DE HORRORES E MARAVILHAS:
ASPECTOS DA INSERÇÃO DA IDADE MÉDIA NA IMPRENSA

 José Francisco Hillal Botelho 1

 

Resumo: A ideia de Idade Média na imprensa recorre, em diferentes períodos e sob diferentes formas, às imagens opostas da “Idade das Trevas” e a “Idade heroica”. Contudo, novas abordagens tornam-se possíveis pelo atual interesse que o imaginário medieval tem despertado junto ao público, transcendendo os estereótipos do fanatismo e do heroísmo.

Palavras-chave:Idade Média; Imprensa; Meios de comunicação; Imaginário; Produções culturais..

1. Considerações iniciais

A imagem do inquisidor fanático, que atormenta sua vítima com fleumática crueldade, e a do compenetrado e viril cavaleiro andante, projeção de tantas virtudes imaginadas e desejadas, são pólos binários entre os quais oscilam, num jogo de refrações e releituras, as representações da Idade Média na imprensa. Refiro-me, aqui, à imprensa do Brasil – um país que, como já escreveu certo autor gaúcho, sofre uma espécie de nostalgia por essa Idade Média que não conheceu. Nos países europeus o período medieval é uma presença de vestígios quotidianos, que assomam a cada curva da estrada, no alto de um monte ou no fundo de um outeiro – um elemento de identidade cultural, portanto; para o leitor brasileiro, contudo, a Idade Média se afigura sob o módulo do exotismo, e não da proximidade. Nas próximas páginas, tratarei de elaborar algumas reflexões, que não pretendem ser taxativas ou exaustivas, sobre as formas com que a imprensa lida com esse período, que se configura não apenas como um “Outro” temporal, mas também geográfico. Pois este é, precisamente, um dos traços importantes na difusão da Idade Média no imaginário do leitor brasileiro: o período medieval é como um vetor que aponta para o outro lado do oceano, para a Europa e o Oriente. Embora minha experiência profissional tenha-se dado em relação à imprensa brasileira, não deixarei de estender essas reflexões a “mídia” 2 ocidental de forma geral, vinculando-as também a outras formas de produção cultural, como o cinema.
A inserção da Idade Média na imprensa se dá principalmente por meio de práticas jornalísticas geralmente denominadas “jornalismo científico” ou “jornalismo de divulgação científica”. Contudo, considero que esse termo encontra-se carregado pelas polêmicas que cercam a palavra “ciência”. Sua aplicação à área das humanidades é notoriamente problemática, e não pretendo adentrar esse tremedal. Opto, portanto, pelo termos “jornalismo cultural”, “jornalismo de divulgação do conhecimento” etc.  (Mais adiante, explicitarei a diferença, que considero essencial, entre jornalismo de divulgação do conhecimento, e divulgação propriamente dita). Contudo, mesmo levando-se em conta a relação complexa das humanidades e das ciências exatas, pode-se afirmar o seguinte: quando um jornalista se dispõe a escrever uma matéria sobre algum aspecto da história medieval (entendendo a história enquanto área de conhecimento das humanidades), ele se depara com um desafio inicial que, sob certo ponto de vista, é semelhante aos problemas enfrentados por um repórter que escreve sobre novíssimas teorias da física quântica (ou outra área das ciências ditas exatas). De um lado, existe um discurso (científico, historiográfico etc.) com sua dicção própria, e suas formas de exposição particulares; de outro lado, existe um espaço (a imprensa, dirigida ao que se convenciona chamar “público leigo”) que pretende transmitir o discurso original, mas não pode fazê-lo sem ajustes e alterações. Torna-se necessária, portanto, a formulação de um novo discurso, que pretende transmitir algo da “verdade” historiográfica – ou, conforme o caso, científica – mas que, ao mesmo tempo, trata de ser inteligível e palatável a um público que não se compõe, necessariamente, em especialistas no assunto.
É por meio dessa necessária, mas problemática mudança de traços discursivos, que surgem os principais desentendimentos entre o jornalismo e a História, ou entre o jornalismo e outras áreas do conhecimento. A partir de minha experiência como repórter e redator, observei que a principal objeção de especialistas em relação a reportagens que abordam sua área de pesquisa dizem respeito à imprecisão de conceitos, à falta de espaço para explanação de questões complexas e à citação de juízos ou comentários fora de seu contexto original.
