Break comercial:

pequenas histórias do cotidiano narrativas publicitárias

na cultura da mídia [1]


Márcia Coelho Flausino
Luiz G. Motta


1 Tempos de publicidade: o presente e o futuro
2 Perguntas e respostas possíveis
3 O Suporte teórico-metodológico
Notas
Referências

RESUMO
Neste artigo discute-se o discurso publicitário como uma das narrativas do homem em seu cotidiano, inserido numa cultura da mídia. Como suporte teórico-metodológico será utilizada a narratologia. A hipótese de trabalho é de que a narrativa publicitária constrói efeitos de real e outros efeitos de sentido (a comoção, a alegria, o prazer, a satisfação, a ironia, etc.) que se realizam na articulação entre o que é veiculado e as expectativas, identificações e compreensão dos receptores. Verificando-se as lacunas e hiatos negociados na leitura das mensagens publicitárias, por natureza fragmentada, serão checados o contrato entre telespectador e autor em andamento, como o texto é levado à consciência do público-alvo e a interação entre o que é e o que não é dito.
PALAVRAS-CHAVE: Publicidade. Narrativa. Cultura da mídia. Cotidiano.


“A diferença entre a verdade e a ficção é que a ficção faz mais sentido.”
Mark Twain


A vida cotidiana é a vida de todo ser inserido na cultura ou no “mundo da vida”, como afirmam alguns antropólogos. Esse espaço ritualístico comum onde nos movemos cotidianamente, onde vivemos e realizamos nossas experiências práticas, éticas e estéticas regularmente, onde experimentamos continuamente o mundo em que vivemos. Somos absorvidos pela cotidianidade e dela não podemos nos desligar. Para Agnes Heller (1970 p. 17-18):


A vida cotidiana é a vida do homem inteiro; ou seja, o homem participa na vida cotidiana com todos os aspectos de sua individualidade, de sua personalidade. Nela, colocam-se “em funcionamento” todos os seus sentidos, todas as suas capacidades intelectuais, suas habilidades manipulativas, seus sentimentos, paixões, idéias, ideologias.

Alfred Schutz e Thomas Luckman (2001) vão mais além. Para eles, a vida cotidiana é a realidade fundamental e eminente do homem. É o âmbito da realidade que está pressuposto no senso comum, que experimentamos como inquestionável. Um mundo social e cultural familiar que cada um de nós supõe ordenado e coerente, compartido e intersubjetivo, e que nos permite atuar e conviver com nossos semelhantes. Um mundo pleno de sentidos e modelos, que modificamos mediante nossos atos e que também condiciona e redireciona nossas ações (SCHUTZ; LUCKMAN, 2001).

O discurso publicitário está entranhado na vida cotidiana. Forma de expressão do homem na sua cotidianidade, o discurso publicitário coloca em evidência estereótipos, modelos, representações, identidades. Mostra também desejos, necessidades, criadas ou não por questões mercadológicas, relacionadas ao consumo e à inserção do homem na sociedade. Ratifica divisões sociais, comportamentos, valores e regras de convívio em grupo. Não é o discurso da transgressão, é o da conciliação entre uma sociedade calcada no ter e o desejo de ser, sempre mais, a partir desse possuir em busca de pertencimento. Em nossa cotidianidade, sentir-se diferente dos demais, em destaque, entra em contradição/consenso com linhas de produção em série de produtos padronizados. A tentativa de ser diferente na semelhança. O discurso publicitário é instrumento e resultado desse esforço conciliatório e se mostra eficiente quando leva ao consumo, seja de um conceito/marca, um estilo de vida traduzido num produto ou serviço.

Curiosamente, podemos observar que o público-alvo de algumas campanhas (e mesmo o que não é considerado como tal) consome não o produto ou estilo de vida, mas a narrativa que serve de suporte para a indução à compra. Ora um personagem ganha tanto ou maior destaque que o produto (case famoso do ator Carlos Moreno e do Bombril), ora é um bordão ou “moral da história” (case Lei de Gerson: “Gosto de levar vantagem em tudo. Certo?”) ou a trama que serve de linha de criação para a campanha (Margarina Qualy) e a história do menino que deseja arranjar uma namorada para o pai, que aconteceu em capítulos, ganham mais espaço. E esta é a problematização que norteia este trabalho: o discurso publicitário visto como uma narrativa do cotidiano. Mais que um suporte de vendas ou informação ao público, tomar o discurso publicitário como forma ontológica de o homem contemporâneo narrar sua experiência e interpretação do mundo.


