Micobacteriose cutânea em felino

Autores

DOI:

https://doi.org/10.22456/1679-9216.138347

Palavras-chave:

Santa Catarina, lepra felina, M. lepraemurium, gato.

Resumo

Background: A micobacteriose cutânea felina é uma dermatopatia causada pelo gênero Mycobacterium spp. que apresenta diferentes formas de manifestação conforme a espécie envolvida. Dentro delas, a chamada lepra felina, provocada pelo M. lepraemurium, é caracterizada por granulomas cutâneos e subcutâneos, transmitida principalmente pela mordedura de roedores. O diagnóstico e o tratamento são desafiadores devido às particularidades da espécie. O objetivo deste estudo é documentar um caso de lepra felina no estado de Santa Catarina, uma vez que não há relatos até o momento no estado, enfatizando também a relevância do tema como um diagnóstico diferencial significativo em distúrbios dermatológicos.

Case: Foi atendido na Clínica Veterinária Escola da Universidade Federal de Santa Catarina (CVE/UFSC) um felino, fêmea, sem raça definida, castrado e com quatro anos de idade, com lesões na base da cauda que persistiram por mais de um mês, mesmo após um antigo tratamento instituído com dexametasona e cuidados locais. Ao exame físico geral, havia aumento de linfonodo poplíteo direito e, ao exame específico, observaram-se três lesões em base de cauda, com aumento de volume, purulentas e medindo cerca de 2 a 3 centímetros de diâmetro. Após insucesso do tratamento com cefalexina por 7 dias, suspeitou-se de micobacteriose, tendo sido realizado biópsia de três fragmentos das lesões com punch dermatológico para exame histopatológico, o qual revelou bacilos álcool-ácido resistentes sugestivos de M. lepraemurium. O material foi enviado para realização de ensaio de PCR em tempo real (qPCR) para micobactérias do complexo Mycobacterium tuberculosis (MCMT) e micobactérias não tuberculosas (MNTs), havendo amplificação para MNTs, o que permitiu o diagnóstico definitivo de micobacteriose cutânea no paciente felino. Um novo tratamento foi iniciado com Doxiciclina por 30 dias. O animal retornou após 30 dias de término do tratamento, observando-se regressão total das lesões e repilação completa, considerando-se cura clínica.

Discussion: Dentro das variedades de apresentação da doença causada pelo M. lepraeumurium, a paciente apresentou lesões semelhantes com a forma tuberculosa. Apesar dos dados da literatura informarem uma prevalência da localização das lesões em membros e cabeça, presume-se que a presença das mesmas em região de base da cauda esteja vinculada ao local onde o roedor possui acesso para morder o animal. O diagnóstico da lepra é dificultado devido às características exigentes da espécie. Em cultura bacteriológica, por exemplo, a visualização de crescimento pode levar de 2 a 3 meses, havendo a possibilidade de resultado negativo mesmo após a visualização de bactérias em exame histopatológico. A PCR tem se mostrado a melhor alternativa, uma vez que permite a detecção do agente de forma rápida e com alta especificidade e sensibilidade e, neste caso, foi essencial para o diagnóstico definitivo. Em relação ao tratamento, a melhor abordagem consiste na ressecção cirúrgica completa com terapia adjuvante e prolongada (3 a 6 meses) de combinação de dois ou mais antibióticos eficazes contra micobactérias de crescimento lento, bem como claritromicina, clofazimina, rifampicina, fluorquinolonas, aminoglicosídeos e doxiciclina. Caso a cirurgia não seja possível, o tratamento com antibióticos associados deve ser instaurado. Também é necessário cuidado quanto ao cumprimento do tempo de tratamento, pois a interrupção pode levar à remissão importante das lesões e indução de resistência aos princípios ativos. Na paciente, a remissão das lesões ocorreu após a terapia com doxiciclina somente. Entretanto, a duração foi menor do que o recomendado na literatura.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Marcy Lancia Pereira, Universidade Federal de Santa Catarina, SC, Brazil.

Coordenadoria Especial de Biociências e Saúde Única, Centro de Ciências Rurais, campus Curitibanos

Referências

Appleyard G.D. & Clark E.G. 2002. Histologic and genotypic characterization of a novel Mycobacterium species found in three cats. Journal of Clinical Microbiology. 40(7): 2425-30. DOI: 10.1128/JCM.40.7.2425-2430.2002. DOI: https://doi.org/10.1128/JCM.40.7.2425-2430.2002

Barletta R.G. & Steffen D.J. 2016. Mycobacterium. In: McVey D.S., Kennedy M. & Chengappa M.M. (Eds). Microbiologia Veterinária. 3.ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan Ltda., pp.439-440.

Bezerra B.M.O., Lopes C.E.B., Matos M.G., Rodrigues F.R.N. & Viana D.A. 2018. Cytologic diagnosis of feline cutaneous mycobacteriosis in Fortaleza (Ceará) - Case Report. Revista Brasileira de Higiene e Sanidade Animal. 12(1): DOI: https://doi.org/10.5935/1981-2965.20180009

-91. DOI: 10.5935/981-2965.20180009.

Courtin F., Huerre M., Fyfe J., Dumas P. & Boschiroli M. 2007. A case of feline leprosy caused by Mycobacterium lepraemurium originating from the island of Kythira (Greece): diagnosis and treatment. Journal of Feline Medicine

and Surgery. 9(3): 238-241. DOI: 10.1016/j.jfms.2006.11.007. DOI: https://doi.org/10.1016/j.jfms.2006.11.007

Ghielmetti G., Schmitt S., Friedel U., Guscetti F. & Walser-Reinhardt L. 2021. Unusual Presentation of Feline Leprosy Caused by Mycobacterium lepraemurium in the Alpine Region. Pathogens. 10(6): 687. DOI: 10.3390/pathogens10060687. DOI: https://doi.org/10.3390/pathogens10060687

Grandi F., Colodel M.M. & Rocha N.S. 2011. Síndrome lepra felina: aspectos dermohistopatológicos. Medvep Dermato Revista de Educação Continuada em Dermatologia e Alergologia Veterinária. 1(1): 304-308.