O primeiro item é, de fato, o de mais difícil solução: como explicitar a um público não-especialista, de forma direta e facilmente inteligível, conceitos complexos, que muitas vezes são objeto de extensos debates entre os especialistas no assunto? De acordo com minha experiência, a melhor forma de explicitar tais conceitos é por meio de exemplos ilustrativos que demonstrem sua aplicação prática (o que muitas vezes é um desafio, como se verá mais adiante). Também é necessário que o repórter e/ou redator não se arrogue, ele próprio, em especialista no assunto: em outras palavras, é preciso sempre alertar o leitor em relação à complexidade do tema tratado, e deixar claro que a exposição feita no texto jornalístico serve como porta de entrada a reflexões mais profundas, e não como assertiva final. Do contrário, pode-se cair em reduções simplistas que – justificadamente – levarão a sérias querelas com os verdadeiros especialistas no assunto (e com isso não pretendo sugerir que semelhantes “querelas” devam ser evitadas a qualquer custo; pelo contrário: elas podem ser até salutares). Citarei um exemplo de texto jornalístico em que a confusão ou omissão de conceitos levou a resultados que, em minha opinião, devem ser evitados: trata-se de uma resenha publicada na revista Veja, em maio de 1998, sobre as obras O limpo e o sujo, de Georges Vigarello, e História dos jovens, organizada por Giovanni Levi. O autor – Diogo Mainardi – critica os métodos na Nova História e, num certo sentido, da História Cultural, mas não explica claramente os próprios conceitos que as sustentam. Após a leitura do artigo, o hipotético leitor pode ficar com a impressão de que essas vertentes historiográficas, por simples falta de assunto, decidiram aplicar-se ao estudo de banalidades, em vez de considerar a ação dos grandes vultos que realmente mudam os rumos do mundo; os livros resenhados não passariam, em certa medida, de coletâneas de notícias “pitorescas”, relatos de “funções fisiológicas”, um “mero anedotário”, um “amontoado de trivialidades curiosas”. Isso, porque o articulista deixou de explicar uma questão conceitual importante: de acordo com as referidas vertentes, as supostas “curiosidades” não são coisas banais, mas índices potencialmente reveladores sobre a sociedade e a cultura de determinada época, tanto quanto a biografia de Napoleão ou Alexandre Magno. Afirmando que a historiografia atual prefere coletar trivialidades a estudar ideias, o articulista parece ignorar o essencial – ou seja: segundo essas vertentes, pode-se lançar nova luz sobre ideias e visões de mundo, quando se considera práticas aparentemente triviais, como os hábitos de higiene 3.
A problemática “falta de espaço” nos textos jornalísticos é um ponto em que, ironicamente, a crítica dos especialistas concorda com a angústia diuturna de muitos repórteres e redatores. Uma reportagem é, por definição, um texto mais sucinto que uma tese, uma dissertação, uma monografia ou, mesmo, um ensaio acadêmico. E, nos últimos anos, o espaço reservado ao texto propriamente dito, em veículos de jornalismo, tem encolhido consideravelmente, em benefício de elementos visuais como as ilustrações, os infográficos e o design de forma geral. Veículos de “leitura longa” – ou seja, com reportagens de quatro a dez páginas – são cada vez mais raros. E, mesmo quando a reportagem consta de diversas páginas, grande parte do espaço é atualmente ocupada por elementos gráficos 4. Nesse espaço cada vez mais exíguo, é necessário não apenas deslindar os fatos necessários à compreensão do tema, mas também explicar conceitos complexos (que poderiam ocupar volumes inteiros) e, acima de tudo, utilizar um estilo que não afugente o leitor leigo. À crescente falta de espaço nos veículos impressos, alia-se a falta de tempo, uma constante universal em praticamente qualquer redação jornalística. Numa luta permanente contra prazos urgentes, o repórter deve efetuar uma pesquisa bibliográfica considerável, contatar especialistas, contrapor diferentes vertentes e ideias, e formular tudo isso em uma narrativa que seja palatável ao público em geral.
Chegamos, por fim, ao último item citado, que muitas vezes é o mais polêmico: a citação fora de contexto. Vale considerar, aqui, que o contexto não é apenas a entrevista ou o trecho bibliográfico em questão, mas todo o universo de conhecimento de que o especialista ou o historiador dispõem. É utópica a ideia de que todo esse universo de saber possa ser transmitido em algumas páginas ou alguns parágrafos ao leitor não-especializado. Além disso, a citação é antes de tudo uma edição, uma seleção – e aí interfere não apenas a subjetividade do repórter e redator, mas também do editor e do redator-chefe do veículo. Isso põe em cheque, naturalmente, a retórica da objetividade que ainda vigora em grande parte da imprensa (voltarei ao tema mais adiante). Mas, acima de tudo, pode-se inferir simplesmente que todo texto jornalístico se constitua em uma determinada versão ou interpretação, realizada por um ou mais sujeitos, a respeito de um tema que é necessariamente muito mais vasto e complexo. Mais uma vez, o antídoto da modéstia pode amenizar os efeitos da inevitável edição de frases, trechos e opiniões: o jornalista deve deixar claro, aos leitores, que sua versão e sua interpretação não se constituem em formas definitivas, mas em convites a uma reflexão aprofundada. Em outras palavras, o jornalismo de divulgação do conhecimento deve, em minha opinião, abrir portas à cultura, em vez de oferecer uma informação supostamente pronta e acabada.