1 Tempos de publicidade: o presente e o futuro

O futuro é o momento economicamente desejado e sempre mencionado ou sugerido. De acordo com Everardo Rocha (1995), muitas vezes, no mundo dos anúncios, se fala em “evolução”, “novo”, “futuro”, “amanhã” etc. No entanto, esses termos se referem a produtos que já se encontram à disposição do consumidor. Mesmo o que se refere ao passado, às memórias, no discurso se vincula ao presente. O futuro se presentifica. O presente se eterniza.

Narrativa cravada na cultura da mídia (KELLNER , 2001), a publicidade nos fala sobre o que pensamos ser a felicidade, o bem-estar, o prazer, o sucesso, o cotidiano – seus modos ideais de fruição, nossos horizontes de compreensão da realidade. Ela nos conta sobre nossos estilos de vida idealizados, nossos padrões de beleza e conduta, nossa percepção do mundo ideal, onde todos vendem, todos consomem e são felizes por isso.

Uma das principais características do discurso publicitário, e que marca também suas formas de apreensão, é a explicitação de seu objetivo: fomentar o consumo. O discurso publicitário é persuasivo, busca o convencimento. Tem caráter ideológico, subjetivo, busca atingir a vontade e o sentimento do receptor, busca sua adesão. Persuadir se encontra no domínio do emotivo (CARRASCOZA, 1999). Trata-se de um discurso regido por um conjunto de normas calcadas na retórica, aqui entendida como fonte de elementos amplificadores de sua força argumentativa. De acordo com Everardo Rocha (1995 p. 25-26):


No capítulo III de sua Arte retórica, Aristóteles afirma que existem três gêneros da retórica: o deliberativo, o judiciário e o demonstrativo, ou epidítico.

No gênero deliberativo, aconselha-se ou desaconselha-se sobre uma questão de interesse particular ou público. O judiciário comporta a acusação e a defesa. O demonstrativo abrange o elogio e a censura. E cada um deles tem por objetivo uma parte do tempo que lhe é próprio: Deliberativo – futuro – delibera aconselhando para uma ação futura.(ROCHA,1995, p.25-26)

Conforme essa classificação, o texto publicitário tem dominância deliberativa. Aconselha o receptor a julgar favoravelmente um produto/serviço ou marca no instante da recepção para gerar vendas no futuro.Trabalha-se, então, dentro de duas temporalidades que se imbricam e determinam o impacto que esses discursos podem gerar.

A construção dos horizontes de compreensão, dos mundos possíveis da publicidade se dá de forma estratégica, é fruto de uma cuidadosa elaboração cujas palavras e significados são escolhidos de forma consciente já que o uso de determinados termos pode criar diferentes reações emotivas no receptor. A narrativa publicitária, imperativa, está centrada no receptor, no seu mundo da vida, com o objetivo de criar intimidade, simula uma espécie de diálogo que traz implícito um “você”. A proximidade é marcada por um tom coloquial, em busca de uma possível identificação de quem fala com quem entra em contato com a mensagem. Isto se faz necessário para dissimular o caráter serializado dos produtos à venda. A narrativa publicitária glamouriza o produto/marca/serviço, garante a fuga da desumanização, dá ao receptor a ilusão da identidade apesar da massificação.


[...] o consumo pode ser visto como operador, gerenciando a distribuição de valores (sensualidade, poder, saber, bom gosto, cultura, sofisticação, beleza e outros tantos) que classificam e posicionam grupos e objetos no interior da ordem social.

A publicidade – enquanto narrativa do consumo - estabelece uma cumplicidade entre a esfera da produção com sua serialidade, impessoalidade e seqüencialidade e a esfera do consumo com sua emotividade, significação e humanidade. [...] Ela é o território do simbólico (ROCHA, 1995, p. 154).

