresentando um isolamento praticamente linear até o tempo de aproximadamente 15 minutos, sendo a absorção de calor efetuada principalmente pelas partes sólidas da argamassa. As argamassas MR, M10, M20, M30 e M40 obtiveram um comportamento semelhante, apresentando uma taxa de isolamento de aproximadamente 0,20 ºC/min, e a argamassa M50 obteve uma taxa de isolamento de aproximadamente 0,3 ºC/min. A partir dos 15 minutos, os materiais apresentam uma fase na qual acontece a absorção de calor pelos materiais sólidos e pelo ar incorporado; nota-se que o ar incorporado absorve calor e começa a diminuir a taxa de isolamento, que passa a ser não linear, até os 60 minutos de ensaio. A partir dos 60 minutos, acontece uma pequena queda no isolamento, devido, principalmente, à absorção de calor pelo ar presente no interior da argila expandida, que faz o isolamento decrescer até o final do ensaio.

Os gráficos mostrados na Figura 10 exibem a contribuição de cada parte do conjunto argamassa-tijolo-argamassa no isolamento total dos prismas.

Figura 10
Contribuição de cada parte do conjunto que compõe os prismas analisados

Nota-se que a contribuição dos tijolos cerâmicos (T) no isolamento total dos prismas é praticamente constante para todos os traços analisados, sendo responsável por cerca de 70%dos isolamentos totais, em média. Percebe-se também que a contribuição da argamassa da face interna do prisma (AInt) apresenta colaborações irrelevantes se comparadas ao restante do conjunto. Isso acontece devido ao alto isolamento que o tijolo cerâmico apresenta e que, juntamente com a argamassa próxima à fonte de calor, impede praticamente que o calor atinja a argamassa oposta à fonte de calor. Observa-se, também, que a argamassa localizada próxima à fonte de calor é responsável pelo isolamento do conjunto até um período de tempo de aproximadamente 50 minutos, no qual, a partir desse ponto, o tijolo cerâmico passa a ser o responsável pelo isolamento total do conjunto. A Figura 11 mostra a contribuição do isolamento térmico oriundo das argamassas da face próxima à fonte de calor (Mi) em relação ao isolamento térmico total obtido pelos prismas (TMi), sendo “i” a porcentagem de argila expandida incorporada às argamassas.

Figura 11
Contribuição do isolamento térmico das argamassas no isolamento térmico dos prismas

Desse modo, evidencia-se que, à medida que se acrescentou argila expandida às argamassas, essas aumentaram sua capacidade de isolamento térmico, ao passo que a condutividade térmica delas diminuiu. Nepomuceno e Silva (2014)NEPOMUCENO, M. C. S.; SILVA, P. D. Experimental evaluation of cement mortars with phase change material incorporated via lightweight expanded clay aggregate. Construction and Building Materials , v. 63, p. 89-96, 2014. também constataram que as argamassas com argila expandida apresentam menor condutividade térmica e tendência à redução da resposta térmica (atraso na obtenção de uma temperatura), se comparadas às argamassas com agregado natural. A literatura mostra que a utilização de agregados leves quaisquer, não apenas a argila expandida, quando substituem o agregado natural, potencializa o isolamento térmico das argamassas (LIU et al., 2018LIU, Y. et al. Development of calcium silicate-coated expanded clay based form-stable phase change materials for enhancing thermal and mechanical properties of cement-based composite. Solar Energy, v. 174, p. 24-34, aug. 2018.; PASSOS; CARASEK, 2018PASSOS, P. M.; CARASEK, H. Argamassas com resíduos para revestimento isolante térmico de parede pré-moldada de concreto. Cerâmica , v. 64, n. 372, p. 577-588, 2018.; RASHAD, 2018RASHAD, A. M. Lightweight expanded clay aggregate as a building material: an overview. Construction and Building Materials , v. 170, p. 757-775, 2018. ).

Considerações finais

Diante do exposto, pode-se identificar como principais considerações finais desta pesquisa:

  1. a massa unitária da argila expandida é três vezes menor que a massa unitária da areia natural em estudo, apresentando-se como um agregado leve e, como tal, tendendo a conferir maiores isolamentos térmicos aos elementos construtivos;

  2. a resistência à tração na flexão permaneceu praticamente constante com o aumento da incorporação de argila expandida, porém a resistência à compressão tendeu a aumentar, devido ao aumento do consumo de cimento nos traços analisados;

  3. o módulo de elasticidade dinâmico, relacionado à velocidade do pulso ultrassônico, foi afetado pela porosidade do material, sendo menor quanto maior a porosidade das misturas;

  4. a densidade de massa, tanto no estado fresco como no estado endurecido, decresceu conforme aumentou o teor de argila expandida na composição das argamassas, propiciando a diminuição da condutividade térmica e o aumento da capacidade de isolamento térmico;

  5. a redução da condutividade térmica também foi associada ao aumento no índice de vazios das misturas, conforme aumentou o teor de argila expandida nessas misturas;

  6. foram observadas três fases distintas no isolamento térmico: uma primeira fase “linear” de aumento do isolamento até os 15 minutos; uma segunda fase “não linear”, na qual o ar incorporado começa a absorver calor; e uma terceira fase, também “linear” de um pequeno decréscimo de isolamento, na qual o ar incorporado no interior da argila expandida passa a absorver calor e diminuir o isolamento térmico; e

  7. a argamassa localizada próxima à fonte de calor comanda o isolamento por um tempo de aproximadamente 50 minutos, no qual, a partir desse tempo, o tijolo passa a ser o responsável pelo isolamento do conjunto, impedindo que o calor, praticamente, atinja a argamassa oposta à fonte de calor.

Referências

  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13276: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos: determinação do índice de consistência. Rio de Janeiro, 2016a.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13278: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos - determinação da densidade de massa e do teor de ar incorporado. Rio de Janeiro, 2005a.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13279: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos: determinação da resistência à tração na flexão e à compressão. Rio de Janeiro, 2005b.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13280: argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos: determinação da densidade de massa aparente no estado endurecido. Rio de Janeiro, 2005c.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2022

Histórico

  • Recebido
    04 Jul 2021
  • Aceito
    20 Nov 2021
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