Ora, como já apontei anteriormente, toda informação, ao adentrar no labirinto da comunicação jornalística, deve conformar-se a um determinado discurso, que se estabelece entre os meios e o público. Ao apontar esse fato, não faço uma crítica necessariamente negativa. A formulação desse novo discurso é essencial para que o conhecimento – coletado junto aos especialistas no tema, ou por meio da pesquisa bibliográfica – seja posto a circular no âmbito do que se chama, comumente, “o grande público”. Logo, esse discurso intermediário torna-se ferramenta essencial à circularidade do conhecimento, um mecanismo cuja necessidade sempre vale enfatizar. Nesse ponto, é apropriado marcar a diferença entre o jornalismo de divulgação (científica, acadêmica, cultural) e a divulgação propriamente dita. Entendo por divulgação a produção de textos, por estudiosos, pesquisadores e especialistas, com o intento de disseminar suas ideias e atividades intelectuais entre outros estudiosos, pesquisadores, etc. O discurso aqui adotado é interno a determinada área de saber, e pode estar perfeitamente ajustado a suas circunstâncias e necessidades. Mas o jornalismo de divulgação funciona em um módulo distinto. Ele deve situar-se fora da esfera acadêmica, de modo a ser compreendido pela grande maioria do público, que é formada de leigos – ou seja, em nenhum momento deixa de ser jornalismo; simultaneamente, deve ser capaz de adentrar aquela esfera, e emergir dela portando informações, da forma mais exata possível (mas será possível alguma forma de “exatidão” nesse percurso? Deixo a pergunta em aberto).
Para compreender essas oscilações, aspirações e frustrações do discurso jornalístico, em sua relação com as diversas áreas do saber, parece-me útil relembrar certas reflexões de teóricos da Literatura sobre a questão discursiva. Conforme aponta Michel Foucault (2000, p.7), o sujeito do discurso – e, poderíamos acrescentar, também seu receptor – deseja um discurso transparente, que o conduza à verdade. O desejo, no entanto, é constantemente frustrado pela ordem do discurso: não é possível dizer qualquer coisa, e sobre o fluxo discursivo – ou informacional – sempre se aplica uma dose variável de controle, seleção, redistribuição. O caso do jornalismo ilustra de forma exemplar essa tensão. Ora, o âmbito do que denominamos “mídia” – o conjunto dos meios de comunicação impressos, áudio-visuais etc. – é um dos espaços em que reina, de forma mais ostensiva, a retórica da objetividade. Uma rápida observação de programas televisivos ou veículos impressos demonstrará que a ideia de uma informação neutra e transparente é um traço comum a diversos meios jornalísticos, ganhando ares de verdadeira profissão de fé, desde o mantra da “Fox News” – Fair and balanced – até a afirmação universal, contumaz entre repórteres e jornalistas de todos os tipos, de que a busca pela informação se faz com “total imparcialidade”. Enquanto jornalista, eu considero essa crença um tanto perigosa. Quando se afirma uma suposta neutralidade do discurso, o que se invoca é, implicitamente, um estatuto supremo da verdade. O jornalista coloca-se fora do discurso e, portanto, supõe-se capaz de exercer um poder único sobre ele. A informação neutra só pode coincidir com a verdade última, e quem detém a chave da neutralidade, de certo, deterá também a chave da verdade. Ora, a experiência com o trabalho em redações e com a edição de matérias demonstra que a subjetividade sempre está presente: informar é, num primeiro momento, decidir quais informações serão transmitidas, e quais serão deixadas de lado. Com isso, não sugiro que o jornalismo deveria renunciar a todo pudor e se tornar uma forma aberta de panfletagem – até porque muitos veículos existentes hoje, na “mídia” ocidental, configuram-se mais ou menos como panfletos, sem renunciar à já citada retórica da objetividade 5. O que proponho, sim, é a substituição da etiqueta da objetividade por uma ética do ceticismo. Conforme aponta Renato Lessa em Veneno Pirrônico (1995), o ceticismo renuncia à asserção dogmática de verdades monolíticas, mas não o faz para recair em um relativismo dogmático. Entre outras posturas, o ceticismo propõe um estado de permanente investigação a respeito dos fenômenos que compõem o universo. Por contraditório que pareça, é esse caráter de investigação radical, de potencial ceticamente infindável, que falta, em grande medida, a diversos veículos jornalísticos atuais. A retórica da objetividade permite um salto demasiado rápido e indolor dos fenômenos à suposta verdade que os conforma. Uma atividade jornalística baseada no ceticismo retardaria esse salto e se deteria, de forma obstinada, na investigação dos fenômenos e nas relações que estabelecem entre si.