Porque são relatos da vida contemporânea, as narrativas publicitárias são imediatamente reconhecidas pela audiência como histórias possíveis. O cerne dessas narrativas são as imagens de felicidade, de prazer, de bem-estar, de sucesso. Estes são os núcleos nos quais se organizam as ações que vão levar ao consumo. Talvez por isso seja mais fácil conseguir solidariedade para as mensagens mostradas. Mesmo que a narrativa comece com a apresentação de um conflito/situação problema a ser resolvida, o produto/serviço/marca encarregar-se-á de restabelecer a ordem, reorganizando a realidade, trazendo de volta o equilíbrio. Não há na publicidade histórias sem finais felizes, ao contrário, por exemplo, do jornalismo. Aqui reside a magia da publicidade: todo o possível e o impossível se realizam para levar o público –alvo à felicidade, ainda que simulada.


2 Perguntas e respostas possíveis

O que contam sobre nós os comerciais de TV? Como e a partir de que categorias nos são narradas nossas histórias cotidianas? Como nossa memória é construída a partir dessas narrativas de “nossas vidas cor de rosa”? Como se processa o jogo fruição/consumo das peças publicitárias?

Nossas lembranças desses comerciais passam a integrar um verdadeiro arsenal de imagens e sons que nos trazem muito do que somos, de como representamos nosso mundo e nossa cultura. Como somos capazes de trabalhar esses fragmentados discursos e preencher as lacunas por eles deixadas com nossas experiências de vida, transformamos em arquivos pessoais de nossa memória individual, mas também coletiva.

São diversas as perguntas a responder. Não tencionamos realizar esta tarefa neste artigo, primeiro passo de uma pesquisa que se pretende de maior fôlego e que tem como principal caminho verificar como a publicidade se constitui numa das narrativas do homem contemporâneo. No começo do caminho, vamos buscar as respostas, em primeiro plano, nos modos de constituição de um dispositivo teórico-metodológico cuja démarche é a narratologia, capaz de analisar, dentro do espectro da cultura da mídia.

Definimos, então, num segundo momento, a ser trilhado no desenvolvimento do projeto maior da pesquisa, que o objeto é a narrativa publicitária e a experiência estética de sua fruição, quando acontece a produção de sentidos com a fusão de horizontes de expectativas (as do texto com aquelas do receptor e seus imaginários).

É importante que se diga: a fruição do discurso publicitário nada tem a ver com a obrigatoriedade da aquisição de um determinado produto. Estaremos vendo esses discursos como narrativas às quais temos acesso, seja na televisão, seja em material impresso, como acesso a mundos possíveis. Estaremos vendo que elementos fazem parte da construção discursiva de horizontes de compreensão de nosso cotidiano, nossa realidade e a fusão com os horizontes da audiência. Como os elementos de nossa cultura são alinhavados em histórias curtas, mas densas e ricas em simbolismos.

O discurso publicitário direcionado à mídia eletrônica se faz com a utilização de diversos recursos narrativos, dentre os quais mencionamos a linguagem de vídeo (os enquadramentos, movimentos de câmera, edição, uso da cor, gestual, etc.). Assinalamos também a analepse ou flashbacks (personagens dos comerciais se lembram de acontecimentos que o lançam a buscar a solução em determinado produto/serviço/marca, por exemplo); a hipérbole/exagero, a onomatopéia, a aliteração, a metáfora, a metonímia, entre outras figuras de linguagem; recursos fonéticos, sons característicos (sibilância, etc), efeitos sonoros; recursos léxico-semânticos como criar novos termos, construir e modificar palavras, usar termos conotativa e denotativamente; entre outros. É preciso saber como e quais recursos são usados com o objetivo de facilitar o trabalho do receptor de identificar conexões e relações de solidariedade com sua experiência de vida, articulando e construindo uma visão de mundo na qual seu consumo faz sentido. E ainda uma visão de mundo apaziguadora de que o mundo faz sentido e nele, com suas relações calcadas nas narrativas, se pode ser feliz e obter bem-estar. A não existência de conflitos tranqüiliza.