Gunn-Moore D.A. 2014. Feline mycobacterial infections. The Veterinary Journal. 201(2): 230-238. DOI: 10.1016/j.tvjl.2014.02.014. DOI: https://doi.org/10.1016/j.tvjl.2014.02.014

Gunn‐Moore D., Dean R. & Shaw S. 2010. Mycobacterial infections in cats and dogs. In Practice. 32(9): 444-452.

DOI: 10.1136/inp.c5313. DOI: https://doi.org/10.1136/inp.c5313

Ikuta C.Y. & Ferreira Neto J.S. 2016. Micobacterioses e tuberculose em cães e gatos. In: Megid J., Ribeiro M.G. & Paes A.C. (Eds). Doenças Infecciosas em Animais de Produção e de Companhia. Rio de Janeiro: Roca, pp.413-422.

Larsson C.E., Delayte E.H., Balda A.C., Michalany N.S., Pinheiro S.R., Otsuk M. & Roxo E. 2006. Dermatite micobacteriana atípica em gato: Relato de caso. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia. 58(6): 1092-1098. DOI: https://doi.org/10.1590/S0102-09352006000600018

Lima R.K.R. & Oliveira L.C.P. 2016. Micobacteriose tegumentar. In: Mazotti G.A. & Roza M.R. (Eds). Medicina Felina Essencial: Guia Prático. Curitiba: Equalis, pp.499-504.

Lloret A., Hartmann K., Pennisi M.G., Gruffydd-Jones T., Addie D., Belák S., Boucraut-Baralon C., Egberink H., Frymus S.T. & Hosie M.J. 2013. Mycobacterioses in Cats. Journal of Feline Medicine and Surgery. 15(7): 591-597. DOI: 10.1177/1098612x13489221. DOI: https://doi.org/10.1177/1098612X13489221

Malik R., Hughes M.S., James G., Martin P., Wigney D.I., Canfield P.J., Chen S.C., Mitchell D.H. & Love D.N. 2002. Feline leprosy: two different clinical syndromes. Journal of Feline Medicine and Surgery. 4(1): 43-59. DOI: 10.1053/jfms.2001.0151. DOI: https://doi.org/10.1053/jfms.2001.0151

Martins C.R., Santana L.E. & Anjos L.C.T. 2014. Micobacteriose cutânea em gatos: Revisão de literatura e relato de caso. Medvep Dermato - Revista de Educação Continuada em Dermatologia e Alergologia Veterinária. 3(11): 394-399.

O’Brien C.R., Malik R., Globan M., Reppas G., McCowan C. & Fyfe J.A. 2017. Feline leprosy due to Mycobacterium lepraemurium: Further clinical and molecular characterization of 23 previously reported cases and an additional

cases. Journal of Feline Medicine and Surgery. 19(7): 737-746. DOI:10.1177/1098612X17706469. DOI: https://doi.org/10.1177/1098612X17706469

Scoleri P.G., Choo M.J., Leong E.X.L., Goddard R.T., Shepard L., Burr D.L., Bastian I., Thomson M.R. & Rogers B.G. 2016. Culture-Independent Detection of Nontuberculous Mycobacteria in Clinical Respiratory Samples. Journal of Clinical Microbiology. 54(9): 2395 - 2398. DOI: 0.1128/jcm.01410-16. DOI: https://doi.org/10.1128/JCM.01410-16

Silva D.A., Gremião I.D.F., Menezes, R.C., Pereira S.A., Figueiredo F.B., Ferreira R.M.C. & Pacheco T.M.V. 2018. Micobacteriose cutânea atípica felina autóctone no município do Rio de Janeiro-Brasil. Acta Scientiae Veterinariae.

(3): 327-331. DOI: 10.22456/1679-9216.17517. DOI: https://doi.org/10.22456/1679-9216.17517

Silva M.N. & Monteiro M.V.B. 2016. Corpúsculos de Howell-Jolly. In: Hematologia Veterinária. Belém: EditAedid-

-UFPA, pp.32-33.

Sousa C.C., Ferrari E.D.M., Araujo A.M., Vasconcelos Jr. S.A., Rêgo M.P.S & Seade G.C.C. 2021. Micobacteriose cutânea em felino doméstico: relato de caso. Brazilian Journal of Development. 7(12): 118625-118632. DOI: 10.34117/bjdv7n12-566. DOI: https://doi.org/10.34117/bjdv7n12-566

Taylor G.M., Worth D.R., Palmer S., Jahans K. & Hewinson R.G. 2007. Rapid detection of Mycobacterium bovis DNA in cattle lymph nodes with visible lesions using PCR. BioMed Central Veterinary Research. 3(12): DOI:10.1186/1746-6148-3-12. DOI: https://doi.org/10.1186/1746-6148-3-12

Arquivos adicionais

Publicado

2024-07-20

Como Citar

Christianetti, B., Kruscinski, F., Pereira, M. L., Menin, Álvaro, Patricia Medeiros Veiga, A., José Piccoli, R., & Tony Ramos, A. (2024). Micobacteriose cutânea em felino. Acta Scientiae Veterinariae, 52. https://doi.org/10.22456/1679-9216.138347

Edição

Seção

Case Report