2. Algumas reflexões sobre os discursos que abordam a Idade Média na imprensa

Considero que existam, grosso modo, dois módulos pelos quais a Idade Média se insere em textos jornalísticos da grande imprensa. 1) O tema é tratado de forma a encaixar-se em determinadas visões de mundo, supostamente compartilhadas pelo público e pelo redator; a reportagem visa, nesse caso, expandir o conhecimento do leitor dentro desses parâmetros, mas não questiona essa visão de mundo que se supõe compartilhar. 2) O tema é tratado de forma a gerar um estranhamento, uma sutil desestabilização epistemológica; ou seja, questiona-se conceitos dados como seguros, de forma que a própria visão de mundo do leitor se expanda e se problematize. Minha preferência, naturalmente, inclina-se ao segundo módulo. Mas, para compreendê-lo, é necessário explicitar o primeiro.
A partir de uma avaliação pessoal, identifico basicamente duas imagens cristalizadas da Idade Média, que ressurgem de forma recorrente em textos jornalísticos sobre o período medieval, aliando-se a ideias pré-concebidas do público leitor: a imagem obscurantista e a imagem heroica.
A imagem obscurantista relaciona-se historicamente à ideia de “Idade das Trevas”, um intervalo de breu profundo entre as luzes da Antiguidade e do Renascimento. Como se sabe, essa visão depreciativa do período foi elaborada inicialmente pelos humanistas italianos nos séculos XIV e XV. Junto à própria terminologia medium tempus ou media tempora, inventada por autores como Petrarca, surge a ideia de Idade Média enquanto hiato de barbárie, tempo de obscurantismo clerical, de declínio nas artes, de profunda decadência cultural e intelectual. Tal imagem é reforçada no século XVIII pelas diatribes iluministas. Mas é exatamente o furor destrutivo da Revolução Francesa, alimentada em certa medida pelos vitupérios voltaireanos, que desencadeia “a idade de ouro da Idade Média”, no seio do romantismo do século XIX. Após a tempestade revolucionária, que atingiu o patrimônio arquitetônico e escrito, os românticos voltam-se à Idade Média como numa busca por um tempo perdido. Das profundezas medievais, emergem virtudes que se cristalizarão na figura do Herói, com seu papel de unificação nacional e de fundação identitária. (AMALVI, 2002, p.537-539).
Quando um jornalista se dispõe a escrever um artigo ou matéria sobre temas que envolvam o período medieval, ele terá de se haver, como puder, com esses dois pólos. Mesmo levando em conta os estudos e as pesquisas da Nova História, que questionam simultaneamente os clichês românticos e a “legenda negra” elaborada pelos humanistas italianos e pelos iluministas, constata-se que a imagem mais popularizada da Idade Média, em meio ao público leitor, remonta ainda à visão obscurantista ou à visão heroica. Nesse aspecto, as diferentes abordagens jornalísticas se relacionam às imagens da Idade Média propagadas pelas novas “mídias” ao longo do último século – em especial, o cinema. É interessante notar, por exemplo, que o filme Alexander Nevsky, dirigido por Serguei Eisenstein em 1938, bebe simultaneamente em ambas as fontes. Produzido como peça de propaganda do regime stalinista, e como diatribe contra a ameaça germânica, o filme de Eisenstein utiliza a imagem do herói medieval ao retratar o belicoso e viril Nevsky, que funciona como mito fundador e galvanizador do sentimento nacionalista; já os Cavaleiros Teutônicos, que invadem a Rússia e são derrotados por Nevsky em uma cena antológica, parecem emergir das profundezas daquela “Idade das Trevas” bárbara e fanática. É interessante notar que o mesmo mecanismo ressurge em um filme menos conhecido no Brasil, mas igualmente significativo: Os Cavaleiros Teutônicos, dirigido por Alexander Ford em 1960. Espécie de epopéia nacional polonesa, o filme narra a invasão do país pelos cavaleiros da Ordem Teutônica e a posterior derrota destes em uma memorável batalha campal. Nas figuras opostas do líder dos Cavaleiros Teutônicos e de sua nêmese, o rei polonês Ladislaus Jagiello, cristalizam-se respectivamente as imagens do vilão e do herói medievais.