No discurso publicitário, campanhas de varejo são consideradas as mais objetivas, sem a necessidade de grandes vôos criativos para levar à compra, sendo a oferta seu modo mais comum – é produto/preço. Assim, devemos verificar como os recursos narrativos funcionam na descrição de personagens, criados para conseguir identificação e adesão imediata, permitindo à audiência a construção de duplos sentidos e pressuposições, preenchendo as lacunas com suas experiências de vida. Esta subjetivação do discurso é mola mestra dessas mensagens.

Desejamos entender como funciona essa espécie de contrato cognitivo, entre receptor e emissor, já que a audiência tem consciência de que “nem tudo é verdade”, no mundo dos comerciais, mas “acredita” que aquele pode ser um mundo possível.

Nossa hipótese de trabalho é de que a narrativa publicitária constrói efeitos de real e outros efeitos de sentido (a comoção, a alegria, o prazer, a satisfação, a ironia, etc.) que se realizam na articulação entre o que é veiculado e as expectativas, identificações e compreensão dos receptores. Reconhecer o que acontece é uma condição de existência da fruição dessa narrativa.

Procuraremos verificar como a reconfiguração das narrativas integrais pelos receptores a partir de peças publicitárias fragmentadas podem remetê-los a operações de memória (lembranças) e de imaginação, às experiências cognitivas semelhantes àquelas da experiência ficcional. Isto faz com que a fruição dessas peças seja uma experiência imaginativa e criadora, possibilitada pela identificação com os personagens, que podem assumir tanto o papel de heróis como o de “pessoas comuns como você e eu”. Estereótipos, representações, memória coletiva e memória individual entram nesse jogo.

Ratificamos, então, como hipótese de pesquisa: é o receptor que realiza o encadeamento narrativo. Pelas suas próprias condições de produção e veiculação – as limitações de tempo, na televisão, de espaço nos jornais e revistas – os discursos são curtos, mas precisam ser coerentes. No ato da recepção, o sujeito realiza cognitivamente o encadeamento narrativo integral preenchendo as lacunas de significação, estabelecendo referencialidades, reconfigurando histórias para a obtenção de identificação, realizando a fruição e a fusão de horizontes de expectativas.

Expliquemos: paradoxo, limite entre o ser e o mundo, o horizonte de expectativas é sempre dinâmico, é o limiar da nossa existência. Na comunicação da mensagem, brota um complexo semântico e nele se apóia com múltiplos vínculos, explícitos ou não. A este complexo chamamos horizonte do texto. Na compreensão de um texto entram em contato os horizontes do autor e o do leitor. Nesse contato dialógico, o que se busca, na verdade, não é um submeter ao outro, mas, sim, uma fusão de horizontes, uma realização semântica de horizontes comuns.

Diz H. R. Jauss (1987 p. 69):


El acto constitutivo del proceso total de recepción es la recepción de estruturas, esquemas o señales que orientan previamente, em cuyo marco de referencia es percebido el contenido Del texto y esperada la realización de su significado. Em este acto bosqueja el lector, que sigue esas inbdicaciones, el horizonte de expectativas implicado pro el texto.

A maneira como se diz, explica-se ou se seduz faz parte da mensagem. A experiência da fusão de horizontes vai muito além do conhecimento do telespectador/público-alvo, é uma experiência vivida, global, não reduzível ao individual.


3 O Suporte teórico-metodológico

Esta pesquisa se concentra no espaço da cultura da mídia. Para Kellner (2001), há uma cultura veiculada cujas imagens, sons e espetáculos ajudam a urdir o tecido da vida cotidiana, dominando o tempo do lazer, modelando opiniões políticas e comportamentos sociais e fornece material para que as pessoas forjem suas identidades. Assim, além dos meios mais conhecidos – jornais, revistas, televisão, cinema, etc –, a publicidade integra essa cultura, propaga seus valores, incita seu consumo. É um dos discursos valorativos que provêm a sociedade de elementos para a construção do senso de classe, de modelos, de etnia e raça, de nacionalidade, de sexualidade, de “nós” e “eles”, do que significa ser homem ou mulher, bem-sucedido ou fracassado, poderoso ou impotente. Define o que deve ser considerado bom ou mau, positivo ou negativo, moral ou imoral.