Vale notar, de passagem, que a justaposição de um discurso claramente moderno em narrativas situadas no período medieval é um elemento recorrente em filmes holywoodianos. Na década de 1950, em plena Guerra Fria, a trilogia medieval dirigida por Richard Thorpe – Ivanhoé, de 1952, Os cavaleiros da Távola Redonda, de 1954, e Quentin Durward, de 1955 – celebra os valores de uma América triunfalista em face ao Império Soviético: individualismo empreendedor, defesa da liberdade, tolerância religiosa etc. (AMALVI, 2002, p.544). Essa imagem heroica, que como se vê, pode tornar-se útil nos mais diversos contextos, ganhou novo verniz na produção Cruzada, dirigida por Ridley Scott em 2006. Na tentativa de representar os cavaleiros medievais e seus adversários, os guerreiros sarracenos, como personagens heroicos, com os quais as plateias possam se identificar facilmente, o diretor Ridley Scott e o roteirista William Monahan optaram por apresentar os protagonistas do filme como espécies de humanistas seculares. A julgar pelo roteiro, a religião pouco teve a ver com a invasão do Oriente Médio por tropas europeias. Alguns cavaleiros cristãos rumam a Jerusalém por simples ambição e crueldade – esses são os vilões – enquanto outros para lá se dirigem com objetivos mais vagos e pouco definidos, mas claramente altruístas e laicos – esses são os heróis. Tal mecanismo torna-se evidente se observarmos o personagem do Cavaleiro Hospitalário, interpretado por David Thewllis. Embora seja membro de uma ordem ligada à Igreja, trata-se de uma figura claramente não-confessional, um tipo de filósofo iluminista anacrônico, que considera a “ação correta” muito mais importante que as diferenças entre doutrinas religiosas.
Vale à pena, aqui, inserir uma pequena digressão sobre a questão dos “filmes históricos”, ou seja, obras cinematográficas que tratam de explorar determinada época da História em sua narrativa – a final de contas, muitas das representações elaboradas por essas produções culturais acabam influenciando os textos jornalísticos. Identifico duas vertentes básicas, no que diz respeito a obras áudio-visuais que abordem determinados períodos históricos. A primeira vertente inclui roteiros e filmes que se esforçam por aproximar emocionalmente as audiências à época retratada, de modo que a identificação com os personagens ocorra de forma rápida e fácil. A maior parte das produções holywoodianas segue essa linha. Abundam, em obras dessa estirpe, aparições de conceitos morais próprios à modernidade na boca de senadores romanos, monarcas medievais, profetas bíblicos e conquistadores ibéricos. Como exemplo, cito o personagem interpretado por James Mason em A queda do império romano, de 1964: o senador romano Timônides, cujas ideias e até o modo de expressar-se lembram imensamente algum político norte-americano do Partido Democrata. A segunda vertente à qual me refiro constitui-se de filmes e roteiros que tratam, precisamente, de gerar um estranhamento entre os espectadores e o “mundo ficcional” retratado. A título de ilustração, poderíamos lembrar não exatamente de um filme, mas de um seriado televisivo: Roma, produzido pela HBO em 2005. Os roteiristas da série tentaram evitar, assumidamente, a aplicação de uma moralidade moderna ou pós-moderna à narrativa, que acompanha a vida e a morte de personagens (históricos ou fictícios) na Roma de Júlio César e Cícero. Uma das grandes qualidades da produção reside, precisamente, no contraste proposital entre a ética dos personagens e a ética do mundo ocidental dos séculos XX e XXI. A série não tem pudores em mostrar que os protagonistas – dois soldados da Décima Terceira Legião – massacram civis e traficam escravos. Ainda assim, não são retratados como vilões, e tampouco como criaturas amorais. Compreender a lógica que rege as ações desses personagens é um interessante desafio que o roteiro apresenta aos espectadores, afastando a obra, portanto, da tendência “domesticadora” dos filmes de Holywood. Embora os filmes incluídos na vertente do “estranhamento” sejam menos abundantes, não nos faltarão exemplos referentes ao período medieval. Cito dois exemplos: O leão no inverno, de 1968, e Becket, de 1964. Ambos tratam do reinado de Henrique II Plantageneta (o qual, em ambos os filmes, é interpretado por Peter O’Toole). No primeiro caso, um mosaico de intrigas familiares apresenta o retrato de uma forma de moralidade que, pelo contraste do estranhamento, leva o espectador a refletir sobre as suas próprias concepções. O segundo filme traça um interessante conflito entre o poder e a religiosidade, por meio da figura de Thomas Becket, interpretado por Richard Burton. Aqui, a religiosidade medieval é apresentada sem o recurso a imagens pré-concebidas: abre-se um lapso, portanto, entre os dados culturais do espectador e a lógica interna do mundo ficcional, e também entre as representações do filme e as ideias pré-concebidas de Idade Média.
Reitero: não trato, aqui, de determinar qual tipo de representação da Idade Média é mais apropriada ou – para usar um termo especialmente questionável – “fiel”. Poderíamos dizer, de certa forma, que esse conceito de “fidelidade” é uma utopia. Diversos teóricos da literatura chegaram a essa conclusão ao refletir sobre a tradução literária ou inter-semiótica. Para muitos autores, sempre há algo que se perde e que se ganha na transposição de um elemento, de uma ideia ou de uma narrativa entre dois sistemas lingüísticos – a tradução de um livro, de uma língua para outra – ou entre dois sistemas simbólicos – a adaptação de obras literárias para o cinema, por exemplo. Da mesma forma, sob uma perspectiva da teoria da literatura, a “fidelidade” absoluta na recriação ou na representação de um período histórico, por um autor situado em um período diferente, é um objetivo inalcançável. O que se procura, portanto, não é tanto uma recriação fiel, mas – para utilizar outro termo caro às teorias da tradução – uma transcriação. Como exemplo, pode-se citar o filme Excalibur, dirigido por John Boorman em 1981. A obra não tenta recriar o ambiente histórico em que o “verdadeiro” rei Artur poderia ter vivido – a Bretanha dos séculos V e VI –; em vez disso, faz uma transcriação da lenda, explorando um imaginário constituído por textos de diversas épocas, como a obra escrita por Sir Thomas Malory no século XV (A Morte de Artur, publicada pela primeira vez em 1485) e os poemas vitorianos de Alfred Lord Tennyson, escritos no século XIX.
Embora o cinema holywoodiano ocupe-se de manter viva a imagem heroica da Idade Média, percebe-se que a imagem obscurantista vem ganhando força em alguns setores da imprensa. Isso se deve, em parte, à crescente influência do que Karen Armstrong define como “fundamentalismo secular”. Segundo a autora, existe “uma forma de ‘fundamentalismo secular’ tão fanática, tendenciosa e inexata em relação à religião quanto qualquer fundamentalismo baseado na Bíblia em relação ao secularismo”. (ARMSTRONG, 2007, p.221). Após os atentados às Torres Gêmeas em 2001, o alvo favorito desse tipo de discurso tem sido preferencialmente o Islã. É curioso notar que, nos meios de comunicação dos Estados Unidos, o discurso do “fundamentalismo secular” muitas vezes se vê comodamente aliado a certas tendências da extrema-direita evangélica. Vale notar, por exemplo, o apoio apaixonado do escritor, jornalista e crítico literário Cristopher Hitchens às políticas do governo de George W. Bush. Representante do ateísmo militante, Hitchens é autor do livro God is not great: How religion poisons everything, onde critica de forma virulenta as três religiões abraâmicas. Ora, é no mínimo surpreendente constatar que um autor tão crítico a toda forma de monoteísmo tenha-se transformado, ao longo dos últimos sete anos, em um defensor de Bush – que, por sua vez, é apoiado fortemente pelos fundamentalistas do “Bible Belt” estadunidense. Tal estranheza ganha contornos mais claros quando se nota que, em seus textos jornalísticos, Hitchens prefere concentrar-se na crítica aos países e à fé islâmica, fundamentando dessa forma seu apoio à invasão do Iraque e outras ações do governo Bush. No Brasil, os textos de Christopher Hitchens têm sido publicados regularmente pela revista Época.
Mas de que forma tudo isso se relaciona à difusão da Idade Média na “mídia”? Ora, basta lembrar que, segundo a “legenda negra”, a Idade Média é o período da fé cega e do fanatismo clerical, o momento em que o Cristianismo sufocou a Europa enquanto o Islã dominava o Oriente Médio. Nesse contexto, há casos em que a Idade Média é referida como exemplo de uma religiosidade assustadora, um grande “Outro” ameaçador, confusamente relacionado ao estereótipo do “terrorista fundamentalista”, pronto a explodir o mundo ordenado da democracia liberal. O mundo islâmico, em muitos casos, é visto como uma espécie de universo medieval em pleno século XXI. (AMALVI, 2002, p.547). Mas é bom esclarecer: nesses casos, o discurso jornalístico não dispara sua metralha apenas contra o Islã, mas também contra o próprio Cristianismo medieval, apresentado muitas vezes sob as cores mais negras possíveis. É fácil perceber, nos últimos anos, uma proliferação de reportagens sobre os aspectos negativos da religiosidade medieval – inquisições, cruzadas religiosas, crimes e escândalos papais etc. Nota-se, também, em alguns veículos, uma contraposição simplista entre Ciência e Religião – estando a Idade Média, é claro, estigmatizada como o período em que a razão científica foi ofuscada pelo dogmatismo religioso. Nesses casos, é um verdadeiro desafio demonstrar ao público leitor que muitos dos desenvolvimentos científicos que levaram ao mundo moderno surgiram no interior dos universos religiosos do Cristianismo e do Islã.
Esses traços discursivos surgem até mesmo em textos jornalísticos que não abordam diretamente a história medieval. Exemplo produtivo encontra-se em uma resenha assinada por Isabela Boscov, sobre o filme A Paixão de Cristo, dirigido por Mel Gibson em 2004. Publicada na revista Veja, a resenha aponta negativamente o excesso de violência da obra, compara-a aos “péssimos filmes bíblicos italianos que rodavam na década de 50” e aponta o uso ostensivo de clichês cinematográficos. A crítica mais contundente, no entanto, aparece apenas no penúltimo parágrafo. Vale citá-lo de forma mais ou menos extensiva:

 
Os outros problemas de A Paixão se situam num terreno mais subjetivo, mas bem mais relevante. A fixação com a Paixão de Cristo é, em termos literais, medieval. Nos séculos mais recentes, a produção teológica cristã em geral e a católica em particular têm procurado voltar a atenção dos fiéis mais para a pregação de Jesus do que para o seu calvário. O sacrifício de Jesus deve ser entendido à luz de seus ensinamentos, e não o contrário. A Paixão e a Ressurreição seriam a confirmação da divindade de Cristo. Mas sua pregação e a revolução ética que ela instaurou é que são os verdadeiros pontos de união entre os cristãos e, possivelmente, entre cristãos, membros de outras religiões e mesmo ateus 6.

A partir desse trecho torna-se claro que, na opinião da resenhista, o principal defeito do filme estaria na representação de uma teologia supostamente medieval. Não pretendo, aqui, exibir qualquer comentário pessoal a respeito da qualidade do filme em questão; interessa-me, apenas, apontar o uso do termo “medieval” como claramente pejorativo. E mais: é remontando à Idade Média que o texto erige a imagem de uma religiosidade primitiva e violenta.
Os índices de um discurso surgem inclusive em seus lapsos – as paralaxes, as discretas mudanças de perspectiva ou, em última instância, os erros não-intencionais que, de alguma forma, aparam as arestas do discurso. A respeito disso, vale citar outra resenha, publicada no mesmo veículo e assinada pela mesma jornalista. O texto trata (positivamente) da obra Cruzada. Em um par de parágrafos dedicados a Saladino, informa-se que este personagem foi “um sultão não muito devoto” 7. Ora, tal afirmação me parece especialmente reveladora, pois, de acordo com obras como As cruzadas vista pelos árabes, o sultão Saladino era tão devoto quanto a maioria dos líderes de sua época. A que serve, portanto, esse pequeno deslize, certamente involuntário, que o texto nos oferece? Por que, enfim, a suposta falta de devoção do herói islâmico se encaixa tão perfeitamente ao tom geral da resenha publicada por Veja? Ora, acontece que, para aproximar os heróis de Cruzada às audiências, foi necessário amenizar-lhes exatamente o fator que poderia gerar aquele estranhamento, aquela distância que se interpõe entre o mundo do espectador e o mundo do filme: a religiosidade, e o papel que a religiosidade poderia exercer no estabelecimento de códigos de comportamento distintos.
Conforme já indiquei, a explanação de conceitos teóricos da historiografia é muitas vezes um desafio à parte. Cito um exemplo bastante ilustrativo: o conceito de “longa duração” de Braudel. Na mente da maioria dos leitores, está profundamente entranhada a ideia da História humana enquanto algo compartimentado, conforme a formulação de Cellarius, com a Idade Média interpolada entre a Antiga e a Moderna. Como explicar ao leitor leigo, em uma reportagem sobre a Idade Média, que, de certa forma, “a Idade Média não existe”? (AMALVI, 2002, p.537).
Se a imagem obscurantista e o clichê heroico da Idade Média retornam de forma contumaz, seguindo de perto as necessidades e tonalidades discursivas de cada época, também vale lembrar que a própria cultura de massas ofereceu e ainda oferece um antídoto e uma escapatória a esse reducionismo. Em 1982, o romance O nome da rosa, do semiólogo e medievalista Umberto Eco, tornou-se um verdadeiro fenômeno global, vendendo mais de 11 milhões de exemplares em todo mundo. O romance foi seguido de perto pela adaptação cinematográfica, dirigida em 1986 por Jean-Jacques Annaud. Conforme aponta Christian Amalvi (2002, p.549), o romance efetua uma “síntese entre a ressurreição romântica da Idade Média, tal como fizera Victor Hugo em Notre-Dame de Paris, e a tentativa da percepção global da sociedade medieval operada pela escola dos Annales cerca de trinta anos antes”. A obra de Eco representou uma retomada de interesse no imaginário medieval – tendência que se aprofundou em outro romance do mesmo autor, Baudolino, publicado em 2000. O caso de O nome da rosa, surpreendente sucesso de crítica e público, não representou um fato isolado, mas integrou uma série de novas produções culturais que realizaram, ao longo das décadas seguintes, abordagens frescas e inovadoras da Idade Média, na literatura, no cinema, na música popular e até na ópera. (AMALVI, 2002, p.544-545). Se, no período romântico, o recurso à Idade Média era uma empreitada poética que muitas vezes excluía a pesquisa histórica, essas novas produções culturais caracterizaram-se, com freqüência, por uma obstinada atenção à letra da História. É o caso, inclusive, de histórias em quadrinhos, como a série Le Tours de Bois-Maury, do desenhista belga Hermann Hupper, em que se nota a preocupação em recriar, de forma coerente, certos aspectos da “vida privada” na Europa do século XI. Mas a “fidelidade” histórica, conforme expus anteriormente, nem sempre é condição sine qua non à qualidade estética. Filmes como o já citado Excalibur valeram-se da nova onda de interesse no período medieval para efetuar suas próprias releituras. O filme de John Boorman não se configura enquanto uma recriação de época, mas sim como uma reflexão sobre a própria difusão da ideia de Idade Média: a obra apresenta um mosaico visual de um imaginário específico, relacionado não apenas a Thomas Malory e Lorde Tennyson, mas também ao movimento artístico dos pré-rafaelitas, no século XIX.
É bem verdade que nem todas essas produções culturais apresentam a mesma profundidade cultural ou relevância estética das obras citadas acima. O recente sucesso de livros como O código Da Vinci, que envolve a lenda do Graal numa embalagem de puro kitsch policialesco, é prova disso. Ainda assim, a própria existência de best-sellers como os de Dan Brown é um sintoma de que o interesse pelo imaginário medieval continua vívido.  Com isso, abriu-se caminho para um verdadeiro filão jornalístico que, na medida do possível, afasta-se dos clichês cristalizados, e instiga a sensação de estranhamento em relação a esse “Outro” que é o passado medieval. A par da imagem obscurantista que se alimenta do discurso anti-religioso, e da imagem heroica que sobrevive principalmente no cinema, a Idade Média atrai a atenção de grande parcela do público leitor enquanto berço de um imaginário fascinante, que transcende o estereótipo do inquisidor fanático e do nobre cavaleiro andante. Essa “nova Idade Média”, que muitos leitores vão pouco a pouco descobrindo, é a intrigante época dos relatos de mirabilia, dos romances de Chrétien de Troyes e Robert de Boron, da hagiografia fabulosa da Legenda Áurea, das grandes peregrinações de Marco Polo e Ibn Batuta, das miscelâneas culturais de El Andaluz, da epopéia das catedrais góticas e das geografias mirabolantes que preenchiam o mundo desconhecido com reinos opulentos e criaturas extraordinárias. É pelo viés do estranhamento que as imagens tradicionais da Idade Média podem ser questionadas, de modo que a curiosidade do público se estenda para além da página do jornal ou da revista, e chegue, quem sabem, a novas releituras nas páginas dos livros e nos debates entre pesquisadores.