As narrativas publicitárias veiculadas pela mídia nascem repletas de símbolos, mitos e estereótipos que ajudam a construir uma cultura comum e, com o advento das novas tecnologias, essa cultura comum não tem encontrado limites espaciais. Na cultura da mídia se encontra o material que constitui as identidades pelas quais o público-alvo se insere nas sociedades tecnocapitalistas contemporâneas, produzindo uma nova forma de cultura global. Nessa cultura se moldam e são moldados padrões globalizados que cobrem espaços, desde a alimentação e informação até a beleza e a felicidade. Essa cultura fornece um diversificado conjunto de bens e serviços que induzem à adesão de um sistema de gratificação/prazer. Na cultura da mídia, a produção de significados cria prazeres capazes de integrar os indivíduos nas práticas consumistas, dos produtos, mas entendemos que, mais ainda, dos estilos de vida mostrados.


A expressão “cultura da mídia” também tem a vantagem de dizer que a nossa é uma cultura da mídia, que a mídia colonizou a cultura, que ela constitui o principal veículo de distribuição e disseminação da cultura que os meios de comunicação de massa suplantaram os modos anteriores de cultura como o livro ou a palavra falada, que vivemos num mundo no qual a mídia domina o lazer e a cultura. Ela é, portanto, a forma dominante e o lugar da cultura nas sociedades contemporâneas (KELLNER, 2001, p. 54).

É desse lugar construído pela cultura da mídia que vamos analisar as especificidades das narrativas publicitárias, seus modos de construção de horizontes de compreensão do cotidiano. A publicidade, linguagem que trabalha com o sancionado, facilita sua compreensão, é também uma operação referencial: compreendemos algo quando o comparamos com algo que já conhecemos. Trata-se de um espaço socialmente compartilhado.

Toda a experiência do homem no mundo acontece na linguagem, o homem já nasce envolto nela. Linguagem é pensamento, pensamento é linguagem. É através da linguagem que o homem se exprime, revela-se. É na linguagem que ocorre a experiência hermenêutica, justamente porque o homem e, por conseguinte, qualquer discurso, pertence a linguagem. Esse é o ponto de partida para a obtenção de um horizonte comum. Só assim pode ocorrer a fusão de horizontes, categoria cuja nascente é a hermenêutica, suporte filosófico-metodológico desta pesquisa. Aqui, toda compreensão é temporal, intencional e histórica. A construção das narrativas, assim como sua compreensão é mais que um processo mental, mas um processo ontológico. Contar-se faz parte do homem. Ao contar-se, nas narrativas publicitárias, o homem contemporâneo se interpreta historicamente.


Sin embargo la narratividad, dentro de sus limites, no solo ofrece el médio, imperfecto sin duda, para compreender la experiência temporal, el tiempo humano, sino que también hace comprender los limites de la misma experiência temporal. Si no imponemos limites a lo imaginário, reconoceremos que las mismas narraciones figurativas que introducen la experiencia temporal, hacen surgir la del “tiempo y su otro”, esbozando experiencias limite que “merecen ser colocadas bajo el signo de eternidad” (MACEIRAS FAFIAN ; BARRERA, 1990, p. 189-190).

É imprescindível mencionar que o discurso publicitário, fortemente ficcional, multiplica as experiências de presente eternizado, conduzindo os diversos modos de compreensão do mundo e das experiências vividas (mesmo condicionado pelo modo de produção). A estética da recepção aparece como instrumento importante na análise desse discurso, visto como conjunto de conhecimentos e crenças dos telespectadores. O reconhecimento do público-alvo das intenções do construtor das mensagens constitui um passo importante na sua interpretação. É possibilidade de os sujeitos dotarem de sentido moral ao mundo e imaginarem-se como agentes dentro dele.

Produção ficcional enraizada no real, o discurso publicitário é funcional. Obedece a regras que as teorias da publicidade e propaganda e do discurso imagético oferecem. As categorias vão desde os elementos da linguagem publicitária e suas caraterísticas específicas até a linguagem videográfica, com seus movimentos de câmera e enquadramentos, efeitos como fusão, fade in e fade out, entre outros. Na combinação desses elementos, dentro de uma lógica própria, analisaremos como essas narrativas são construídas e dessa forma, poderemos chegar às construções dos mundos possíveis, horizontes de compreensão do mundo apresentado.

Definidos os elementos constitutivos do discurso publicitário, poderemos verificar como estes discursos funcionam, de que categorias estes se constituem em narrativas do presente, sem esquecer que eles trazem também, as marcas do passado e do futuro pretendido. Encontramo-nos, assim, no espaço da narratologia (REIS;LOPES, 1988, p. 79), área da reflexão teórico-metodológica autônoma, centrada na narrativa como modo de representação literária e não-literária; e estudo da forma e funcionamento da narrativa. Mas, recolocando-a no ato da fala, no nexo entre o narrador e o narratário que se realiza através do texto.

A pesquisa procura descrever de forma sistemática os códigos que estruturam a narrativa, os signos que esses códigos compreendem. Ratificamos nossa hipótese primordial: a publicidade é uma narrativa da contemporaneidade, na maioria das vezes, uma ficção e assim pode ser interpretada. Não se trata de uma história, mas de um relato temporal, representativo, dominado por eventos que configuram o desenvolvimento de uma ação temporal (cronológica) que estimula a imaginação (MOTTA, 2005).

Discurso organizado, o publicitário tem suas ações praticadas por personagens num suceder temporal encaminhado ao final feliz. É o espaço do não-conflito. A condução da audiência se dá nas transformações temporais e circunstanciais devido ao uso do produto/serviço uma sucessão de estados, característica da narratividade.

Entendendo que mostrar a publicidade como narrativa é primordial, nossa idéia é fazer uma seleção aleatória dos corpora, como se não fosse necessário um recorte determinado para se encontrar as especificidades desse discurso como narrativa. Assim, vamos coletar os comerciais durante os intervalos do programa de maior audiência na TV brasileira: o Jornal Nacional, por contar, também e principalmente, com uma programação de mídia nacional. Durante uma semana estaremos analisando as narrativas publicitárias que habitam as mentes de um público numeroso e diversificado por natureza, visto abranger todo o País.

Iremos, então, verificar quais seus elementos constitutivos e como eles atuam no discurso, o que evocam, a que memórias (individuais e coletivas) se remetem, como essas narrativas criam efeitos de real à medida que esboçam traços de nossa experiência temporal, que relações estabelecem entre o horizonte construído na mensagem e o do telespectador, como esses discursos se inscrevem na cultura da mídia. Nosso enfoque será hermenêutico, levando em conta categorias da semântica, da pragmática, da retórica e da narratologia. Observaremos, na análise empírica do texto, figuras de linguagem, funções da linguagem, uso de algumas classes de palavras, prosódia, vícios de linguagem, linguagem direta ou indireta, entre outros itens.

Ao verificarmos as lacunas e hiatos negociados na leitura das mensagens publicitárias, por natureza fragmentada, estaremos checando o contrato entre telespectador e autor em andamento, como o texto é levado à consciência do público-alvo, a interação entre o que é e o que não é dito.

A partir da determinação da estrutura dos enredos das histórias contadas pelos comerciais de TV e dos elementos da linguagem de vídeo poderemos, ainda, encontrar quais são os horizontes propostos pelas agências e os estímulos desencadeadores de certas emoções, sentimentos, como a atenção é atraída, como são produzidos determinados comportamentos no telespectador (a surpresa, o riso, o espanto, a angústia, a gargalhada, a piedade, etc.).

Observar os aspectos simbólicos: os modelos de mundo, os conflitos principais, os heróis e vilões valorizados e menosprezados. A partir de destaques, ênfases e prioridades poderemos descortinar representações, padrões e estereótipos, necessidades, desejos e fantasias estimuladas. Por fim, poderemos observar a inserção da publicidade na vida cotidiana, as experiências práticas e estéticas em andamento no mundo da vida, o reprocessamento semântico e a experimentação permanente dos valores.

Temos, ainda, aspectos simbólicos a considerar. Verificaremos, a partir do destaque de símbolos, representações e estereótipos, que necessidades, desejos e fantasias estão sendo estimuladas.