 

Of horrors and wonders:  Some commentaries on the insertion of the Middle Ages in brazilian press.

Abstract:The Idea of Middle Ages in the press recurs, in different times and in different ways, to the opposite images of the “Dark Ages” and the “Heroic Ages”. Nowadays, however, the medieval imaginary has aroused the public with a renewed interest, bringing out the possibility of new approaches that may transcend the stereotypes of fanatism and heroism..

Keywords:Middle Ages. Press. Mass media. Imaginary. Cultural productions.

 

1 Mestre em Literatura Comparada (UFRGS). Bacharel em Jornalismo (PUCRS). Email: jfranciscobotelho@yahoo.com.br

2 Confesso que o termo “mídia” me desagrada pessoalmente. Afinal de contas, trata-se simplesmente da pronúncia inglesa do latim media. No entanto, sendo esse termo de uso corrente, resolvi mantê-lo no texto, mas entre aspas, em vez de recorrer constantemente ao sinônimo mais extenso, “meios de comunicação”.

3 MAINARDI, Diogo. Sem banho e sem idéias. Revista Veja, 8 maio 1996.

4 Existem exceções, é claro. A revista Piauí, por exemplo, é um veículo que privilegia abertamente o texto em detrimento dos elementos de design.

5 O caso da Fox News me parece exemplar. O refrão Fair and balanced information não a impediu de militar, de forma nada discreta, em favor das políticas do governo de George W. Bush. Nesse caso, poderíamos dizer que a retórica da objetividade pode servir como ferramenta de panfleto.

6 BOSCOV, Isabela. Um novo velho mundo. Revista Veja, 4 maio 2005.

7 BOSCOV, Isabela. Um Jesus nada cristão. Revista Veja, 17 mar. 2004.

 

Referências:

AMALVI, Christian. Idade Média. In: LE GOFF, Jacques; SCHMIDT, Jean-Claude. Dicionário temático do Ocidente medieval. São Paulo: Edusc, 2002.

ARMSTRONG, Karen. A Bíblia: uma biografia. Rio de Janeiro: Zahar, 2007.

FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Edições Loyola, 2000.

LESSA, Renato. Veneno pirrônico. Rio de Janeiro: Francisco Alves Editora, 1995.

 

Sítios virtuais consultados:

www.allmovie.com (Acesso em: 18 maio 2009).