Commercial break: little quotidian stories narratives of publicity in media culture
ABSTRACT
This paper talks about the discourse of publicity as one of man’s narratives in his quotidian life, inserted in a media culture. The paper has narratology as its theoretical-methodological support. The work hypothesis is that the narrative of publicity builds effects of real and other effects of senses (commotion, joy, pleasure, satisfaction, irony, etc) that are realized in the articulation between what is broadcast and the expectations, identifications and comprehension of the receivers. Verifying the lacunas and hiatus negotiated in the reading of the messages of publicity, fragmented by nature, we will check the contract between the spectator and author in course, how the text is lead to the conscience of the target, the interaction between what is and what is not said.
KEYWORDS: Publicity. Narrative. Media culture. Quotidian.


Break comecial: pequeñas estorias del cotidiano narrativas publicitarias en la cultura de los médios
RESUMEN
En este artigo se discute el discurso publicitario como una de las narrativas del hombre en su cotidiano, inserido en una cultura de los medios. Como soporte teórico-metodológico será utilizada la narratología. La hipótesis de trabajo es la de que la narrativa publicitaria construye efectos de real y otros efectos de sentido (la conmoción, la alegría, el placer, la satisfacción, la ironía, etc.) que se realizan en la articulación entre lo que es vehiculado y las expectativas, identificaciones y comprensión de los receptores. Verificándose las brechas e hiatos negociados en la lectura de los mensajes publicitarios, por naturaleza fragmentados, serán comprobados los contratos entre telespectador y autor en andamiento, la manera como el texto es llevado a la consciencia del publico objetivo, la interacción entre lo que es y lo que no es dicho.
PALABRAS CLAVE: Publicidad. Narrativa. Cultura de los medios. Cotidiano.


Notas

[1]Texto adaptado de trabalho apresentado ao NP Publicidade e Propaganda, do XXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – UnB- 6 a 9 de setembro de 2006.


Referências

[<] CARRASCOZA, João Anzanello. A Evolução do texto publicitário: a associação de palavras como elemento de sedução na publicidade. São Paulo: Futura, 1999.

[<] HELLER, Agnes. O Cotidiano e a história. São Paulo: Paz e Terra, 1970.

[<] JAUSS, Hans Robert. El lector como instancia de uma nueva historia de la literatura. In: MAYORAL, José Antonia. (Org.) Estética de la recepción. Madrid: Arco/Libros, 1987.

[<] KELLNER, Douglas. A Cultura da mídia: estudos culturais: identidade e política entre o moderno e o pós-moderno. Bauru, SP: EDUSC, 2001.

[<] MOTTA, Luiz Gonzaga. Narratologia: teoria e análise da narrativa jornalística. Brasília: Casa das Musas, 2005.

MOTTA, Luiz Gonzaga. Jornalismo e configuração narrativa da história do presente. Contracampo , Niterói, RJ, n. 12, p. 23-50, 1º. sem. 2005.

NUNES, Benedito. O Tempo na narrativa. São Paulo: Ática, 1988.

[<] REIS, Carlos; LOPES, Ana Cristina M. Dicionário de teoria da narrativa. São Paulo: Ática, 1988.

[<] ROCHA, Everardo P. Guimarães. Magia e capitalismo : um estudo antropológico da publicidade. São Paulo: Brasiliense, 1995.

ROCHA: João César de Castro (Org.) Teorias da ficção: indagações à obra de Wolfgang Iser. Rio de Janeiro: Ed.UERJ, 1999.

[<] SCHUTZ, A. ; LUCKMAN, T. Las estructuras del mundo de la vida. Buenos Aires: Amorrortu, 2001.


Márcia Coelho Flausino
Redatora publicitária Doutora em História / UnB Pós-doutoranda em Comunicação / UnB Professora do Curso de Comunicação Social, habilitação Publicidade e Propaganda / UnB Mestre em Comunicação / UnB Redatora publicitária
E-mail:mflau@click21.com.br
Curriculo Lattes


Luiz G. Motta
Doutor em Comunicação / University of Wisconsin Professor e Coordenador do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política / UnB Editor da revista acadêmica Brazilian Journalism Research
E-mail: luizmottaunb@yahoo.com.br
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